Os Bombeiros Unidos Sem Fronteiras (BUSF) da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) de Angola foram declarados ilegais pelas autoridades angolanas, com quem chegaram a participar em ações conjuntas, estando alguns dos elementos detidos, segundo fonte oficial.
Tudo começou em 2022 quando a organização, “de caráter altruísta, assistencial, filantrópico e educativo”, afiliada ao movimento BUSF, originário do Brasil, foi criada em Angola, segundo um diploma consultado pela Lusa e que, para os seus membros, é um dos comprovativos da sua legalidade.
O diploma, publicado em 8 de setembro de 2022, relativo à constituição da Associação dos Bombeiros da Paz nas Comunidades, representada por Flávio Canhongo, Neusa Chagas e António Velho, menciona que esta entidade é dirigida “imperativamente pela força-tarefa e administrativamente pela organização BUSF-CPLP”.
Entre as suas normas de atuação constam a “realização de projetos de emergência para os impactos dos riscos naturais, com efeitos catastróficos, e realização de projetos de cooperação para o desenvolvimento de instituições angolanas de incêndio desfavorecidas e combater o crime na comunidade junto da Polícia Nacional de Angola (sic)”.
A organização declara-se ainda “apolítica” e respeitadora de qualquer credo religioso ou ideologia política e refere que os seus membros “não procurarão status nas suas ações ou obter lucros financeiros ou profissionais das atividades de respostas emergenciais”.
Desde essa altura, o líder do BUSF Angola, Flávio Canhongo, participou em atividades com entidades governamentais, recebeu recentemente o seu congénere da BUSF Portugal e deu várias entrevistas a órgãos de comunicação social, além de desenvolver ações de formação. A BUSF tem ainda uma filial no Brasil.
Segundo informações de membros do BUSF contactados pela Lusa, o movimento terá recrutado cerca de 55 mil elementos para as suas fileiras, supostamente em troca de quantias monetárias, tendo sido igualmente criada uma empresa de prestação de serviços em várias áreas, da construção ao turismo, designada BUSF Angola, Lda.
Na segunda-feira, o Ministério do Interior angolano deu a conhecer num comunicado as suas preocupações sobre o grupo, que declarou ilegal e constituído por elementos que protagonizam “atos à margem da Lei, com a intenção de confundir a opinião pública nacional e internacional”.
“O Ministério do Interior informa que o referido grupo é ilegal, sem qualquer vínculo com este órgão e seus dirigentes, pelo que repudia, veementemente, as ações desenvolvidas pelo mesmo e aconselha os cidadãos a absterem-se de tais práticas, bem como apela à colaboração com as autoridades na denúncia de atos desta natureza” lê-se no comunicado assinado pelo porta-voz do ministério, Vasco da Gama.
Contactado pela Lusa, Venâncio Pedro que se identificou como diretor de protocolo da BUSF Angola afirmou que, na passada sexta-feira, o escritório da empresa, em Luanda, foi invadido por agentes do Serviço de Investigação Criminal (SIC) que vandalizaram o espaço, levaram telemóveis, computadores e terão apreendido um valor estimado de 5 milhões de kwanzas (5.600 euros), além de prenderem 10 funcionários.
O mesmo responsável disse que Flávio Canhongo não é o atual líder do BUSF, já que decidiu enveredar pela via empresarial, BUSF Angola Lda. sendo os bombeiros liderados agora por Nelo Correia.
Afirmou ainda que o autointitulado comandante Flávio é bombeiro dos serviços de proteção civil angolano e pertence aos quadros do ministério, alegando que tudo foi feito com conhecimento dos seus superiores hierárquicos e que a legislação angolana permite que os bombeiros sejam também dirigentes associativos.
Além disso, acrescentou que os elementos do SIC surgiram no escritório sem ser portadores de qualquer mandado e arrombaram a sala do presidente, além de terem agredido e ameaçado funcionários.
Segundo Venâncio Pedro, o comandante do BUSF não estava presente porque estava em atividades partidárias, já que pertence ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA, no poder).
O mesmo responsável adiantou que os funcionários que foram levados estão em cárcere privado e que os advogados ainda não os conseguiram contactar. Quanto a Flávio Canhongo, estará “em parte incerta” por temer represálias, segundo os membros do BUSF contactados pela Lusa.
Uma fonte policial confirmou à Lusa que estão detidos “alguns elementos do grupo”, sem mais esclarecimentos.
Num vídeo a que a Lusa teve acesso, Flavio Canhongo alega ser vítima de perseguição e de “uma injustiça, uma calúnia”, reforçando que a organização está bem documentada, tal como a empresa, é reconhecida pelo Governo angolano e que tudo está a ser feito para que seja reposta a legalidade.
“Nós não somos bandidos, não usamos fardas da polícia, não usamos nenhum meio do Estado angolano, os meios que nós usamos são nossos”, afirma ainda o líder da BUSF Angola.
“Cada organização de bombeiros é livre de criar os seus distintivos de hierarquia dos seus membros, qual a lei que diz que é crime”, questiona Flávio Canhongo.
Nas páginas de Facebook, é possível encontrar vários vídeos e testemunhos dos membros do BUSF, envergando fardamentos semelhantes aos órgãos do ministério, em que estes declaram a sua lealdade a Deus e à pátria, bem como ao “comandante Canhongo”, queixando-se de perseguição e apelando até à intervenção do Presidente angolano, João Lourenço, para apoiar o seu líder.
A BUSF, segundo o site da organização no Brasil, foi criada em 1 de Janeiro de 2005 e surgiu da iniciativa de um grupo de profissionais brasileiros de resposta a emergências, tendo como primeiro presidente Bolívar Fundão Filho.