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Um helicóptero, 50 guarda-costas e lagostas vivas. O que se passa dentro do comboio de Kim Jong-un?

Este artigo tem mais de 1 ano

O peso da segurança paga-se: a Fortaleza Móvel, ou Comboio n.º 1, não passa dos 55 quilómetros por hora devido ao peso da blindagem, necessária para ser imune a balas e manter Kim são e salvo.

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Em 2019, quando se encontrou com Donald Trump, Kim viajou na Fortaleza Móvel

AFP via Getty Images

Em 2019, quando se encontrou com Donald Trump, Kim viajou na Fortaleza Móvel

AFP via Getty Images

O que se oferece a alguém que é o Grande Líder de um país? Em 1945, Josef Stalin tinha a resposta (que, anos mais tarde, seria copiada por Mao Tsé-Tung): uma carruagem de comboio, decorada com todos os requintes, foi entregue a Kim Il-Sung pelo ditador soviético.

Na verdade, nessa altura ele ainda não era o Grande Líder, apenas o homem à frente do Partido Comunista Coreano que, três anos mais tarde, em 1948, tomaria o poder da República Popular Democrática da Coreia, a parte Norte da península dividida em dois Estados depois da Segunda Guerra Mundial.

À volta dessa carruagem oferecida por Stalin, e da oferecida pelo ditador chinês, foi literalmente construído um museu, parte do complexo Exposição Internacional da Amizade, onde se encontram os milhares de presentes oferecidos aos líderes da Coreia do Norte. E foi assim, pela mão de Stalin, que os comboios passaram a fazer parte da vida da dinastia Kim. Primeiro o Grande Líder, depois o Querido Líder e agora o Líder Supremo, todos eles preferem viajar por via ferroviária.

E, claro, são vários os motivos para o comboio em que Kim Jong-un viajou nesta semana para a Rússia ser apelidado de Fortaleza Móvel, ou Comboio n.º 1.

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À prova de bala, mas mais lento que o Intercidades

A segurança é a principal característica da Fortaleza Móvel, mas não é a única. A carroçaria e os vidros são à prova de bala e até o chão está protegido com placas à prova de explosões, para o caso de haver explosivos nos trilhos.

A blindagem paga-se em velocidade. O comboio de Kim dificilmente passa os 55 quilómetros por hora, não só pelo peso das carruagens, mas também devido ao mau estado das ferrovias norte-coreanas, construída nos tempos do Japão Imperial no início do século XX. Ou seja, o Comboio n.º 1 é mais lento que um Intercidades. Em Portugal, as automotoras para serviços regionais atingem, no máximo, os 120 quilómetros, enquanto os Alfas podem deslocar-se a 200, 220 quilómetros por hora.

À saida do comboio há sempre um tapete vermelho à espera do líder norte-coreano

KCNA via REUTERS

Outro pormenor é o número de carruagens de cada comboio. No tempo do Querido Líder, o pai de Kim, escrevia-se que o seu comboio era composto por mais de 90 carruagens e vagões, número que terá descido nos anos mais recentes para 21, segundo o Chosun Ilbo, um dos principais jornais da Coreia do Sul, que citava os serviços de inteligência sul-coreanos e norte-americanos.

Além disso, o comboio nunca vai sozinho. À frente segue uma formação que deve testar a segurança dos trilhos, garantindo que não há explosivos ou ameaças no caminho do Líder Supremo. Atrás do comboio onde segue Kim, há uma terceira formação, onde se desloca uma comitiva totalmente dedicada à segurança.

Na Coreia do Norte não é só o comboio que é de uso exclusivo da família Kim: dezanove estações foram construídas para uso exclusivo do líder. Seja nestas, seja em estações fora do país, é certo que cerca de 100 agentes irão visitar cada estação antes de Kim dar início a qualquer viagem, para procurar bombas e outras ameaças.

De resto, nada é deixado ao acaso e a energia dos trilhos ferroviários é cortada para que nenhum outro comboio possa avançar enquanto a comitiva do Líder Supremo estiver de passagem.

Dentro do comboio, há carros e um helicóptero

Embora se fale sempre no singular, sabe-se que Kim tem mais do que um comboio — chegou a falar-se em nove —, todos exatamente iguais, produzidos numa fábrica em Pyongyang, a capital do país. Dentro dos vagões há tudo o que Kim pode precisar: desde logo, um automóvel (normalmente um Mercedes) para ser usado quando o líder norte-coreano chega ao seu destino.

Para situações de emergência, há ainda um helicóptero, segundo as secretas sul-coreanas. Numa das notas sobre o comboio divulgadas pelo Ministério da Unificação da Coreia do Sul, lia-se que a Fortaleza Móvel “está equipada com armas de ataque e um helicóptero para fuga em caso de emergência”. Os cerca de 50 guarda-costas têm à disposição morteiros de 82 mm.

Vista panorâmica do comboio que tem mais de 20 carruagens

KCNA

Dentro da Coreia do Norte, a segurança é ainda reforçada no exterior: há agentes de segurança posicionados ao longo dos trilhos — aconteceu quando Kim viajou até Hanói, capital do Vietname, para se encontrar com Donald Trump —, enquanto aviões de transporte da força aérea IL-76, helicópteros MI-17 e outras aeronaves fornecem apoio aéreo.

De resto, a Fortaleza Móvel está equipada com salas de conferências, sala de audiências e quartos, o que permite a Kim levar consigo convidados VIP e manter qualquer tipo de reuniões durante a viagem. Também tem instalados telefones satélite e todo o tipo de tecnologia para que possa emitir qualquer ordem necessária, mesmo quando está longe de Pyongyang.

Menu? Lagosta e espumante francês

Os detalhes sobre o que se passa dentro do comboio de Kim foram revelados quando a Fortaleza Móvel era usada pelo seu pai. Konstantin Pulikovsky, um emissário de Vladimir Putin, passou bastante tempo com Kim Jong-Il, inclusive dentro do comboio. Os detalhes seriam publicados por Pulikovsky em livro, em 2002.

Ao longo dos anos, a KCNA, agência estatal de notícias, foi divulgando imagens do interior do comboio de Kim

KCNA

“Era possível pedir qualquer prato da culinária russa, chinesa, coreana, japonesa ou francesa”, escreveu o russo no livro “Expresso do Oriente”, onde descrevia que as refeições chegavam a demorar mais de quatro horas. Além disso, as lagostas vivas, prontas a ser preparadas quando o Querido Líder pedia, estavam sempre a bordo do comboio.

Para beber, havia espumante francês, e vinhos tintos Bordeaux e Borgonha, o que levou Pulikovsky a escrever que nem o comboio particular de Putin “tinha o nível conforto do de Kim Jong Il”.

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