‘Verdade ou Consequência?’

Prémio do Público no DocLisboa 2023, este documentário de Sofia Marques sobre Luís Miguel Cintra dá dispensa ao formato convencional dos retratos do género, beneficiando da proximidade da autora (que fez parte da companhia de teatro Cornucópia, co-fundada e dirigida por aquele) com o actor e encenador. É um filme “impressionista”, intimista e formalmente despreocupado, pouco ou nada interessado em cronologias arrumadinhas ou em fornecer resmas de informação biográfica ao espectador. Sofia Marques filma Cintra em Lisboa, Madrid ou no Porto, a falar de teatro, de cinema e dos actores, a cortar o cabelo, fazer fisioterapia ou a colar bonecos da sua colecção que se partiram, a evocar os pais e Manoel de Oliveira, a ler poemas de Ruy Belo e a ver fotografias antigas. Será tanto mais apreciado quanto já se conhecer Luís Miguel Cintra, a sua visão artística e o seu trabalho.

‘Bruno Reidal-Confissões de um Assassino’

No dia 1 de setembro de 1905, Bruno Reidal, de 17 anos, filho de camponeses e seminarista, matou e decapitou um rapaz de 12 anos e foi pouco depois entregar-se às autoridades. Vincent Le Port conta a história deste jovem assassino psicopata que se comprazia a imaginar pormenorizadamente os crimes que gostaria de cometer e ao mesmo tempo procurava conter os seus impulsos homicidas, pondo-o a contar a história da sua vida aos médicos que o interrogaram e examinaram na prisão, desde a infância numa família numerosa e com pais pouco afectuosos, até à entrada no seminário e ao seu sucesso escolar nesta instituição. Bruno Reidal-Confissões de um Assassino é uma fita cruamente naturalista, descritiva e álgida, realizada por Le Port com secura e distância, e essa ausência de emoção e a abstenção de ponto de vista acaba por a tornar algo inconsequente.

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’24 Frames’

No seu derradeiro filme, estreado postumamente no Festival de Cannes de 2017, Abbas Kiarostami foi buscar 24 imagens, sobretudo fotografias que tirou ao longo dos anos, mas também alguns quadros, expandindo-as, graças à animação digital, por quatro minutos e meia cada, recriando o que podia ter sucedido nos instantes imediatamente anteriores e posteriores ao momento em que foram captadas e construindo 24 micro-narrativas tendo como cenários praias, paisagens nevadas ou ruas de cidades, por onde se movimentam pessoas, veados, cavalos, patos ou corvos. 24 Frames tem parentesco com um trabalho anterior do cineasta iraniano, Five Dedicated to Ozu (2003), e dependendo da disposição e do envolvimento do espectador, pode ser visto como uma fascinante e delicada experiência formal, ou como um exercício conceptual repetitivo e enfadonho.

‘O Monge e a Espingarda’

O Monge e a Espingarda é a segunda longa-metragem do butanês Pawo Choyning Dorji, realizador de Um Iaque na Sala de Aula (2019). Estamos em 2006 e o sistema político do Butão passou recentemente de uma monarquia absoluta para uma monarquia constitucional. O país tem uma nova constituição e o velho rei vai abdicar no filho no final do ano. E desde 1999 que o Butão tem acesso à televisão e à Internet, medida que o rei considerou muito importante para o índice de Felicidade Interna Bruta nacional. Entretanto, um jovem monge budista passeia-se com uma velha e valiosa espingarda que o velho lama de que é discípulo mandou arranjar, e que é pelo seu lado cobiçada por um americano endinheirado. O Monge e a Espingarda foi escolhido como filme da semana pelo Observador.