Em dia de carnaval, durante a noite também se brincou ao faz de conta. Faz de conta que é um jogo do campeonato nacional de polo aquático, faz de conta que os futebolistas são mergulhadores profissionais, faz de conta que o Estádio D. Afonso Henriques é uma piscina. Vive-se numa era em que as estatísticas futuristas são muito usadas no debate desportivo. Os chamados expected goals são uma forma matemática que supostamente indica a probabilidade que um jogador ou uma equipa tem de marcar num determinado jogo, mas, a não ser que as equipas técnicas dos clubes agora sejam compostas por profissionais do Instituto Português do Mar e da Atmosfera, não existia quem pudesse imaginar o que ia acontecer na jornada 21 do campeonato entre o Vitória SC, de Guimarães, e o Benfica.

Quando era passada de uns pés para os outros, a bola deixava um rasto pelo caminho devido à chuva. Assim que Miklós Fehér foi homenageado por todos os jogadores com a colocação de uma coroa de flores no local onde o húngaro sorriu pela última vez, percebeu-se que nenhuma das equipas tinha uma estratégia à prova de água. Todos queriam trocar o esférico de pé para pé mesmo com os riscos que isso acarretava. Os centrais e os guarda-redes de ambas as partes foram os primeiros a perceber que o melhor para reduzir a possibilidade de afogamento era despejar na frente, num estilo habitualmente designado de chuveirinho e que devia ser de uso exclusivo num jogo como este.

Basicamente, para as duas equipas foi uma semana de trabalho deitada ao lixo, em que se combinaram jogadas que pouco se compadeciam com este cenário. Não era por certo para ser referência no jogo aéreo que o treinador do Benfica, Roger Schmidt, colocou Rafa como homem mais destacado na frente quando no banco tinha Arthur Cabral, Casper Tengstedt e Marcos Leonardo. Álvaro Pacheco também tinha algo preparado em que Nuno Santos era a melhor opção para completar um onze onde convinha ter alguém com capacidade de romper e não particularmente de jogar em ataque continuado. Por isso, a capacidade de passe de João Mendes caiu das opções iniciais, confiando o técnico que Tiago Silva e Handel eram capazes de oferecer à equipa formas de encontrar ligação com os disparos de Jota Silva, Nuno Santos e André Silva, o trio adiantado do 3x4x3.

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Ficha de Jogo

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Vitória SC-Benfica, 2-2

21.ª jornada da Primeira Liga

Estádio D. Afonso Henriques, em Guimarães

Árbitro: Luís Godinho (AF Évora)

Vitória SC: Charles, Bruno Gaspar, Borevkovic, Jorge Fernandes, Tomás Ribeiro, Ricardo Mangas, Handel, Nuno Santos (Zé Carlos, 77′), Tiago Silva, Jota Silva (Nélson Oliveira, 86′) e André Silva (Manu Silva, 67′)

Suplentes não utilizados: Rafa, Miguel Maga, João Mendes, André André, Kaio César e Afonso Freitas

Treinador: Álvaro Pacheco

Benfica: Trubin, Bah, António Silva, Otamendi, Morato (Marcos Leonardo, 77′), João Neves (David Neres, 87′), Kokcu (Florentino, 45′), Di María, Aursnes (Álvaro Carreras, 87′), João Mário (Arthur Cabral, 45′) e Rafa

Suplentes não utilizados: Samuel Soares, Casper Tengstedt , Tomás Araújo e Tiago Gouveia

Treinador: Roger Schmidt

Golos: Tiago Silva (35′), Rafa (40′), André Silva (61′) e Arthur Cabral (90′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Jota Silva (9′), Kokcu (33′), Bruno Gaspar (38′), António Silva (44′), Florentino (77′) e Nélson Oliveira (90+5′); cartão vermelho a Borevkovic (64′)

É legítimo. Não havia como antecipar a influência que as condições externas iam ter. O Vitória SC foi a primeira equipa a sofrer com elas. Jota Silva deslizou de carrinho para atacar como conseguiu um cruzamento vindo da direita do ataque. Aquele golpe na bola ia muito possivelmente para o fundo das redes da baliza de Trubin, mas a poça interposta entre o local do remate e a baliza fez com que tudo terminasse por ali. Porém, os conquistadores foram astutos a usar toda aquela água para mergulhar. Tomás Ribeiro, com o incentivo irregular de Kokcu, caiu por terra (ou talvez seja mais adequado dizer que caiu para o mar). Assinalada a grande penalidade, Tiago Silva (35′) bateu Trubin, guarda-redes ucraniano que travou bons duelos com os remates de média distância de Nuno Santos, embora perante esta situação não se tenha conseguido impor.

O Vitória SC entrava em campo sabendo que, conquistando três pontos, podia subir ao quarto lugar e ultrapassar o rival Sp. Braga que tinha perdido em Alvalade. No entanto, Rafa (40′) foi expedito a empatar. A finalização não foi nada bonita e também foi atrapalhada pela humidade. Sem obstáculos que impedissem um serviço sublime, Di María fez a assistência de trivela.

Para Schmidt, se com um barco a remo não estava a funcionar, então era preciso arranjar um motor que desse andamento à embarcação. O treinador alemão viu no músculo de Florentino e Arthur Cabral esse estímulo. Kokcu deixou o campo depois de, num livre, até ter ameaçado um grande golo. Valeu Charles, o guarda-redes que rendeu o capitão Bruno Varela a contas com uma lesão muscular. Se, perante as condições, alguns jogadores se mascararam daquilo que não são, tecnicistas como Kokcu e João Mário não se adaptaram nem trouxeram as bóias.

Num relvado tão regado, em vez de flores, cresceram Silvas e os encarnados picaram-se. Depois de Jota, foi André (61′) que atacou. O passe do primeiro para o segundo trouxe mais um golo e voltou a colocar o Vitória SC na frente. Só que o resultado vantajoso exigiu que os vimaranenses fossem obrigados a um esforço acrescido após Borevkovic ter arrancado Florentino pela raiz e ter deixado os conquistadores com menos um jogador em campo. Era um alerta vermelho. Ainda assim, foi Jota Silva que, isolado, falhou o terceiro na cara de Trubin. O extremo pagou caro por esse erro, porque os minhotos não conseguiram sobreviver até ao final. Arthur Cabral (90′), que certamente teria sido titular caso Schmidt conseguisse prever as condições meteorológicas, cabeceou para o empate (2-2). Uma nova assistência de Di María valeu o segundo golo aos encarnados que saem do encontro com os mesmos 52 pontos que o Sporting, mas com mais um jogo que os leões.