A presidente do Instituto da Segurança Social (ISS), Ana Vasques, apresentou esta sexta-feira a demissão à ministra do Trabalho por entender que o atual governo demonstrou “falta de confiança”, na sequência da questão da retenção do IRS nas pensões. O Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social confirma ao Observador que “foi recebida carta de demissão”, não indicando, numa fase inicial se tinha sido aceite. Mais tarde emitiria um comunicado assumindo que tinha sido “aceite”, “tendo esta decisão sido já comunicada à interessada”, aproveitando para realçar “o zelo e empenho” de Ana Marques. “A presidente do conselho direto do ISS mantém-se no exercício das suas funções até à efetiva substituição”, diz ainda o comunicado do Ministério.

Também o Instituto da Segurança Social confirmou a apresentação do pedido de demissão de Ana Vasques — apenas da presidente, já que “os restantes membros conselho diretivo não apresentaram demissão”, diz ao Observador fonte oficial.

Na carta enviada à ministra Maria do Rosário Ramalho, que a Lusa teve acesso, a presidente do Instituto da segurança Social afirma que tomou a decisão de se demitir depois da “posição pública assumida pelo Governo a propósito dos acertos à retenção na fonte de IRS das pensões pagas pelo ISS no mês de abril e maio”.

“Mostrando surpresa e estupefação relativamente a essa decisão e a este propósito apontando a omissão deste assunto na reunião do dia 22 de abril, entre o conselho diretivo do ISS, V. Ex.ª e o senhor secretário de Estado da Segurança Social, configuram objetivamente uma manifestação de falta de confiança do governo na presidente do conselho diretivo do ISS”, lê-se na carta.

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“Apesar de tudo ter sido esclarecido, e apesar de o assunto ter ficado completamente dissipado quanto à correção técnica e legal e quanto à boa-fé com que agi perante a tutela neste processo (…) entendo não existir outra leitura possível a não ser a assunção por parte de V. Ex.ª de falta de lealdade da minha parte”, escreve a presidente do ISS. Ana Vasques justifica a sua decisão com as “posições publicamente tomadas pelo Governo e a ausência de qualquer tipo de abordagem por parte do Ministério após esses mesmos esclarecimentos”.

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Para a responsável, “estas imputações são graves” e representam uma “quebra de confiança que não é sanável”, razões pelas quais diz estar “disponível para cessar funções”. Acrescenta que, apesar de a legislação obrigar a um prazo de aviso prévio de 60 dias, e se a tutela entender, está “disponível para cessar funções antes desse prazo”.

Ana Vasques garante que pretende “preservar o bom funcionamento do ISS face a qualquer tipo de instabilidade gestionária e também contribuir para a existência de melhores condições internas”. Por outro lado, explica que considera que este é o “momento indicado” para tomar a decisão de demissão, que visa preservar a sua “dignidade, bom nome e reputação profissional”, “tendo em conta que se encontram devidamente encaminhados assuntos de maior preocupação”. A presidente do ISS sublinha ainda que sempre pautou o exercício das suas funções “por uma conduta de rigor técnico e de ética profissional”.

Ana Vasques teve de ir já ao Parlamento explicar o que se passou com a retenção na fonte das pensões. A audição aconteceu a 9 de maio, mas a presidente do Instituto da Segurança Social esperou uma semana para apresentar a demissão.

Governo acusa PS de subida “artificial” de pensões através da retenção de IRS antes das eleições

A audição parlamentar foi requerida depois de ter sido noticiado pelo Negócios que, em janeiro, mês em que as pensões foram atualizadas até 6%, a Segurança Social aplicou às pensões uma tabela “provisória” de retenção que depois não se confirmou, tendo em abril e maio feito acertos na retenção de IRS. O que levou a acertos, tendo sido retirado a retenção excedentária a alguns pensionistas.

Ao ser noticiada essa situação, o Ministério de Rosário Ramalho declarou-se estupefacto com os acertos, acusando, mesmo, o anterior Executivo de ter dado, antes das eleições, uma “ideia artificial” de aumento a alguns pensionistas através de uma menor retenção na fonte, para se proceder agora aos acertos.

Acertos nas pensões feitos agora por motivos informáticos e sem alinhamento de datas com anterior tutela, diz Instituto da Segurança Social

Ana Vasques rejeitou no Parlamento que tenha havido motivos políticos para a aplicação dessa tabela em janeiro, tendo sido mais os pensionistas a receber menos do que o suposto no início do ano do que os que receberam mais. A correção só foi feita agora “por motivos informáticos” e que não houve “nenhum alinhamento sobre datas” com o anterior Governo, declarou.

À Rádio Observador, Ana Mendes Godinho, ex-ministra do Trabalho, deixou um reconhecimento público a Ana Vasques, que assumiu a presidência do organismo sob sua tutela, dizendo que “foi com a presidente do Instituto da Segurança Social que se iniciou a grande transformação digital da Segurança Social, colocando o foco numa resposta mais célere e mais proativa às pessoas, com medidas impactantes como a atribuição da pensão na hora, o abono de família automático, garantia para a infância e a gratuitidade das creches, entre muitas outras”, realçando ter sido “fulcral também na resposta à pandemia, apoiando milhares de empresas a garantirem a milhões de trabalhadores os seus postos de trabalho com o layoff simplificado, bem como apoiando milhares de famílias com apoios extraordinários”.