Algumas dezenas de Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) concentraram-se esta quarta-feira em frente ao parlamento no início de uma greve às horas extraordinárias para exigir a revisão da carreira e melhores condições salariais.
Com cartazes colocados junto à escadaria do Parlamento com frases como “Ministra, queres TEPH de primeira? Revê a nossa carreira”, “Salvar a Emergência Médica” ou “Salvamos vidas a cinco euros por hora”, os técnicos gritaram “respeito” e pediram aos deputados para atenderem às suas reivindicações.
Em declarações aos jornalistas, o presidente do Sindicato Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (STEPH), Rui Lázaro, critica a falta de resposta e alerta para os riscos que esta greve vai causar nos serviços do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM).
Segundo o dirigente sindical, o protesto que começa esta quarta-feira “é uma greve sem termo, que só terminará quando não nos forem apresentadas soluções, que têm que passar pela valorização da carreira técnica de emergência pré-hospitalar e também pela valorização do seu índice remuneratório”.
Este “é um problema que já transitou do governo anterior para o atual Governo” e o sindicato já foi recebido pelo executivo PSD/CDS.
“Volvidos seis meses da tomada de posse, a única resposta que nos deram foi que eventualmente iriam rever a nossa carreira em 2025”, disse Rui Lázaro.
Perante esta resposta, o sindicato considera que foi “claramente empurrado para estas ações reivindicativas”, que incluem a manifestação e uma greve ao trabalho extraordinário que esta quarta-feira começou e que se vai prolongar até que sejam apresentadas “as soluções efetivas” que os profissionais aguardam “há tanto tempo”.
Segundo o dirigente, “a larga maioria dos técnicos do INEM atinge o limite máximo de trabalho extraordinário que pode fazer” e “não é suficiente para garantir a operacionalidade de todos os meios de emergência médica”.
É por isso que “existem diariamente meios de emergência médica encerrados por falta de técnicos ou postos de atendimento das centrais de emergência por preencher, causando atrasos no atendimento de chamadas diariamente”.
Rui Lázaro admite ser “expectável que, com esta greve, possam vir a agravar-se esses constrangimentos”.
“Mas estamos obviamente disponíveis para suprimir ou para avançar para o levantamento da greve, caso o Governo resolva apresentar-nos as soluções que tarda em apresentar”, acrescentou.
O salário base é de 920 euros, pouco atrativo para contratar novos quadros, como mostram os sucessivos concursos por preencher, explicou Rui Lázaro, salientando que as saídas de técnicos têm sido uma constante, com oito dezenas a despedirem-se do INEM só em 2023.
O resultado é a ausência de quadros suficientes para satisfazer as necessidades do país, com apenas 721 elementos quando o quadro previsto é de 1.480 técnicos.
Por comparação com outros países, onde estes técnicos estão integrados em carreiras paramédicas, Rui Lázaro lamenta a falta de atenção a um “problema que custa vidas”.
O modelo em Portugal está a provocar assimetrias entre as grandes cidades e o resto do país, onde não existem técnicos suficientes
Para o dirigente, o sistema é “disfuncional”, com “apenas 15% das ocorrências de emergência médica garantidas com técnicos de emergência médica” do INEM, enquanto o resto é assegurado por parceiros — bombeiros ou Cruz Vermelha — a quem já não é dado o acesso à mesma formação e qualificação.
O protesto acontece no dia em que arranca a discussão na generalidade do Orçamento do Estado na Assembleia da República e o sindicato tem tentado sensibilizar os partidos para o problema.
No pré-aviso de greve, a que a Lusa teve acesso, o STEPH informa que, uma vez que a greve abrange apenas as horas extraordinárias, não considera haver lugar a serviços mínimos, pois “todo o trabalho urgente e emergente, em horário normal de trabalho, continuará a ser garantido em todos os turnos”.
Salários no INEM são exemplo de estratégia para desmantelar SNS, segundo Mariana Mortágua
A coordenadora do Bloco de Esquerda disse esta quarta-feira que a falta de investimento em carreiras como a dos técnicos do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM) refletem uma estratégia do governo para desmantelar os serviços públicos de saúde.
Juntando-se à manifestação dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) a quem manifestou solidariedade, Mariana Mortágua considerou justas as reivindicações destes profissionais, que iniciaram esta quarta-feira uma greve às horas extraordinárias por tempo indeterminado.
“O problema é evidente para qualquer pessoa que o queira ver. O INEM devia ter mais de 1.000 trabalhadores e tem 700 e há uma razão muito simples, não consegue atrair pessoas para trabalharem porque paga muito pouco, um salário-base de 920 euros e, por isso, está a acontecer nesta estrutura o mesmo que está a acontecer noutras carreiras especiais do Estado”, disse.
“Esta decisão do governo de congelar o número de trabalhadores do Estado é uma irresponsabilidade que tem consequências concretas como esta que estamos aqui a ver. A única forma de resolver este problema é pagar um salário digno às pessoas e atrair profissionais para a carreira”.
Segundo Mariana Mortágua, “o plano do Governo está a ficar muito claro. Encontrou paliativos, encontrou pequenos remendos para resolver situações pontuais, mas não resolveu estruturalmente esses problemas, simplesmente encontrou uma medida de curto prazo para o orçamento do Estado e abandonou uma série de profissões, condicionando o futuro de todas com a decisão absurda de congelar o número de funcionários públicos”.
“O PSD fala do SNS ao mesmo tempo que tem um plano, que admitiu, que é o de transferir aos bocados os serviços do SNS e da saúde pública em Portugal para serviços privados. Para isto acontecer, o SNS vai sendo desmantelado e uma das formas de o desmantelar é desinvestir nele”, considerou a dirigente, que prometeu levar este tema ao debate orçamental que tem esta quarta-feira início.
“Este é o orçamento do programa do PSD e nós rejeitámos esse programa desde o início”, mas “a democracia parlamentar existe e por configurações de diferentes votações no parlamento, é sempre o possível aprovar medidas”, adiantou.
Recebida também pelos manifestantes, a líder do PAN, Inês Sousa Real, manifestou solidariedade, prometendo propor também no debate orçamentar as reivindicações dos TEPH.
“Nós temos de sair do governo de propaganda, temos de garantir que o excedente orçamental a quem dele precisa e a valorização de carreiras essenciais”, afirmou.
“Não nos faz sentido que durante a pandemia andamos a pedir palmas para os profissionais da saúde e em todos os orçamentos subsequentes não tenha existido um esforço dos sucessivos governos, PS e PSD, para responder a estas carreiras”, afirmou, incluindo nestas reivindicações também as exigências de amentos dos técnicos auxiliares de saúde e de diagnóstico.
Chega, IL e Livre disponíveis para articular propostas de aumentos para técnicos do INEM
Deputados do Chega, IL e Livre mostraram-se esta quarta-feira disponíveis para articular propostas que respondam às reivindicações dos Técnicos de Emergência Pré-Hospitalar (TEPH) que iniciaram uma greve às horas extraordinárias para exigir a revisão das carreiras e aumentos salariais.
Os representantes dos três partidos foram recebidos pelos manifestantes concentrados esta quarta-feira junto à escadaria do parlamento, no dia em que começa o debate orçamental, e admitiram negociar propostas que juntem os partidos da oposição para responderem às reivindicações dos técnicos do Instituto Nacional de Emergência Médica (INEM).
O PCP, que também esteve reunido com os manifestantes, disse que vai incluir os aumentos pedidos pelos técnicos no seu pacote de propostas no debate da especialidade do orçamento, prometendo lutar pelas suas iniciativas.
O deputado do Chega Rui Cristina, coordenador do partido na Comissão de Saúde, considerou “inadmissível” o baixo salário dos técnicos e referiu que o grupo parlamentar vai apresentar ainda esta semana uma proposta para valorizar as carreiras dos TEPH.
“Como é que podemos atrair profissionais pagando-lhes tão pouco e não tendo uma progressão da carreira como deveria ser? Este governo entrou em funções há nove meses, mas as desculpas estão a acabar-se”, disse o deputado.
Sobre a possibilidade de uma articulação, Rui Cristina disse que o Chega está disponível para uma plataforma de entendimento: “no grupo parlamentar do Chega, olhamos sempre para as propostas e não olhamos para de que partido elas provêm, o que nos importa é que as propostas venham ao encontro do que queremos executar”.
Mário Amorim Lopes, da Iniciativa Liberal, considerou “mais do que legitimas e mais do que justas” as reivindicações dos técnicos do INEM, salientando que o “Estado não pode ser uma bolsa de emprego onde todos podem trabalhar, mas aqueles que trabalham no Estado têm de ter condições justas e uma remuneração que valorize e dignifique aquilo que eles fazem”.
“Estes técnicos de emergência pré-hospitalar recebem pouco mais do que um salário mínimo para um trabalho muito difícil, árduo e muitas vezes sem horário” e “são os homens e as mulheres que se atravessam por nós quando nós verdadeiramente precisamos”, recordou o deputado da IL, que admitiu avançar uma proposta própria ou acompanhar iniciativas de outros.
“Se há coisa que a IL faz é não ser sectária e conversaremos com todos e devemos sempre trabalhar em conjunto”, até porque “este tema, em particular, deve-nos convocar a todos, não há aqui uma divisão ideológica”, disse.
Paulo Muacho, do Livre, reconheceu a “justeza da luta” e admitiu que é um problema que se arrasta há vários governos, mas que “não depende diretamente do Orçamento do Estado e basta apenas uma autorização da ministra para que se possam rever estas carreiras”.
“Vamos apresentar medidas em sede de especialidade no orçamento de estado e esperamos que os partidos acompanhem, até porque há aqui vários partidos que estão aqui presentes e é preciso que haja consequências dessa solidariedade que se manifesta”, afirmou Muacho.
“Há espaço certamente para a aprovação dessas propostas, o Livre está disponível para aprovar propostas de outros partidos e certamente os outros partidos estão disponíveis para aprovar propostas do Livre”, resumiu, recordando que o “governo não tem maioria absoluta no Parlamento”.
Do PCP, a líder parlamentar Paula Santos considerou que “são questões que urgem, porque são trabalhadores fundamentais para o socorro à população” e que existem “meios de socorros indisponíveis” por falta de quadros.
“A falta de técnicos é gritante. Se não forem assegurados estes meios, é o socorro à população que fica em causa”, adiantou.
“O Governo sobre esta matéria ainda não disse nada”, criticou Paula Santos, salientando que o PCP vai incluir o tema no pacote de propostas para a discussão na especialidade.
“Já avançámos e tornámos públicas um conjunto de propostas que iremos apresentar, cabe naturalmente aos outros partidos posicionar-se” sobre as iniciativas do PCP, mas “não deixaremos de intervir e nos bater por elas porque consideramos que elas são necessárias para resolver os problemas das vidas das pessoas”, afirmou.