Com encenação de Fernando Mora Ramos, a companhia das Caldas da Rainha dá corpo a uma versão da Antígona, de Sófocles, tragédia grega submetida a uma releitura pela autora, tradutora e professora de literatura grega antiga, que “propõe uma versão com claros intuitos pedagógicos, fazendo uso de um vocabulário contemporâneo e reduzindo radicalmente o texto original, conferindo desse modo à ação uma dimensão rítmica”, explica o Teatro da Rainha numa nota à imprensa.

No espetáculo, Antígona desafia o Édito de Creonte, tentando sem autorização deste sepultar o seu irmão morto, mesmo sabendo que esse gesto lhe trará a morte. Creonte acabará por se arrepender, tarde demais, num cenário em que “por um triz se teria evitado tudo, por um triz tudo acontece”.

Antigonick, a versão de Anne Carson, expõe “de modo atual a relação entre a autoridade e a desobediência, o poder soberano (o direito de morte) e a defesa de valores que contrariam a lei da cidade, mais de acordo com a relação democracia versus desobediência civil no presente”, afirma o Teatro da Rainha.

No enredo em que os conflitos levam a uma sucessão de mortes, destaque para “a contraposição masculino feminino a coincidir com autarcia versus desobediência”, numa disputa que, “sendo geracional, é mais que isso”, acabando o gesto de Antígona por derrubar o regime de Creonte que, “face às mortes desencadeadas pelo suicídio de Antígona, do filho Hémon e da mulher Eurídice, se desfaz em dor”.

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Para o encenador Fernando Mora Ramos, “Anne Carson converte os conflitos na sua expressão elementar, não lhes deixa, intencionalmente, mais respiração que a necessária para serem lidos (…)” , atribuindo à peça “uma singularidade com potencial pedagógico”.

Antigonick foi originalmente publicado em 2012 e descrito pela autora como uma “tentativa de transmitir um movimento, um choque ou um obscurecimento que existe no texto original, o que nem sempre significa reproduzir as palavras e as frases originais pela mesma ordem. Uma peça é um conjunto de ações e de gestos, e é isso que precisa de ser traduzido do grego antigo para uma língua atual”.

O resultado pode ser visto no CCC, nas Caldas da Rainha, entre os dias 15 e 25 deste mês, com interpretações de Beatriz Antunes, Carlos Borges, Diogo Marques, Fábio Costa, Henrique Manuel Bento Fialho, Isabel Lopes, João Costa, José Carlos Faria, Mafalda Taveira e Nuno Machado.

Nascida em 1950, Anne Carson tem sido indicada para o Prémio Nobel da Literatura e distinguida pelos mais diversos prémios literários.

Foi a primeira mulher a ganhar o TS Eliot Prize, em 2001. Publicou vários livros de poesia e, desde o livro de estreia, intitulado Eros the Bittersweet: An Essay (1986), que a sua escrita questiona constantemente as fronteiras entre géneros literários.

Em português tem traduzidas as obras Vidro, Ironia e Deus, A Beleza do Marido e Autobiografia do Vermelho, todas pela não(edições).