“Falta de bom senso”, “atitudes mentirosas” e “linguagem que reflete falta de boa educação”. Estas são as linhas vermelhas que Cavaco Silva traça para os casos em que um primeiro-ministro tem a obrigação de propor a exoneração de um ministro ao Presidente da República.
“Nessas condições, [o primeiro-ministro] tem de esquecer todas as ligações pessoais, todo o bom relacionamento que tem ou que teve com esse ministro e tem de propor ao Presidente da República a sua exoneração”, defende o ex-Chefe de Estado em entrevista ao Nascer do Sol.
Há uma semana, Cavaco Silva lançou o livro “O Primeiro-Ministro e a arte de governar”, que, revela, estava na sua cabeça “há quase 20 anos”. Só não o mostrou ao público antes porque, diz, tinha de “prestar contas aos portugueses” do exercício das funções políticas que exerceu — a passagem por São Bento, primeiro, e pelo Palácio de Belém, depois.
O guia de Cavaco dirigido aos chefes de Governo e a quem os observa parte de uma “reflexão” do antigo primeiro-ministro, através da sua experiência, mas também da “observação dos seis primeiros-ministros que se seguiram”, principalmente, daqueles com quem trabalhou como Presidente da República.
“Das pessoas vivas, eu sou um caso único, porque me sentei na mesa como primeiro-ministro, tendo à minha frente dois Presidentes da República: António Ramalho Eanes e Mário Soares. E sentei-me na cadeira de Presidente da República tendo à minha frente três primeiros-ministros: José Sócrates, Pedro Passos Coelho e depois António Costa. Portanto, eu fui observando com todo o cuidado”, assume na entrevista ao Nascer do Sol.
Cavaco assume que não fez “tudo perfeito”
“Com certeza que cometi alguns erros, porque, como disse, fui aprendendo”, confessa Cavaco na entrevista. E garante: “Eu não fiz tudo perfeito.”
Para o antigo primeiro-ministro, um chefe de Governo que “tente sempre ganhar as eleições, muitas vezes acaba por falhar o seu objetivo”. Cavaco considera que o foco de um chefe do Governo deve ser “conseguir para o país progresso económico, social, cultural, ambiental, numa perspetiva de médio e longo prazo, tendo em conta as gerações futuras”. E puxa dos galardões: “Foi isso que eu fiz.”
Lembra as reformas muito difíceis e impopulares e a habilidade política necessária “para explicar aos portugueses a necessidade de fazer as reformas estruturais mais difíceis. “Apesar de a oposição toda dizer que os portugueses iam pagar mais impostos, eu tinha de ter a habilidade de explicar aos portugueses que era fundamental para o futuro do país. E deixei muitas vezes de lado esse objetivo.”