A Associação para o Planeamento da Família (APF) defendeu esta quinta-feira que devia ser universalizado o rastreio das infeções sexualmente transmissíveis nos cuidados de saúde primários.
“Devia ser universalizado o acesso a alguns testes [de diagnóstico] que neste momento já acontece nalguns centros de saúde”, disse Mara Carvalho, médica de família e membro da direção da APF, que falava à agência Lusa a propósito do Dia Internacional das Mulheres, assinalado a 8 de março.
Os últimos relatórios epidemiológicos anuais do Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), divulgados esta quarta-feira, revelam que as infeções sexualmente transmissíveis como gonorreia, clamídia e sífilis dispararam em Portugal, e na Europa, afetando sobretudo jovens dos 20 aos 24 anos.
Infeções sexualmente transmissíveis disparam em Portugal e na Europa
Mara Carvalho disse ter “muitas dúvidas” sobre se os casos estão verdadeiramente a aumentar ou se esta subida se prende com a realização de mais testes de diagnóstico.
“Se vamos estudar mais, se vamos fazer mais testes, é natural que vamos detetar mais infeções“, sustentou.
Para a médica, também é preciso apostar na prevenção, o que tem a ver com a educação, melhorar o que já existe como, por exemplo, a educação sexual nas escolas.
“A escola é uma parceira fundamental (…) mas os adultos também precisam de formação e a colaboração com algumas ONG [organizações não-governamentais], como por exemplo a APF, também seria importante haver mais acesso a educação para a saúde sexual e reprodutiva no geral”, defendeu.
A dirigente nacional do Movimento Democrático de Mulheres (MDM), Fátima Amaral disse, por seu turno, que “a maior parte das escolas públicas não têm um espaço, nem têm pessoas preparadas” para transmitirem e dialogarem com os jovens sobre questões em que está a haver retrocessos, nomeadamente nas doenças sexualmente transmissíveis.
Fátima Amaral apontou também outras preocupações do MDM relacionadas com as dificuldades de acesso das mulheres à saúde, nomeadamente das mais velhas, de quem “muitas vezes não se fala”.
Segundo a responsável, em relação a este grupo há dois eixos que preocupam, apontando como o primeiro a especialidade de Geriatria, “que não existe praticamente nos cuidados de saúde primários e é extremamente importante para preparar também as mulheres para o envelhecimento”.
O segundo eixo está relacionado com “o défice enorme” de consultas de especialidade e de equipas multidisciplinares para acompanharem as mulheres nesta fase da vida em que sofrem de muitas doenças e têm que ser acompanhadas, salientou.
Outro “problema grande” indicado por Fátima Amaral está relacionado com o facto de “uma percentagem muito significativa” de mulheres que são convocadas para fazer o rastreio do cancro da mama não comparecer.
Como razões para esta situação, a responsável apontou o facto de as campanhas de sensibilização são serem feitas com “a dinâmica e com a orientação devida” no sentido” de ter em conta que as mulheres trabalham.
“Se os rastreios não forem feitos próximo das empresas onde trabalham ou das suas residências” e se não houver “uma divulgação atempada” do local onde vai fazer o rastreio, a mulher depois não tem condições de se ausentar da empresa para o ir fazer, salientou.
Quanto ao planeamento familiar, salientou como positivo o SNS distribuir os métodos contracetivos mais modernos e os mais adequados, mas disse haver em muitos centros de saúde “falhas nos horários” ou não haver mesmo consultas por falta de profissionais de saúde.
“Como não existe, há aqui um problema: os jovens têm relações sexuais, não utilizaram contracetivo, e a seguir querem a contraceção de emergência e muitas vezes têm que ir à farmácia, porque os centros de saúde naquela altura não tem”, referiu, observando que o preço não está acessível a todos os jovens.
Resumindo, Fátima Amaral disse que, no caso da saúde da mulher, “houve conquistas incomensuráveis” que foram “fruto da ação de profissionais de saúde e das mulheres”.
“Mas tendo em conta o que foi o desinvestir no Serviço Nacional de Saúde e alimentar o setor privado com o dinheiro que devia estar a ser investido no SNS está a haver, e houve, a partir sobretudo dos últimos 15 anos, grandes retrocessos no acesso aos cuidados de saúde relativamente às especificidades da mulher”, sustentou.
Para a dirigente do MDM é preciso continuar a falar sobre os problemas, “reclamar e dizer aos próximos deputados que vão ser eleitos para a Assembleia da República que respeitem os direitos da mulher na área da saúde”.