O senado brasileiro aprovou na quarta-feira um projeto de lei que restringe o direito dos povos indígenas à terra e contraria uma decisão na semana passada pelo Supremo Tribunal Federal a favor dos povos originários.

A proposta havia sido aprovada poucas horas antes numa comissão e foi levada ao plenário do senado com “urgência” pelos grupos mais conservadores, que rejeitaram a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) pelo seu conteúdo e também por acusarem o judiciário de ter “usurpado” os poderes do legislativo.

O projeto dá força de lei ao “marco temporal”, tese rejeitada pelo STF a 21 de setembro, que limita os direitos dos povos indígenas às terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988, quando foi promulgada a atual Constituição brasileira.

No plenário, o projeto foi aprovado com 43 votos a favor e 21 contra, um resultado que demonstrou a força que o conservadorismo e a bancada rural ainda mantêm no Parlamento contra o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, que se opõe ao “marco temporal”.

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Na última semana, os grupos conservadores posicionaram-se contra decisões do STF, que começou a debater a descriminalização do aborto até 12 semanas e a possível despenalização, com certos limites, da marijuana para “fins recreativos”.

O relator do projeto de lei do “marco temporal”, Marcos Rogério Brito, rejeitou na passada quarta-feira a pressão da bancada do governo, que alegava que, mesmo que fosse aprovado pelo plenário do Senado, o novo dispositivo sobre terras indígenas seria denunciado ao STF e declarado inconstitucional.

O líder da bancada do governo no senado, Randolfe Rodrigues, também garantiu que o projeto “será vetado pelo Presidente Lula”, que apenas devolveria o texto às Câmaras legislativas para nova deliberação. No entanto, Brito não aceitou esses argumentos: “a Constituição Federal é muito clara em relação às competências do STF e do poder legislativo. Não dá para alguém vir aqui no senado e sustentar em seu voto que o parlamento brasileiro está desafiando uma decisão do STF”.

A favor do projeto de lei, Brito garantiu que este dará “segurança jurídica” às pessoas que há décadas ocupam áreas reivindicadas pelos povos indígenas, embora o façam sob uma legalidade duvidosa.

O próprio STF reconheceu que muitas dessas pessoas, “de boa fé”, pagaram por essas terras às administrações regionais ou municipais, que as venderam sob a proteção de muitas lacunas legais que existiam antes da Constituição de 1988.

Para estes casos, o STF discutiu na passada quarta-feira formas de indemnização, mas apenas para os casos em que as pessoas não ocuparam as terras através da violência e as adquiriram através de lacunas na lei.

Os juízes decidiram, por unanimidade, que os agricultores com títulos válidos de terras que ainda não eram consideradas indígenas pelo Estado no momento da compra devem receber uma indemnização “justa e prévia” das autoridades, caso sejam despejados. Além disso, abriram a possibilidade de, em caso de “absoluta impossibilidade” de reintegração das terras aos povos indígenas, lhes serem oferecidas outras áreas para se instalarem.

O presidente do senado, Rodrigo Pacheco rejeitou que a aprovação do projeto seja para afrontar o STF. “Não há sentimento revanchista com a suprema corte. Sempre defendi a autonomia do judiciário e o valor do STF. Mas não podemos nos omitir do nosso dever: legislar”, frisou, de acordo com a Agência Senado.

O projeto segue agora para a sanção presidencial, sendo que caberá agora a Lula da Silva a decisão.