A RTP “não é, neste momento, uma empresa que cause problemas ou preocupações ao Estado”. Mas pode vir a ser. A opinião é do presidente da RTP, Nicolau Santos, que alertou esta quarta-feira, no parlamento, para os possíveis riscos do fim da publicidade nos canais do Estado, uma medida anunciada pelo Governo na semana passada no âmbito do plano para os media.

“Há 14 anos que a RTP não tem prejuízos”, começou por destacar Nicolau Santos. Mas “não é seguro que a RTP não entre no vermelho com um corte de sete milhões por ano”, declarou, numa referência ao valor estimado que a RTP vai perder com o fim gradual da publicidade, que deverá começar em 2025, com uma redução de dois minutos por hora, terminando em 2027 com o fim total.

Quanto valem seis minutos (de publicidade) nas contas da RTP?

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“Houve três grupos de media com resultados positivos no ano passado, provavelmente para o ano talvez só haja dois porque a RTP entrará no vermelho” insistiu Nicolau Santos. O presidente da RTP espera voltar a encontrar-se “em breve” com o ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Duarte, “para debater alternativas ao financiamento”, que para Nicolau Santos poderiam passar, por exemplo, por uma indemnização compensatória para rubricas específicas como a RTP África, “como a BBC faz para a Commonwealth”.

“Também não nos importaríamos de não ter publicidade se tivéssemos qualquer coisa de financiamento público como a RTVE, que é de 1.100 milhões de euros. Para comparar com países próximos de Portugal, a televisão pública grega recebe 300 milhões. A belga recebe 900 milhões e não tem delegações fora da Bélgica”, enunciou.

Nicolau Santos afirmou que, quando a administração foi informada da intenção do Governo, propôs uma alternativa, que incluía uma diminuição da publicidade da RTP, mas não o desaparecimento total. Propôs ainda “um conjunto de questões importantes para amortizar a quebra de receitas”, como a atualização da contribuição audiovisual, da regularização da dívida que o Estado tem para com a RTP, de cerca de 14 milhões de euros, a não contemplação das receitas da publicidade digital nos cortes e o apoio do Governo num programa de saídas voluntárias, que deveria ser compaginado com a possibilidade, que não existe hoje, de a RTP fazer contratações a termo. Desde então, não voltou a haver contactos com o Governo. O presidente da RTP espera que estas questões venham a colocar-se aquando da renovação do contrato de concessão da RTP, que deverá acontecer até ao final do ano.

Questionado pelo PSD sobre se vê, no plano do Governo, a “intenção implícita” de privatizar a RTP, Nicolau Santos referiu que “ninguém nos falou ate agora na intenção de privatizar ou desmantelar a RTP”.

A audição da administração da RTP, que contou ainda com os vogais Sónia Alegre e Hugo Figueiredo, foi questionada pelos deputados pela notícia publicada esta quarta-feira no Diário de Notícias, que dá conta que a RTP quer um financiamento de 54 milhões de euros para as saídas voluntárias e a implementação do plano estratégico. Sónia Alegre explicou que o valor não diz respeito ao plano dos media apresentado pelo Governo. A empresa tinha em execução um plano estratégico e tinha a decorrer um pedido de empréstimo de 40 milhões de euros, que visava reduzir um financiamento anterior a um custo mais elevado e financiar o plano de investimentos e as rescisões por mútuo acordo, pelo que os 54 milhões são “business as usual” da empresa, explicitou.

Fim da publicidade na RTP não vai revolver “drama” dos privados

Nicolau Santos rejeitou ainda a ideia de que com o corte da publicidade na RTP, essas receitas vão transferir-se para os grupos privados de media. “Não é essa a experiência internacional. A transferência tem sido para as grandes plataformas internacionais. Há 15 anos a publicidade para as televisões era de 375 milhões, hoje o valor é de 200 milhões. É um drama que não será resolvido se a RTP deixar de ter publicidade, os privados não irão resolver o seu problema”.

O presidente da RTP confessou que a empresa tem “inúmeras áreas que não são rentáveis” e que são desenvolvidas “porque recebemos dinheiro dos portugueses para cumprir com o contrato de serviço público”. Com o corte previsto “se calhar vamos ter de cumprir de forma mais reduzida. Não é possível continuar a fazer a mesma coisa se tivermos menos dinheiro”.