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"Big Boys": a vida trocada por miúdos (grandes)

Entretenimento bem feito, sem ambições geradas por algoritmo, com uma história dividida em capítulos curtos e humor facilmente relacionável. A receita está disponível em seis episódios na FilmIn.

Dylan Llewellyn é Jack, às voltas com o luto e a sexualidade; Jon Pointing é Danny, o universitário fora de horas que tem tanto a ensinar como a aprender
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Dylan Llewellyn é Jack, às voltas com o luto e a sexualidade; Jon Pointing é Danny, o universitário fora de horas que tem tanto a ensinar como a aprender

Dylan Llewellyn é Jack, às voltas com o luto e a sexualidade; Jon Pointing é Danny, o universitário fora de horas que tem tanto a ensinar como a aprender

No canal britânico Channel 4 há um programa absolutamente brilhante chamado Gogglebox. A descrição nunca fará justiça ao quão bom e entretido é, melhor seguir o cliché e ver para crer, só assim se percebe porque é que  funciona e porque é que é tão viciante. Foi criado em 2013 e é uma boa variação da reality TV, uma espécie de autorreflexão involuntária sobre o género. Resumidamente: famílias dispõem-se a serem filmadas em casa, enquanto comentam uma série de programas previamente escolhidos. Podem ser outros reality shows, séries, programas de talentos, notícias ou até a transmissão do funeral da rainha. As famílias são regulares, com o tempo vamos criando uma relação com elas. Mais do que um retrato social, Gogglebox é excelente entretenimento, até porque é raro detetar show off perante a câmara. É tudo muito normal, familiar, caseiro.

Em Gogglebox, alguns dos conteúdos escolhidos para serem vistos pelas famílias protagonistas são pedaços marcantes de séries. E aí incluem-se twists, finais, cliffhangers, coisas que podem arruinar a experiência para quem está sempre a ver o copo meio vazio, mas que também podem servir de teaser, podem revelar séries até então desconhecidas. Uma dessas produções foi Big Boys, cuja primeira temporada já está disponível no Filmin (a segunda passou recentemente no Reino Unido e não deve demorar a chegar cá). Confissão: descobri Big Boys no Gogglebox, onde passou uma das cenas finais da série, uma cena que revela a resolução de um dos momentos de tensão que existe desde o início. E quando finalmente vi a série, em nenhum momento me lembrei de que já sabia o final.

[o trailer de “Big Boys”:]

A resposta está no quão atípica Big Boys é para os dias de hoje. Parece que o criador (Jack Rooke) estava totalmente alheada das exigências das audiências ou dos requisitos de uma produção deste género — sobre jovens a entrar na idade adulta. O primeiro episódio rejubila na criação dessa sensação, descobrimos que o pai do protagonista, Jack (Dylan Llewellyn), morreu. Tanto ele como a mãe, Peggy (Camille Coduri), não sabem como lidar com a situação e os primeiros minutos giram em volta das dificuldades do luto.

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Foi durante este processo que Jack assumiu que precisava de adiar por um ano a ida para a universidade. E é nesse momento de iniciação académica que nós, espectadores, entramos na história. É na universidade que a acção dos seis episódios se vai passar. Mais uma série sobre putos na faculdade? Não é bem assim. Big Boys é sobre a amizade entre Jack e o colega de quarto Danny (Jon Pointing), que tem 25 anos e que só agora está a tirar um curso superior. Pela narração de Jack, percebe-se que a série será mais sobre Danny. Ou será que não é bem assim? Este é um dos artifícios da história.

Jack é homossexual. A mãe não sabe e o protagonista quer aproveitar a universidade para fazer o seu coming out — tímido, apesar de começar logo no primeiro episódio, Jack dá passos discretos, passos que, de certa forma, evitam a real consumação do que quer. No fundo, Jack diz-nos, nas entrelinhas, que tudo o que está a fazer só é real quando admitir a verdade perante a mãe. Mas, ao dizê-lo, terá de vencer também o obstáculo de nunca ter tido a oportunidade de contar ao pai e de não saber o que ele acharia disso.

Jack, o narrador, contorna essa realidade ao querer tornar a série sobre Danny (e a respetiva amizade). Nós entramos nessa viagem e preocupamo-nos com Danny, aquele homem de 25 anos que só agora está a ir para a universidade, à espera de encontrar os melhores anos da vida.

Para matar as saudades de ver séries que não querem só os nossos hábitos de consumo, mas que nos querem entreter e deixar-nos cheios ao fim de seis ótimos episódios de vinte e poucos minutos

Mas não está fácil. Danny está a antidepressivos e, por causa da medicação, não consegue ter uma ereção,  tornando-se uma espécie de lenda do sexo oral na universidade. No meio deste folclore, a verdade: Danny está realmente preocupado com a demência da avó, de quem sempre cuidou, porque o pai os abandonou. Esse papel de cuidador é a razão para o atraso universitário.

Ao longo dos episódios perguntamo-nos várias vezes: é só isto? É. É a história de dois miúdos que partilham um espaço comum durante um ano na universidade. Em que é sucessivamente evitado o confronto com a realidade, puxando a preocupação do espectador para outro lado. E isso é um toque de génio. Tiramos o chapéu ao criador e argumentista Jack Rooke.

Tanto Jack e Danny têm os respetivos problemas, mas não há aqui exagero. Têm amigos, amigos comuns, sabemos das vidas deles, mas não nos enchem a cabeça. Até os problemas de Jack e Danny não nos enchem a cabeça, porque são, no fundo, relacionáveis, são problemas de identidade, de crescer e das nossas relações familiares. Por mais distantes que estejamos deles, ambos tornam as suas situações relacionáveis. E perguntamo-nos várias vezes, sim, outra vez, “É só isto?”. Sim, é só isto, tal como Such Brave Girls era só aquilo. Para matar as saudades de ver séries que não querem só os nossos hábitos de consumo, mas que nos querem entreter e deixar-nos cheios ao fim de seis ótimos episódios de vinte e poucos minutos.

 
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