Os operadores ferroviários vão sofrer um aumento de 23% na taxa de uso que pagam para utilizar a infraestrutura ferroviária. Este é o aumento aplicado este ano pela gestora da rede, a empresa pública Infrastruturas de Portugal (IP), que é aplicado ao arrepio de uma recomendação feita pelo regulador do setor no sentido do agravamento temporário ser transitoriamente suspenso.

Em comunicado divulgado esta sexta-feira, a APEF (Associação Portuguesa de Empresas Ferroviárias) contesta a medida que “volta a penalizar a ferrovia” e confessa-se desiludida porque a decisão de manter o aumento das taxas de uso terá sido tomada “ao invés do que foi prometido à APEF pelo Governo e pela AMT (Autoridade de Mobilidade e Transportes).

De acordo com a APEF, esta subida já estava prevista desde setembro do ano passado, mas perante a reclamação feita junto da IP e da tutela dos transportes — o Ministério das Infraestruturas — foi “criada a expetativa de que o valor da taxa inicialmente proposto pela IP iria ser reduzido, mas não foi isso que aconteceu”.

De acordo com informação recolhida pelo Observador, os operadores reuniram com o Governo sobre esta preocupação ainda quando João Galamba estava à frente da pasta em 2023, mas também em 2024 com o secretário de Estado da Infraestruturas, Frederico Francisco, já com a tutela da pasta entregue ao primeiro-ministro, António Costa.

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Citado no comunicado, o diretor-executivo da APEF, Miguel Rebelo de Sousa, diz que “esta decisão surpreende-nos muito porque vai contra tudo o que tem sido defendido para o setor ferroviário a nível nacional e europeu. As expetativas criadas pelo Governo e pela própria recomendação da AMT também não foram cumpridas”.

O responsável não aceita a explicação da IP de que “está a cumprir o estabelecido nos regulamentos comunitários” porque não refere que em operadores de outros países “não estão a ser confrontados com decisões desta natureza, antes pelo contrário, tendo, por exemplo, sido aprovado em Espanha o congelamento da Taxa de Uso para 2024, pagando os operadores oito vezes menos Taxa de Uso do que em Portugal”.

Para Miguel Rebelo de Sousa, “esta não é uma questão administrativa, é uma questão de política pública e de opções do Estado português.” A APEF representa três operadores ferroviários de mercadorias — a Medway, a Takargo e a Captrain España.

O Observador questionou a IP, mas não obteve respostas, para já.

Taxa de uso sobe para a ferrovia e portagens descem para algumas autoestradas

Para além das conversas a nível político, na qual terão sido dados sinais de que o aumento daquela dimensão não iria para a frente, os operadores contavam com uma recomendação feita pela AMT em outubro. “No atual contexto de incerteza económica e de ajustamento da política regulatória a nível europeu, considera-se aconselhável não proceder, transitoriamente, a acréscimos tarifários na ordem dos 20%, tal como proposto pela IP, quanto à utilização da infraestrutura”. Neste período, o Governo aprovou descontos adicionais de 30% em algumas autoestradas do interior, que são muito importantes para o tráfego de mercadorias, e Algarve para 2024, tendo o programa socialista como uma bandeira a eliminação de portagens em várias ex-Scut.

A AMT pedia ainda uma revisão do regime de taxas de carbono e fiscal sobre os combustíveis fósseis que tornasse “mais equitativo o tratamento do setor ferroviário face ao setor rodoviário” e que tivesse em consideração à inexistência de alternativas viáveis na via ferroviária na ponderação relativa à aplicação de uma taxa ao transporte rodoviário de mercadorias. A recomendação da AMT ia ainda no sentido de introduzir medidas de melhoria de desempenho da rede e da competitividade do setor.

O modelo tarifário aplicado à ferrovia parte de um regulamento europeu que define a imputação dos custos diretos associados à exploração do serviço ferroviário. Esse modelo foi aplicado pela primeira vez em 2020, tendo por base os custos apurados no último ano em que as contas da IP estavam aprovadas e certificadas no momento da publicação do diretório de rede, e que foi 2017.

Nos anos seguintes, 2021, 2022 e 2023, o tarifário foi atualizado com base na inflação e não refletindo o cálculo anual dos custos diretos que subiram de forma muito significativa sobretudo por causa da mão-de-obra e despesas com manutenção. Por outro lado, e por causa do efeito da pandemia no tráfego ferroviário, os países foram autorizados a adiar ou reduzir essas tarifas.

Corrigida a indicação de que tinha sido feito um contacto com a secretaria de Estado das Infraestruturas.