Um dos aspetos mais realçados do futebol moderno é a mudança de chip: a ideia de que uma equipa dita grande, uma equipa de elite, pode começar a semana a jogar num relvado de pouca qualidade numa qualquer competição nacional e acabá-la num dos maiores estádios do mundo nas principais competições europeias. E poucos exemplos de uma verdadeira mudança de chip eram tão literais como os últimos dias do FC Porto.

Na passada sexta-feira, os dragões estavam a golear o Montalegre, que está atualmente na Liga 3. Esta terça-feira, os dragões estavam na Catalunha a defrontar o Barcelona, cinco vezes campeão europeu. A mudança de chip era obrigatória: a equipa de Sérgio Conceição tinha de desligar da Taça de Portugal, onde passou aos oitavos de final de forma natural, e ligar-se à Liga dos Campeões, onde ainda procurava o mesmo apuramento para os oitavos de final.

Ficha de jogo

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Barcelona-FC Porto, 2-1

Fase de grupos da Liga dos Campeões

Estadi Olímpic Lluís Companys, em Barcelona (Espanha)

Árbitro: Daniele Orsato (Itália)

Barcelona: Iñaki Peña, João Cancelo (Alejandro Balde, 82′), Iñigo Martínez, Ronald Araújo, Koundé, Gündoğan, Frenkie de Jong, Pedri, Raphinha (Lamine Yamal, 90′), João Félix (Ferran Torres, 75′), Lewandowski

Suplentes não utilizados: Ander Astralaga, Diego Kochen, Christensen, Marcos Alonso, Oriol Romeu, Sergi Roberto, Marc Casadó, Fermín López

Treinador: Xavi

FC Porto: Diogo Costa, João Mário (Jorge Sánchez, 68′), Pepe, Fábio Cardoso (Danny Loader, 90′), Zaidu, Pepê, Alan Varela, Stephen Eustáquio (Nico González, 81′), Galeno (Toni Martínez, 90′), Taremi, Evanilson (Francisco Conceição, 82′)

Suplentes não utilizados: Cláudio Ramos, Grujic, Iván Jaime, André Franco, Fran Navarro, Romário Baró, Gonçalo Borges

Treinador: Sérgio Conceição

Golos: Pepê (30′), João Cancelo (32′), João Félix (57′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Fábio Cardoso (36′), a Frenkie de Jong (37′), a João Mário (57′), a João Félix (59′), a Pepê (74′)

O FC Porto entrava em campo já a saber que o Shakhtar Donetsk tinha derrotado o Antuérpia, ou seja, já a saber que independentemente do resultado na Catalunha não poderia apurar-se já esta terça-feira — por outro lado, o Barcelona sabia que uma vitória dava acesso ao passaporte para os oitavos de final. “Um bom resultado é a vitória, sem dúvida. Espero uma grande noite, porque é preciso uma grandíssima noite para levarmos daqui a vitória. A roçar a perfeição. Toda a gente sabe que estes jogos são sempre de altíssimo nível, onde os jogadores estão super motivados”, explicou Sérgio Conceição na antevisão da partida.

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Assim, o treinador português tinha Pepe e Zaidu de regresso ao onze inicial e colocava Eustáquio e Alan Varela no meio-campo e Galeno e Pepê junto aos corredores e a apoiar Evanilson e Taremi. Do outro lado e para além de Gavi, Xavi também não contava com o lesionado Ter Stegen, lançando Iñaki Peña na baliza. João Cancelo e João Félix eram ambos titulares, com o lateral a surgir na esquerda da defesa e o avançado a fazer companhia a Raphinha e Lewandowski no ataque.

O jogo começou sem grandes oportunidades de golo, notando-se um estudo mútuo ao longo dos 20 minutos iniciais. O Barcelona explorava essencialmente o corredor esquerdo, onde João Cancelo funcionava quase como ala e João Félix dava largura quando o lateral ocupava espaços interiores, e o FC Porto optava por um futebol bastante direto — tanto que, ao fim de 22 minutos, Alan Varela ainda não tinha feito qualquer passe. Os dragões atuavam no erro do adversário e a estratégia parecia acertada, até porque os catalães iam falhando diversos passes na primeira zona de construção.

João Félix teve uma das primeiras ocasiões do Barcelona, com um remate à malha lateral (18′), e Taremi respondeu do outro lado com um desvio que passou perto da baliza de Peña depois de um passe de Pepê (22′). Os dragões foram crescendo no jogo e a chegar à meia-hora já atuavam quase por inteiro no meio-campo adversário, permitindo apenas transições rápidas aos catalães e procurando espaço essencialmente no corredor direito, onde João Mário e Pepê revelavam um entendimento acima da média.

Taremi acertou na baliza, mas em posição de fora de jogo (26′), e a vantagem portuguesa na Catalunha não tardaria muito mais: o avançado iraniano rematou à entrada da área contra um defesa, Galeno atirou para defesa de Peña na recarga e Pepê, à terceira, abriu o marcador (30′). A alegria, porém, durou muito pouco. Praticamente no lance seguinte, João Cancelo desequilibrou na esquerda, passou por João Mário sem grande dificuldade e atirou cruzado já dentro da área para empatar, sem qualquer hipótese para Diogo Costa (32′).

O Barcelona ainda teve duas oportunidades para carimbar a reviravolta, com João Félix a atirar por cima (35′) e Raphinha a falhar o alvo na sequência de um erro de Diogo Costa (42′), e o FC Porto poderia ter recuperado a vantagem num lance em que Alan Varela atirou cruzado e Peña evitou o golo com uma enorme defesa (43′). Ao intervalo, porém, catalães e portugueses estavam empatados — num resultado que adiava todas as contas do Grupo H para a última jornada.

O Barcelona começou a segunda parte aparentemente melhor, com João Félix a acertar em cheio na trave nos primeiros segundos depois do intervalo (46′) e a falhar o alvo logo a seguir e na sequência de um passe de João Cancelo (47′). O FC Porto não conseguiu propriamente responder, demonstrando alguma passividade ofensiva e incapacidade na hora de ativar a velocidade nos corredores, e a reviravolta acabou mesmo por surgir ainda antes da hora de jogo.

Num golo totalmente português, Cancelo recebeu na esquerda e combinou com Félix, voltou a dar largura na ala e devolveu ao avançado, que desviou de primeira na grande área para bater Diogo Costa (57′). Os dragões não tiveram capacidade para reagir ao golo sofrido, até porque o Barcelona já não tinha tanta pressa para chegar ao ataque e ia controlando a posse de bola com outra tranquilidade, e Sérgio Conceição decidiu mexer já dentro dos últimos 25 minutos ao trocar João Mário por Jorge Sánchez.

Xavi tirou João Félix a um quarto de hora do fim, lançando Ferran Torres, e o jogo ia caminhando a passos largos rumo ao apito final e sem que a dinâmica se alterasse: o FC Porto tinha dificuldades para desequilibrar, encontrando espaço apenas nas costas da defesa e em situações de transição rápida, e o Barcelona ia gerindo sem grande pressa. João Cancelo ainda teve uma boa oportunidade para bisar, com um remate cruzado que passou ao lado (75′), e Pepê falhou o empate na cara de Iñaki Peña num lance em que Koundé cometeu um erro colossal (80′).

No fim, e mesmo com as entradas de Nico, Francisco Conceição, Danny Loader e Toni Martínez, o FC Porto perdeu com o Barcelona e garantiu o apuramento dos catalães para os oitavos de final da Liga dos Campeões, adiando a própria sorte para a última jornada e para o jogo no Dragão com o Shakhtar Donetsk. Num dia em que apanhou os compatriotas pela frente e nunca conseguiu estancar o próprio corredor, João Mário percebeu o porquê de aqueles dois, Félix e Cancelo, serem os Joões dos milhões.