O Supremo Tribunal de Justiça (STJ) absolveu esta quinta-feira os jornalistas Carlos Rodrigues Lima e Henrique Machado do crime de violação do segredo de justiça, após a Relação de Lisboa os ter condenado a uma pena de multa.
Em comunicado, o STJ precisa que a decisão desta quinta-feira surge no seguimento do recurso interposto pelos jornalistas sobre o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 28 de fevereiro de 2023, que os tinha condenado, em pena de multa, pelo crime de violação de segredo de justiça.
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Na mesma nota, o STJ lembra que o acórdão da Relação tinha alterado a absolvição decidida em primeira instância no Juízo Central Criminal de Lisboa, a qual considerou “legítima e não dolosa a atuação” dos jornalistas por estes “terem atuado ao abrigo da liberdade de imprensa, com o fim de cumprir o dever de informar o leitor”.
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Em causa, refere o STJ, estava a verificação ou não da prática de um crime de violação de segredo de justiça na divulgação de notícias em inícios de 2018 sobre o decurso de várias investigações relativas a inquéritos em segredo de justiça, designadamente caso Lex, caso E-Toupeira, caso E-mails e Operação Rota do Atlântico, com “revelação, em alguns casos, de teor parcial de atos processuais”.
“Tendo como referência a jurisprudência do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, o qual tem vindo a exigir, para a punição das condutas, que se demonstre a existência de prejuízos concretos para a investigação, o STJ considerou que essa matéria que não está provada no processo”, lê-se na nota explicativa do Supremo.
O STJ salienta ainda que “foi analisado o contexto em que os arguidos desenvolveram a sua conduta e a forma como as notícias foram divulgadas, tratando-se de notícias com relevante interesse público informativo”.
“Em respeito pela liberdade de imprensa, o STJ considerou justificada a conduta dos arguidos, absolvendo-os”, finaliza o STJ, lembrando que, ao tempo dos factos, Carlos Rodrigues Lima era subdiretor da revista Sábado, sendo, antes disso, jornalista do Diário de Notícias, e o arguido Henrique Machado era jornalista do jornal Correio da Manha.
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Questionado sobre a decisão do STJ, Henrique Machado enalteceu a importância da mesma para o jornalismo e o seu impacto para eventuais casos similares.
“É uma vitória da liberdade de imprensa sobre uma certa visão do direito à informação, que pelos vistos era a de algum Ministério Público, mais própria do antigo regime. Há males que vêm por bem – e este processo transita no Supremo, a mais alta instância judicial, para que a decisão sirva de exemplo para o futuro”, disse, numa reação enviada à Lusa.
Já Carlos Rodrigues Lima salientou à Lusa que o acórdão do STJ “reconhece o interesse público das notícias desde que não prejudiquem a investigação” e que isso já tinha ficado “cabalmente demonstrado na primeira instância”, lamentando, por outro lado, a falta de desenvolvimentos de um processo movido contra a procuradora do Ministério Público responsável pelo inquérito deste caso.
“Há três anos, apresentei uma queixa-crime contra a procuradora Andrea Marques devido às vigilâncias policiais e ao levantamento do sigilo bancário. Até hoje, pouco ou nada aconteceu neste processo”, concluiu.