António Costa falou esta terça-feira à noite na entrevista que a procuradora-geral da República deu no início deste mês e disse que “cada um assume as suas responsabilidade e cada um tem os seus padrões éticos e de exigência” em relação aos cargos que ocupa: “Manifestamente não temos os mesmos padrões“. Na primeira entrevista desde que foi eleito presidente do Conselho Europeu, o ex-primeiro-ministro também falou na atualidade política nacional e ainda que tenha colocado o “ónus da negociação” no Governo, colocou pressão sobre a oposição na viabilização do próximo Orçamento do Estado.

No canal Now, Costa disse que, sabendo “o que sabia naquela altura, tomaria a mesma decisão” de se demitir do Executivo. “Foi a decisão certa na hora exacta”, assumiu dez meses depois da demissão, assumindo que a situação judicial então aberta “foi dolorosa”, mas que “é uma página que está virada”. Sobre o funcionamento da Justiça disse que “ninguém deve estar acima da lei, contudo é pressuposto que todos exerçam as suas funções com a devida responsabilidade”.

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Ainda em matéria de Justiça e questionado sobre a constituição recente de Fernando Medina como arguido na operação Tutti Frutti, Costa considerou “bizarro alguém ser arguido por atribuir subsídio que não atribuiu”, referindo que o então presidente da Câmara de Lisboa “nem sequer estava na reunião” onde a decisão foi tomada.

“OE não deve ser utilizado nem como moção de confiança nem de censura”

Agora que já não está em funções, Costa assumiu estar mais livre para falar sobre o que se passou na altura da sua demissão e deixou uma crítica à opção do Presidente da República, na altura, de fazer depender de um nome o Governo que estava em funções.

O ex-primeiro-ministro sublinhou que a Constituição diz que “o único que é eleito diretamente é o Presidente da República” e que “havendo maioria absoluta”, o chefe de Estado devia ter mantido o PS no Governo mesmo com a sua saída. Sobre a posição de Marcelo atirou mesmo: “A equiparação da legitimidade do primeiro-ministro à legitimidade do PR é uma diminuição da própria legitimidade do Presidente. É uma equiparação que não é a minha, creio que não é a de ninguém e espero sobretudo que não faça escola“.

Mas foi sobre a política nacional da atualidade, que António Costa dedicou a análise mais extensa, construindo a sua argumentação em volta da ideia de que o “Orçamento do Estado é um instrumento fundamental para a ação do Estado e deve existir”, no entanto, “nem o Governo deve transformar o OE numa moção de confiança, nem a oposição deve transformar o OE numa moção de censura“. “É bom que o país tenha OE e que o exercício da responsabilização dos governos seja feito pelos instrumentos próprios” que são a moção de censura e a moção de confiança. “O que os partidos devem saber é transformar o debate do OE na normalidade que ele deve ter”, avisou na entrevista que deu à jornalista Judite de Sousa.

Assumiu que em 2021, quando teve um Orçamento chumbado no Parlamento, estava disponível para governar em duodécimos, embora diga que é uma situação que “não é desejável, não é bom” — e menos ainda numa situação de “instabilidade internacional”. Defendeu, também sobre esta matéria, que o “normal é que um Governo sem maioria procure uma solução para governar e o normal nas oposições é não inviabilizarem à partida um Orçamento mas predisporem-se a que possa ser viabilizado sem que isso seja entendido como um apoio ao Governo.”

O “ónus da negociação é de quem está no Governo” e este “deve criar condições” para a viabilização do Orçamento do Estado, mas Costa também disse que se a proposta não tiver “nenhuma medida absolutamente intolerável” para a oposição, então o OE deve ser viabilizado. “Há várias formas de afirmar divergência política sem que isso signifique chumbar um Orçamento”, afirmou ainda na mesma entrevista, deixando pressão sobre a oposição.

A propósito, Costa defendeu a “normalidade” de um Governo cumprir o mandato de quatro anos para o qual foi eleito e deixou uma certeza nesta matéria: “A última coisa de que o país precisa é que de uma nova crise política e as condições de governação são as que existem.” “Não podemos ter obsessão de estar sempre à procura da próxima eleição”, considerou ainda sobre um nove cenário de eleições antecipadas.

Na política nacional, Costa diz que o “capítulo ficou encerrado, sem mágoas”, que não voltará a ser primeiro-ministro e que, olhando para trás “há imensas coisas [de que se arrepende]”, mas também se orgulha “de muitas”.

Já sobre a eleição como presidente do Conselho Europeu, este mês, Costa diz que terá uma missão “particularmente exigente” e que é também um “reconhecimento do país e do que é o perfil que deve ter um presidente de um Conselho Europeu, que não é um líder ada Europa nem um primeiro-ministro, mas manter a unidade entre os 27 e procurar uma boa relação com o Conselho, a Comissão e o Parlamento Europeu”.

Questionado sobre o seu papel, a partir de agora, na resolução dos conflitos em curso, Costa respondeu não ter “a pretensão de ser mentor [na paz], tenho a pretensão de ajudar a UE a contribuir para que a Ucrânia obtenha a paz justa e duradoura a que os ucranianos têm direito”. E reafirmou o posicionamento europeu quanto. esse conflito. “A Europa já disse que apoiará no que for necessário e enquanto for necessário”, afirmou apontando que “os termos da paz justa e duradoura só podem ser definidos pela Ucrânia, só o país agredido tem legitimidade para definir o momento para pôr termo à guerra”.