– Já está aberto. Espero que tenham sorte e que levem a luta para a frente.
– Alguém tem que entrar.
– Vamos lá.
O portão da entrada do centro comercial Stop, no Porto, abriu esta sexta-feira às 11h em ponto, com um simbolismo diferente: marcou também o regresso de músicos e lojistas aos 105 espaços que foram selados a 18 de julho pela Polícia Municipal por não possuírem licença de utilização. É aqui, nestas salas, que quase 500 músicos gravam, ensaiam e produzem diariamente há vários anos. A solução desta reabertura é temporária e exige medidas extra, mas a urgência de músicos e lojistas era muita.
“Havia uma urgência tal para o regresso às salas que tivemos de fazer alguns compromissos. Lançamos uma contraproposta na semana passada e não obtivemos resposta, o que é uma pena, porque gostávamos mesmo da contraproposta e acreditávamos nela. Mas, em todo o caso, a urgência era tal para regressar às salas que precisávamos de o fazer de uma forma ou de outra”, explicou aos jornalistas Bruno Costa, presidente da Alma Stop, uma das associações de músicos criada neste antigo centro comercial.
Depois do encerramento que deixou quase 500 artistas e lojistas sem ter “para onde ir”, o entendimento entre músicos e a Câmara do Porto consumou-se na quarta-feira, com as duas associações a aceitarem as condições da autarquia para reabrir o Stop.
No Stop passa a estar em permanência um carro de bombeiros com cinco operacionais, que esta sexta-feira já andaram pelos corredores a verificar a segurança de todo o espaço. Para poderem frequentar o Stop em segurança, a maioria dos utilizadores receberá ainda uma formação de quatro horas dada pelos bombeiros.
A reabertura do Stop mantém, no entanto, um caráter temporário até à autarquia perceber se o diagnóstico da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil (ANEPC) determinar se o espaço pode funcionar como está, admitiu o presidente da câmara em declarações aos jornalistas.
As medidas propostas pelo município já tinham, entretanto, reunido a anuência da administração do condomínio, que assinou o termo de compromisso e responsabilidade a 24 de julho, dia em que músicos e lojistas reivindicaram, em frente à câmara, o regresso ao espaço. Aos artistas juntaram-se centenas de pessoas que desfilaram pelas ruas do Porto até ao centro comercial, sob o mote “o Stop é nosso e há de ser”, reclamando a importância daquele polo cultural na cidade.
Além destas regras excecionais, a questão que deixa os músicos mais reticentes é a redução do horário de funcionamento do espaço, sendo que o Stop passa agora a funcionar apenas durante 12h por dia — das 11h às 23h. “É uma faca de dois gumes. É bom poder regressar, mas ao mesmo tempo estamos com umas condições que nos são impostas e que não são as melhores para nós”, refere João Pedro, músico no Stop há quase sete anos. O horário, explica, “será certamente o mais difícil”. “Ficar sem a noite é muito impeditivo”, acrescenta. Mas a urgência em reabrir os espaços falou mais alto.
Enquanto tinha a sala fechada, João retirou apenas algum material que precisava no imediato: “O resto ficou, porque não queríamos propriamente abandonar, como se isto já estivesse tudo para fechar e pronto”, acrescenta. Já quanto ao futuro do espaço, que está aberto temporariamente, surgem dúvidas: “Não sei muito bem dizer neste momento. Esperaria que se conseguisse provar ou demonstrar realmente o valor do Stop para a cidade e para a cultura daqui, desta zona, das pessoas, desta zona oriental da cidade. Representa um pouco a não cedência das pessoas e da cidade ao capital”.
A proposta de reabertura do centro comercial foi inicialmente recebida com cautela pelas duas associações de músicos, tendo a Alma Stop, dias depois, apresentado uma contraproposta, documento que motivou a demissão do presidente da Associação Cultural de Músicos do Stop, Rui Guerra. Essa contraproposta, alerta Bruno Costa, não está esquecida.
A contraproposta incluía cargas e descargas que não são mencionadas, por exemplo, no termo de responsabilidade que o administrador do condomínio assinou. E isso para nós é bastante importante. Para além disso, também existem aqui salas que estão muito bem insonorizadas e que poderiam trabalhar ao longo da noite. Não queremos, de forma nenhuma, comprometer pessoas que precisam de fazer esse trabalho durante a noite. Já para não falar do investimento que foi feito nessa sala e que seria deitado fora se depois não pudessem ser usadas depois das 23h”, explica Bruno Costa.
Como alternativa ao centro comercial, a câmara apresentou como soluções a escola Pires de Lima ou os últimos pisos do Silo Auto. A possibilidade de os músicos se mudarem “definitiva ou temporariamente” para a escola Pires de Lima mantém-se em cima da mesa, garantiu o presidente da câmara. Ainda assim, Bruno Costa disse esta sexta-feira que a solução preferencial é manter os músicos no Stop. Até porque, acrescentou, teme uma divisão na comunidade musical caso esta se reparta entre o Stop e a escola Pires de Lima.
“A verdade é que eu não conheço nenhum músico que queira ir para a escola Pires de Lima ou que queira estar noutro sítio que não aqui”, disse aos jornalistas o presidente de uma das associações de músicos do centro comercial portuense.
Para já, Bruno Costa não soube estimar qual a validade da solução temporária encontrada para o regresso ao Stop, mas calculou que possa estar ligada a um processo de licenciamento “que está a decorrer na câmara para o Stop, que termina a 8 de setembro”.
Inaugurado em novembro de 1982, o centro comercial Stop funciona há mais de 20 anos como espaço cultural e diversas frações dos seus pisos são usadas como salas de ensaio ou estúdios por vários artistas.
(Artigo atualizado às 16h11 desta sexta-feira, com reportagem na reabertura das lojas)