Já tinha ganho a Supertaça do Brasil numa sensacional decisão frente ao Flamengo com sete golos (4-3), já tinha o Campeonato Paulista após golear o surpreendente Água Santa por 4-0 depois da derrota na primeira mão pela margem mínima, queria ganhar muito mais. Assim como o plantel e a qualidade futebolística iam aumentando, também a ambição do Palmeiras chegava a nível como há muito não se via. No entanto, entre a terceira semana de setembro e a terceira de outubro, tudo parecia ter ruído: o Boca Juniors foi mais forte no desempate por grandes penalidades nas meias-finais da Taça dos Libertadores, pelo meio o Verdão teve uma série de quatro derrotas seguidas no Campeonato que deixou a equipa a 14 pontos da liderança com apenas 11 jornadas por disputar. Época perdida? Não, época para ganhar. E a festa chegou esta madrugada.
Entre o demérito de um Botafogo em queda livre (para muitos o Campeonato ficará sempre recordado como o ano em que o Botafogo perdeu e não o ano em que o Palmeiras ganhou), Abel Ferreira teve o mérito de fazer o mais complicado e reerguer uma equipa que estava na quinta posição sem grandes expetativas para o resto da temporada até ao topo da classificação, sendo virtualmente campeão depois do triunfo por 1-0 na receção ao Fluminense mas a ter de defender na partida frente ao Cruzeiro uma vantagem de oito golos face ao Atl. Mineiro, que jogava com o Bahia (e 16 em relação ao Flamengo). Ou seja, era apenas “confirmar” os números finais da festa chegando à ronda decisiva como equipa com mais vitórias, menos derrotas, mais golos marcados e segunda com menos golos sofridos para os adeptos iniciarem a (preparada) festa, muito assente naquela que tem sido um dos principais chavões do técnico: “Cabeça fria, coração quente”.
Mais uma vez, aconteceu de tudo um pouco. Ao longo do ano, o Palmeiras realizou um total de 73 encontros oficiais, com 41 vitórias e 124 golos marcados, numa média de um jogo a cada cinco dias. A título de exemplo, o Manchester City, campeão europeu e inglês, leva este ano 59 partidas, numa média de 6,2 dias. E houve de tudo um pouco, entre os elogios ao trabalho de Abel Ferreira desde que chegou ao Brasil, as críticas feitas por alguns comentadores e os desabafos do técnico que admitiu, por mais do que uma vez, estar de “saco cheio” com a autêntica loucura que se vive no Brasil a nível de pressão, de calendário e de jogos. O “saco” continua cheio mas de vitórias, com o título a ser carimbado com um empate frente ao Cruzeiro a um, com golos de Endrick (21′) e Nikão (80′), numa jornada em que o Atl. Mineiro foi goleado pelo Bahia (4-1), o Flamengo perdeu com o São Paulo (1-0) e o Grémio subiu a segundo após vencer o Fluminense (3-2).
Com mais um triunfo, Abel Ferreira chega aos nove títulos pelo Palmeiras em pouco mais de três anos, entre duas Taças dos Libertadores (2020 e 2021), dois Campeonatos (2022 e 2023), uma Supertaça Sul-Americana (2022), uma Taça do Brasil (2020), uma Supertaça do Brasil (2023) e dois Campeonatos Paulistas (2022 e 2023). Com isso, o português tornou-se o treinador estrangeiro com mais títulos no Brasil e o segundo com mais títulos no Palmeiras, sendo ainda o primeiro estrangeiro a sagrar-se bicampeão, algo que só tinha acontecido antes três vezes e com treinadores brasileiros no comando das respetivas equipas. Abel passa também a ser o segundo técnico português com mais títulos por um único conjunto no estrangeiro, atrás de Manuel José (20 troféus pelo Al Ahly do Egito) e à frente de José Mourinho (oito no Chelsea).
Ao longo de 252 jogos desde que chegou em novembro de 2020, Abel Ferreira conseguiu um total de 145 vitórias com 431 golos, sendo o treinador com mais finais pelo Verdão e com mais triunfos em partidas a contar para a Taça dos Libertadores. Em termos de Campeonato, prova que ganhou em 2022 e 2023, tem sido a melhor equipa nos dois últimos anos a nível de pontos (151), mais vitórias (43), menos derrotas (11), mais golos marcados (130), menos golos consentidos (60) e mais partidas com a baliza a zero (35).
Por definir fica agora o futuro do técnico, à semelhança do que aconteceu na última temporada. O técnico voltou a ser alvo de chorudas propostas de ligas de outros continentes capazes de funcionar quase como um Euromilhões para quem aceite o desafio mas preferiu manter sempre como ponto principal a vertente mais desportiva, recusando todas essas abordagens. No entanto, o desgaste continua a ser evidente no Brasil, pelo que uma oferta de um conjunto de uma das principais ligas europeias poderá demover Abel Ferreira da ideia de permanecer no clube onde fez história e se tornou um autêntico herói dos adeptos.