A biodiversidade diminuiu entre 2% e 11% no século XX devido apenas a mudanças no uso da terra, mas o papel das alterações climáticas pode ganhar importância, indica um estudo comparativo de modelos divulgado na revista Science.

As projeções da análise, na qual participaram dois investigadores portugueses, “mostram que, em meados do século XXI, as alterações climáticas poderão tornar-se as principais responsáveis pelo declínio da biodiversidade”, segundo um comunicado do Centro Alemão para a Investigação em Biodiversidade Integrativa (iDiv).

Por outro lado, uma meta-análise global de 186 estudos revela que as ações de conservação — especialmente as que visam espécies e ecossistemas — têm impactos positivos significativos na biodiversidade, refere um comunicado da Associação Americana para o Avanço da Ciência (AAAS).

No caso do primeiro estudo, o “maior do género”, investigadores do iDiv e da Universidade de Halle-Wittenberg (MLU) compararam 13 modelos para avaliar o impacto das mudanças no uso do solo e das alterações climáticas, tendo em conta quatro métricas de biodiversidade, bem como nove serviços dos ecossistemas.

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“Ao incluir todas as regiões do mundo (…), conseguimos preencher muitos pontos cegos e dar resposta a críticas de outras abordagens com base em dados fragmentados e potencialmente tendenciosos”, afirma o português Henrique Pereira, biólogo da conservação e líder do grupo de cientistas que participou no estudo, que é o primeiro autor do artigo.

“Todas as abordagens têm vantagens e desvantagens. Acreditamos que a nossa abordagem (…) fornece a estimativa mais abrangente das tendências da biodiversidade em todo o mundo”, acrescentou, citado no comunicado.

Os investigadores calcularam o impacto das mudanças no uso do solo nos serviços ecossistémicos, ou seja, “os benefícios que a natureza proporciona aos seres humanos”, e analisaram como estes e a biodiversidade poderão evoluir, tendo em conta a importância crescente das alterações climáticas.

Nos três cenários avaliados — desde o do desenvolvimento sustentável até ao de emissões elevadas de gases com efeito de estufa — “os impactos combinados das mudanças no uso dos solos e das alterações climáticas resultam na perda de biodiversidade em todas as regiões do mundo”, embora existam “variações consideráveis” entre as zonas.

“O objetivo dos cenários de longo prazo não é prever o que vai acontecer”, mas “compreender as alternativas e, portanto, evitar as trajetórias que podem ser menos desejáveis e escolher as que têm resultados positivos. As trajetórias dependem das medidas escolhidas e estas decisões são tomadas dia a dia”, explicou a bióloga portuguesa Inês Martins, da Universidade de York e coautora do artigo divulgado na Science.

Neste contexto, ganha relevância a descoberta, feita através da meta-análise divulgada pela AAAS, de que “em dois terços dos casos, as ações de conservação tiveram um efeito positivo, melhorando o estado da biodiversidade ou pelo menos retardando o seu declínio”.

A equipa de investigadores liderada por Penny Langhammer, professora adjunta de biologia na Arizona State University e vice-presidente executiva da organização não-governamental Re:Wild (que defende a recuperação e a proteção da biodiversidade em todo o mundo), revelou que as intervenções mais eficazes e de maior efeito são as “dirigidas às espécies e aos ecossistemas, tais como as de controlo de espécies invasoras, de recuperação de ‘habitats’, áreas protegidas e gestão sustentável”.

Apesar de milhares de milhões de dólares serem gastos todos os anos em ações de conservação visando “travar e/ou reverter a perda de biodiversidade e a degradação dos ecossistemas (…) muitos objetivos internacionais sobre conservação, incluindo os estabelecidos pela Convenção sobre a Diversidade Biológica, continuam por alcançar”.

O estudo defende que, para determinar as futuras medidas, é necessária uma avaliação aprofundada dos objetivos políticos e uma análise dos resultados das atuais intervenções de conservação em termos de biodiversidade. E, para reverter a crise global da diversidade, as ações de conservação devem aumentar e ser aplicadas de modo mais amplo, o que “exigirá um investimento adicional significativo em muitos setores da sociedade”, adiantam Penny Langhammer e seus os colegas.