Eleita sete vezes como o país mais feliz do mundo, a Finlândia está a perder capacidade de atrair talento estrangeiro, preocupado com as políticas anti-imigração, mas as autoridades defendem que “todos são responsáveis por criar um discurso aberto”.

Uma sondagem publicada este mês pela Associação de Engenheiros e Arquitetos da Finlândia (TEK) e pelo Sindicato dos Engenheiros revela que 89% dos trabalhadores altamente qualificados consideram que o debate sobre a imigração lançado pelo Governo de Petteri Orpo é preocupante e 81% pensam que a situação dos estrangeiros irá piorar nos próximos cinco anos.

O estudo, que abrangeu 1.044 peritos estrangeiros que vivem no país nórdico, mostra que apenas 52% recomendariam a Finlândia como um local para viver e trabalhar, um número que evidencia a crescente desilusão dos trabalhadores estrangeiros qualificados que vivem no país nórdico.

No que diz respeito à discriminação no trabalho, 41% dos homens e 43% das mulheres admitiram ter sido vítimas de discriminação, especialmente durante o processo de recrutamento, com uma maior incidência entre os profissionais de África e da Ásia.

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As razões mais comuns para esta discriminação – de acordo com o inquérito – são a falta de conhecimentos da língua finlandesa e o facto de o mercado de trabalho do país não valorizar suficientemente os estudos académicos e a experiência profissional adquirida no estrangeiro.

“A situação é insustentável. A Finlândia está a expulsar precisamente as pessoas que estão a criar o futuro crescimento económico do país”, lamentou Juhani Nokela, diretor de assuntos públicos da TEK, num comunicado.

Muitas empresas finlandesas, especialmente no setor da tecnologia, têm lamentado publicamente que o Governo não esteja a fazer o suficiente para atrair trabalhadores estrangeiros altamente qualificados num dos países mais envelhecidos da Europa.

O Governo finlandês, por iniciativa do partido de extrema-direita Partido dos Finlandeses, está a endurecer as políticas de imigração e asilo para limitar a chegada de migrantes e refugiados, especialmente de fora do espaço Schengen. Entre outras medidas, pretende-se reduzir o subsídio de acolhimento que os refugiados recebem e aumentar de cinco para oito anos o período mínimo de residência necessário para obter a cidadania finlandesa.

Mas o que mais preocupa os especialistas estrangeiros é a alteração legislativa, que ainda está pendente no parlamento, que prevê a possibilidade de serem expulsos do país se perderem o emprego e não encontrarem outro no prazo de três meses, uma medida que afetaria os cidadãos não europeus.

Outro estudo recente, o ‘Expat Insider’, realizado pela Internations, organização que presta apoio a expatriados a nível mundial, colocou a Finlândia em 51.º lugar, apenas à frente da Turquia e do Kuwait, quando antes se encontrava no 16.º.

Os dados são conhecidos pelas autoridades: “Trazem pontos relevantes que a Finlândia precisa de levar a sério e são também uma mensagem clara para o Governo relativamente às alterações legislativas que foram acordadas no programa”, disse Laura Lindeman, que lidera o programa de atração de talento estrangeiro ‘Work in Finland’, integrado no ‘Business Finland’ (equivalente à AICEP-Portugal Global).

“Compreendemos a preocupação dos talentos internacionais aqui na Finlândia relativamente às alterações legislativas em curso no que diz respeito ao prazo para conseguir um novo emprego se ficar desempregado”, referiu à Lusa a responsável, acrescentando que, após a aprovação destas propostas, “a legislação passará a estar em paralelo com a de outros países da União Europeia”.

“O discurso negativo sobre a imigração é sempre desencorajador e todos na Finlândia são responsáveis por criar um discurso aberto e acolhedor”, defendeu Laura Lindeman. O país, acrescentou, “está a enfrentar uma recessão económica”, com efeitos no recrutamento, mas “a situação económica parece estar a melhorar no final deste ano”.

“A Finlândia precisa de talentos internacionais para o mercado de trabalho e para apoiar o crescimento, a inovação e a internacionalização das empresas, o que conduzirá à criação de novos empregos”, considerou Lindeman. A responsável destacou que o seu organismo tem em marcha o programa “Trabalhar na Finlândia” com o objetivo de “apoiar as empresas na sua preparação para a diversidade cultural e no recrutamento de talentos internacionais, quer estejam já na Finlândia ou ainda no estrangeiro”.

“O Governo está empenhado em promover a atração de talentos e considera que a Finlândia precisa de talentos internacionais. A migração de mão-de-obra tem vindo a aumentar desde há alguns anos e o crescimento parece continuar”, salientou.

A responsável destacou ainda os “pontos fortes” da Finlândia: “um ambiente seguro e protegido, qualidade de vida com equilíbrio entre a vida profissional e o tempo livre e espaço para vaguear na natureza”. “Muitos dos nossos pontos fortes não estão a mudar devido a este processo legislativo”, assegurou.