Quando se olha para trás, parece bem mais. Quase uma década. No limite, uma eternidade. No entanto, essa é uma mera ilusão de ótica refletida por um calendário onde a exceção era não jogar também a meio da semana. Quando assumiu a decisão de deixar a Europa, neste caso os gregos do PAOK, e arriscar uma aventura na América do Sul onde Jorge Jesus deixara marca no Flamengo, Abel Ferreira ia preparado para quase tudo. Estudou a história do Palmeiras, foi conhecendo mais ao detalhe os jogadores com que podia contar, percebeu a realidade do futebol brasileiro. Tudo menos um calendário com 74 jogos num só ano civil, como aconteceu por exemplo em 2021. Valeu a pena. E nova coroação faz com que valha mais.

Treinos de manhã, grupos de WhatsApp, drones e muito trabalho mental: a vida do Professor Abel até ser campeão em três meses

O português não está há uma eternidade, nem há quase uma década em São Paulo, agora com a família mas durante largos meses sozinho. Contas feitas, passaram apenas dois anos desde que fez a estreia pelo Palmeiras, num jogo com o Bragantino para a segunda mão dos oitavos da Taça do Brasil que acabou com um triunfo pela margem mínima (1-0). Daí para cá, fosse pelas declarações que ia tendo em algumas conferências, pelo comportamento na zona técnica com os árbitros ou em alguns casos apenas por não ser brasileiro, nem sempre foi elogiado pela crítica mas fez aquilo que nem a crítica pode deixar de elogiar: ganhou tudo. E até o único título que estava por conquistar foi garantido esta madrugada.

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Abel cruzou o Atlântico porque lhe deram uma equipa. Abel ganhou porque criou uma família (a crónica da final da Libertadores)

Depois da Taça dos Libertadores (Santos, 1-0) e da Taça do Brasil (Grémio, 1-0) relativas à época 2020, o Palmeiras falhou a final do Mundial de Clubes (Tigres, 0-1), perdeu nas grandes penalidades a Supertaça do Brasil (Flamengo, 2-2, 5-6 g.p.) e voltou a cair no desempate por castigos máximos da Supertaça Sul-Americana (Defensa y Justicia, 2-1 e 1-2, 3-4 g.p.), além de sair derrotado também na final do Campeonato Paulista (São Paulo, 0-0 e 0-2). Esse foi o período mais complicado do técnico mas uns meses depois já estava a fazer história, com a reconquista da Taça dos Libertadores com o Flamengo (2-1, a.p.). Apesar de ter perdido a final do Mundial de Clubes no prolongamento com o Chelsea (2-1), foi uma viragem.

Entre tantos nomes, podem chamar-lhe mais um: bicampeão continental. Abel faz história e ganha segunda Libertadores seguida com Palmeiras

Este ano, começou por conquistar a Supertaça Sul-Americana (Athl. Paranaense, 2-2 e 2-0), ganhou de seguida o Campeonato Paulista (São Paulo, 1-3 e 4-0) e esteve quase sempre na liderança do Campeonato do Brasil, o título que lhe faltava ainda a conquistar. A terceira final consecutiva da Taça dos Libertadores não ficou longe, com uma derrota nas meias-finais em encontros onde ficou cedo reduzido a dez com o Athl. Paranaense (0-1 e 2-2), mas era na principal prova nacional que estava o foco e com a vantagem na liderança a aumentar de jornada para jornada. Agora, naquela que poderia ser a primeira ronda de decisões, o Palmeiras foi ganhar fora ao Athl. Paranaense e beneficiou de novo deslize do Internacional frente ao América (0-1), carimbando o triunfo na competição que ainda não tinha na 35.ª ronda.

O Verdão, que vai fazer a festa esta madrugada num Allianz Parque mais uma vez esgotado para a receção ao Fortaleza, consegue quebrar um jejum de quatro anos sem ganhar o Campeonato, reforçando o estatuto de clube com mais títulos (11) à frente de Santos (oito), Corinthians, Flamengo (sete) e São Paulo (seis). No caso de Abel Ferreira, foi o sexto troféu ganho em menos de dois anos desde o início no Palmeiras, igualando com o número de títulos de Luiz Felipe Scolari e ficando só a dois de Vanderlei Luxemburgo.