Portugal deve assegurar o reforço de recursos humanos no sistema judicial, dotar a luta contra a corrupção com meios suficientes e aumentar a transparência na justiça e na política, defende um relatório da Comissão Europeia (CE) esta quarta-feira divulgado.
Segundo o relatório de 2023 sobre o Estado de Direito, foram registados avanços no país face ao ano anterior, com a adoção de “medidas significativas” em diversas áreas, mas persistem desafios e constrangimentos por ultrapassar, como a escassez de funcionários judiciais, a monitorização das novas regras de distribuição eletrónica dos processos, a atividade do recém-implantado Mecanismo Nacional Anticorrupção (MENAC) e a transparência a nível político.
Entre as recomendações a Portugal estão a necessidade de o país continuar “a envidar esforços para assegurar recursos humanos adequados no sistema de justiça, em particular no que respeita ao pessoal não judicial, e para melhorar a sua eficiência, em especial dos tribunais administrativos e fiscais”. O documento expressa ainda preocupações sobre a idade avançada destes profissionais e um expectável aumento do número de reformas nos próximos anos.
Bruxelas sublinha que Portugal deve prosseguir o trabalho desenvolvido na transparência da distribuição processual, “nomeadamente acompanhar a aplicação das novas regras de distribuição eletrónica”, mas também “finalizar as reformas destinadas a melhorar a transparência do processo legislativo”, incluindo a garantia de uma fiscalização eficaz das declarações de rendimentos de titulares de cargos públicos pela Entidade para a Transparência.
O combate à corrupção é igualmente salientado no relatório, com Bruxelas a realçar a aplicação da Estratégia Nacional Anticorrupção ou a instalação do MENAC. Porém, o relatório recomenda ao país que prossiga os esforços feitos na atribuição de “recursos suficientes para a prevenção, investigação e repressão da corrupção”, sobretudo na esfera da ação penal.
“Continuam a existir preocupações no que se refere a casos de abuso de atos processuais nos processos penais, que conduzem a atrasos, em especial nos complexos, comummente designados por “megaprocessos”. Agentes do setor apelaram a uma revisão da lei processual penal, com vista a evitar a utilização de atos processuais com objetivos meramente dilatórios”, lê-se no documento.
Citando dados do Eurobarómetro Especial de 2023 sobre a Corrupção, que apontou para 93% dos inquiridos em Portugal que consideraram que a corrupção no país é generalizada (face a uma média de 70% na União Europeia), o relatório questiona ainda a capacidade do MENAC para cumprir as funções de prevenção e fiscalização que lhe foram atribuídas.
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“A coordenação das atividades de luta contra a corrupção entre os diferentes organismos públicos, bem como a assunção de novas tarefas, tais como poderes sancionatórios, é suscetível de constituir um desafio para o MENAC no contexto das numerosas tarefas a realizar por um número relativamente limitado de efetivos”, refere, acrescentando: “Apesar da obrigação legal, não é claro como é que o MENAC irá supervisionar e fazer cumprir as regras aplicáveis às empresas privadas e entidades jurídicas similares em termos práticos”.
Por fim, Bruxelas sinalizou a falta de progressos nas regras sobre “portas giratórias” e considerou que o impacto do questionário ético adotado recentemente pelo Governo, na sequência de casos judiciais ligados a governantes, “continua a ser duvidoso em termos de prevenção de riscos para a reputação”, não sendo claras as suas consequências.