O Tribunal da Relação condenou a uma pena suspensa de quatro anos de prisão e uma formação em competências parentais a mãe de 43 anos que tinha sido absolvida em Bragança depois de ter deixado os cinco filhos sozinhos.
A arguida respondia por cinco crimes de violência doméstica e acabou absolvida pelo tribunal em primeira instância, porque não foi dado como provado que tivesse havido dolo (intenção) na ação.
O Ministério Público, que nas alegações finais tinha pedido ao coletivo de juízes a condenação da mulher, recorreu e a segunda instância revogou a decisão, aplicando a pena única de “quatro anos de prisão suspensa na sua execução pelo período de dois anos sujeita a regime de prova que passe pela sua participação em programa vocacionado para trabalhar as competências parentais“, lê-se na nota publicada na internet pela Procuradoria-Geral da República (PGR)
O caso aconteceu entre os dias 16 e 20 de fevereiro de 2021. As crianças, entre elas dois gémeos ainda bebés, tinham 1, 5, 7 e 12 anos e foram encontradas sem condições de higiene e sem cuidados.
A arguida deslocou-se a Lisboa “a fim de ver uma casa para poder alugar, comprar comida africana e fazer rastas no cabelo”, foi dado como provado em julgamento.
Foi dado ainda como provado que deixou os filhos em casa, entregues ao irmão mais velho, na altura com 12 anos, encarregue de os alimentar, vestir e levar à escola. Ainda que a mulher “soubesse que os menores não tinham capacidade de tomar conta de si” para as tarefas básicas do dia a dia, à exceção do mais velho
Para o Tribunal da Relação de Guimarães, ficou provado que “a arguida deixou os seus cinco filhos menores no interior da sua residência entregues à sua sorte, sem a supervisão e apoio de um adulto, não tendo adquirido, nem providenciado pela aquisição de bens alimentares para consumo pelos seus filhos enquanto se encontrava ausente”.
Acrescenta ainda o novo acórdão, proferido a 5 de junho, que a mulher “não cuidou de prestar, ou solicitar a outrem que o fizesse, de forma habitual, os cuidados normais de higiene em relação aos seus filhos (designadamente a toma de banho, limpeza do corpo e lavagem da roupa) nem em relação à habitação, enquanto se encontrava em Lisboa”, desrespeitando assim as obrigações parentais que lhe competiam.
O tribunal superior deu ainda como provado que “a arguida sabia que os seus filhos menores não conseguiam nem poderiam cuidar deles próprios” tendo em conta as idades.
O tribunal superior afastou qualquer justificação de natureza socio-cultural para justificar o comportamento adotado pela arguida e considerou ainda que, no caso, mais do que um simples maltrato perpetrado nestas crianças foi a condição absolutamente desumana em que as cinco crianças se encontravam”, acrescenta.
Durante o julgamento em Bragança, já tinha sido dado como provado que na habitação onde as crianças viviam havia lixo espalhado pelo chão, louça suja, restos de comida espalhados e que na cozinha cheirava a putrefação, descreveu a segunda instância.
Ficou também provado que havia móveis tombados no chão da casa. As crianças dormiram num quarto num colchão sujo que estava no chão, sem lençóis e cobertores. Nessa divisão foi encontrada uma tesoura aberta e fraldas usadas e cheias de urina.
Na casa não havia brinquedos nem um telefone para poder ser usado pelas crianças. Não havia aquecimento e as crianças “andavam descalças e sem meias, trajavam roupa fina e desadequada à época do ano, (recorde-se que os factos ocorreram em Bragança e no inverno)”, relembrou ainda o tribunal superior.
Na altura, os cinco irmãos foram institucionalizados. Para a decisão do tribunal de Bragança tinha pesado um relatório feito aquando da chegada das crianças à instituição, em que foi descrito que, apesar de sujas e vestidas de forma inadequeada naquele momento, não apresentavam sinais de estarem, por exemplo, mal nutridas.
As crianças estiveram quatro meses à guarda da instituição, até que a mãe conseguiu ter condições para os receber novamente. Mudaram-se entretanto para a zona de Leiria, foi referido em tribunal.