“Poema da farra”Em atualização
Morreu em Lisboa Ruy Mingas, antigo embaixador de Angola em Portugal, poeta, cantor e músico da resistência angolana, compositor da conhecida canção Meninos do Huambo, aos 84 anos.
A morte do antigo ministro angolano foi confirmada ao Observador pela embaixada de Angola em Portugal, que emitiu uma nota de pesar. No comunicado, a embaixadora recorda que Ruy Mingas, “juntamente com Manuel Rui Monteiro, foi o autor da letra do hino nacional de Angola, o Angola Avante. Foi, também, além de político, deputado no Parlamento angolano, diplomata, poeta e compositor”.
Nascido a 12 de maio de 1939 em Luanda, o também cantor angolano conquistou em “2014 um prémio atribuído pela Sociedade Portuguesa de Autores”, refere Maria de Jesus Ferreira, acrescentando que, “em Portugal, foi também distinguido com o prémio Personalidade Lusófona, entregue pelo Movimento Internacional Lusófono, em 2016”. Seis anos antes já tinha recebido o Prémio de Arte, Cultura e Letras da Academia Francesa de Educação.
Militante ativo do MPLA (Movimento Popular da Libertação de Angola, partido que está no poder desde a independência de Portugal, em 1975), musicou poemas de nacionalistas angolanos como Viriato da Cruz, Agostinho Neto, Mário António e António Jacinto, por exemplo.
Mas Ruy Mingas não era apenas um homem da cultura. “Foi também praticante de atletismo nas décadas de 1950 e 1960, tendo competido no salto em altura e nos 110 metros barreiras [no Benfica], conquistando um recorde nacional de Portugal, em 1960”, diz ainda a embaixada.
Em 1979 assumiu, durante 10 anos, como ministro, a pasta “da Educação Física e Desportos, sendo o grande responsável pelo período pujante do desenvolvimento do desporto em Angola”, considera a embaixadora.
Esteve a representar diplomaticamente Angola em Portugal, como embaixador entre 1990 e 1995 mas os portugueses conhecem-no melhor como o cantor, e um dos autores, de Meninos do Huambo, que tem letra de Manuel Rui Monteiro e que teve mesmo uma versão no registo de fado de Paulo de Carvalho. Aliás, Ruy Mingas chegou a participar no programa televisivo de sucesso em Portugal dos anos 70, o Zip-Zip, com Raul Solnado, Fialho Gouveia e Carlos Cruz.
Já os angolanos estão familiarizados com outros temas da sua discografia onde constam canções como Monangambé, Quem Tá Gemendo, Adeus À Hora da Partida, Muimbu Ua Sabalu (todos de 1974).
Ou ainda Cantiga Por Luciana (1975) ou o dançável Poema da Farra, com uma toada brasileira e jazz à mistura, que também foi interpretado por Paulo de Carvalho, Dany Silva, Mario de Oliveira ou numa nova versão por Fausto.
Marcelo Rebelo de Sousa recorda-o como personalidade da”mitologia moderna de Angola”
O chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa, lamentou a morte de Rui Mingas, que recordou como uma personalidade “da mitologia moderna de Angola”.
“Mesmo que não tivesse sido um dos autores do hino nacional de Angola, Rui Mingas faria parte da mitologia moderna de Angola nos últimos anos do império e nas primeiras décadas da independência”, considera Marcelo Rebelo de Sousa, numa nota de pesar publicada no sítio oficial da Presidência da República Portuguesa na internet.
O chefe de Estado português acrescenta que Rui Mingas “parece ter estado em todos os lugares onde Angola se afirmou como jovem nação”, referindo que foi “atleta do Benfica nas décadas de 1950 e 60 “e depois, sucessivamente, “militante político, cantor e compositor, embaixador de Angola em Portugal, ministro, deputado e empresário”.
Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, Rui Mingas participou na afirmação de Angola como nação “em confronto com o regime português até 1974, mas não em choque com Portugal, pois também os portugueses reconheceram nele um símbolo da nossa relação com os angolanos, que abarca as vicissitudes passadas, as memórias e afetos em comum, um futuro de parceria e respeito mútuo”.
No fim desta mensagem, o Presidente da República apresenta “as suas sentidas condolências” à família e amigos de Rui Mingas.
O Presidente angolano também expressou o seu pesar pela morte de Rui Mingas, uma “personalidade de grande prestígio”, que várias vezes representou Angola “com talento, competência e dignidade”.
Numa nota endereçada à família, João Lourenço frisou que Rui Mingas começou por elevar o nome de Angola no atletismo profissional em Portugal e, desde cedo, se afirmou como compositor e cantor, como símbolo de resistência contra o poder colonial.
“Pertencem-lhe vários clássicos da música angolana, entre eles a música do Hino Nacional”, sublinhou o chefe de Estado angolano na sua mensagem.
João Lourenço realçou ainda os cargos de responsabilidade política desempenhados por Rui Mingas na Angola independente, tanto a nível interno como externo, tendo sido deputado à Assembleia Nacional, secretário de Estado da Educação Física e Desporto, embaixador e reitor de uma universidade privada.
Segundo o Presidente angolano, a sua morte empobrece o país e deixa luto à sua família e toda uma vasta legião de amigos e companheiros de trabalho. “A todos, em particular a sua viúva e filhos, expressamos as nossas condolências e os nossos sentimentos de pesar”, concluiu.
Também o Ministério da Cultura e Turismo de Angola lamentou a morte de Rui Mingas, destacando os seus feitos. Numa nota de condolências, o ministro da Cultura e Turismo angolano, Filipe Zau, sublinha que foi com profunda dor e consternação que tomou conhecimento da morte de Rui Mingas.
Zau destaca que, proveniente de uma família de músicos, Rui Mingas foi influenciado pelo seu tio Liceu Vieira Dias e, por sua vez, inspirou o seu já falecido irmão André Mingas e suas filhas Katila Mingas e Ângela Mingas.
“Além de ter composto com o escritor Manuel Rui o Hino Nacional de Angola, esta parceria também se notabilizou através da conhecida canção ‘Meninos do Huambo’, divulgada, em Portugal, através do músico Paulo de Carvalho”, destaca a nota.