Associações de comunidades da área de Lisboa foram convocadas para uma reunião pelo Governo, mas pelo menos três queixaram-se de não terem sido convidadas, entre as quais o movimento Vida Justa, que só foi incluído depois de pedir explicações.
“Só fomos convidados esta manhã, pelas 9h10, depois de saírem as notícias na comunicação social”, disse à Lusa Nuno Ramos Almeida, porta-voz do Vida Justa, que convocou a manifestação que reuniu milhares de pessoas em Lisboa, no sábado, em reação à morte de Odair Moniz, abatido pela polícia há uma semana.
Antes, o jornal Público noticiou que o movimento não tinha sido incluído na lista de associações convidadas para a reunião de terça-feira com o Governo.
Também o Grupo de Ação Conjunta contra o Racismo e Xenofobia enviou uma mensagem na qual expressa “veemente repúdio pela exclusão do Coletivo Consciência Negra e FAR — Frente Anti-Racista” da reunião agendada.
Governo e associações de comunidades da área de Lisboa reúnem-se na terça-feira
“A decisão, de não convidar organizações que atuam nos territórios onde as desigualdades imperam historicamente, suscita grande preocupação e revela falta de sensibilidade para com as vozes que realmente representam as comunidades silenciadas”, insurge-se, instando o Governo a garantir que “todas as vozes relevantes para contribuir para a resolução dos problemas que afetam as comunidades sejam ouvidas”.
Em concreto, lamenta-se “a exclusão de coletivos representativos das comunidades ciganas, para além da Pastoral”, recordando que um terço das pessoas residentes no bairro do Zambujal — onde morava Odair Moniz — é de etnia cigana.
Face a isso, o grupo considera que o Governo “demonstra uma falta de visão, de um olhar abrangente sobre os problemas que levaram as pessoas a revoltarem-se e saírem à rua para pedir justiça”.
Sublinhando que “todas as estruturas que trabalham no terreno são indispensáveis elos de ligação com capacidade para levar aos bairros a confiança necessária para que se possam construir estratégias comuns de ação”, o grupo sugere algumas organizações “que podem contribuir para que exista um verdadeiro diálogo sobre os problemas que afetam as comunidades”, nomeadamente a Associação Cavaleiros de S. Brás — Boba, Associação Passa Sabi — Rêgo, PER 11 — Alta, Paulo Seco — Quinta do Loureiro, Jorge Pina — Chelas, Torre Laranja — ChelasADM — Campolide, Comissão de Moradores do Portugal Novo — Olaias, Amucip — Arrentela, Geração Com Futuro — Lavrado/Curraleira, Mira Ativa — Casal da Mira.
A Lusa questionou o Ministério da Presidência sobre as razões para não ter incluído certas organizações na lista inicial, mas o gabinete de António Leitão Amaro não respondeu até ao momento.
Numa publicação divulgada após o convite oficial, o Vida Justa agradece às outras organizações, que denunciaram a ausência do movimento da convocatória inicial.
“Só a solidariedade pode garantir justiça para Odair e tantos outros que faleceram nas mesmas circunstâncias”, realça o movimento, na sua página oficial na rede social Facebook, apelando à “unidade na luta”.
Na lista de convites para a reunião de terça-feira inicialmente divulgada pelo Governo, com o intuito de “dialogar” com as comunidades da Área Metropolitana de Lisboa, estão: Moinho da Juventude a sua página oficial na rede social Facebook, Mundo Nôbu, Afrolink, Movimento Nu Sta Djuntu — Estamos Juntos, Associação Caboverdeana, Associação Cultural e Juvenil Batoto Yetu, Academia do Johnson, Associação Helpo, Semear o Futuro, Djass — Associação de Afrodescendentes, Femafro — Associação de mulheres negras, africanas e afrodescendentes em Portugal, SOS Racismo, Plataforma Gueto, Associação para a Mudança e Representação Transcultural, Associação Filhos e Amigos de Farim, Obra Nacional da Pastoral dos Ciganos e Associação Kamba.
Segundo Nuno Ramos Almeida, o Vida Justa recebeu a indicação de que só poderia enviar um representante à reunião, que juntará os ministros da Presidência, da Administração Interna e da Juventude e Modernização, bem como dirigentes das polícias (GNR e PSP), do Instituto Português do Desporto e da Juventude e da Agência para a Integração, Migrações e Asilo.
A iniciativa do Governo — agendada para as 14h30 de terça-feira, no Campus XXI, em Lisboa — surge na sequência dos incidentes que se seguiram à morte de Odair Moniz, cabo-verdiano de 43 anos, morador no bairro do Zambujal, na Amadora, que há uma semana foi baleado por um agente da PSP, no bairro da Cova da Moura, no mesmo concelho.
Três feridos e 13 detidos desde quarta-feira em desacatos na região de Lisboa
Ao longo da última semana registaram-se tumultos no Zambujal e noutros bairros da Área Metropolitana de Lisboa, onde foram queimados e vandalizados autocarros, automóveis e caixotes do lixo, somando-se cerca de duas dezenas de detidos e outros tantos suspeitos identificados. Sete pessoas ficaram feridas, uma das quais com gravidade.