A presidente da Assembleia Municipal de Lisboa (AML) enviou ao Ministério Público o processo sobre o aluguer da sede da instituição para a realização do congresso de um grupo ultranacionalista, com presença de convidados neonazis, disse, esta quinta-feira, fonte municipal.
“A presidente remeteu para o Ministério Público toda a informação que existe sobre o assunto e aguarda as conclusões da auditoria pedida, e que o Ministério Público avalie se a questão tem relevância criminal”, afirmou à Lusa uma fonte da AML, que pediu para não ser identificada.
A mesma fonte avançou que a conferência de representantes, órgão consultivo que integra a mesa, representantes dos grupos municipais e um independente, decidiu, na segunda-feira, realizar uma auditoria, proposta pelo PSD, ao processo de aluguer do Fórum Lisboa ao grupo ultranacionalista Reconquista.
Os deputados municipais tiveram acesso à documentação relacionada com o aluguer das instalações, incluindo e-mails entre os envolvidos no processo, e fonte oficial do gabinete da presidente da AML reiterou que a presidente Rosário Farmhouse (PS) “pronunciou-se com base na informação dos serviços”, que não identifica os organizadores como um grupo extremista.
A notícia de neonazis reunidos na sede da AML foi avançada pelo jornal Expresso e motivou um requerimento urgente dos deputados municipais do Bloco de Esquerda (BE) a exigirem à presidente da AML, um esclarecimento sobre a autorização do congresso ultranacionalista no Fórum Lisboa, em 2 de novembro.
No site da AML, a mesa do órgão deliberativo do município, presidida por Rosário Farmhouse e que integra Ana Mateus (PSD) e Fernando Correia (independente pelo PCP), esclareceu que as instalações, onde têm lugar as reuniões da AML, “são cedidas quotidianamente às mais diversas entidades para a realização de eventos, de natureza académica, cultural, política, religiosa, comercial”, entre outras.
A mesa da AML indicou que “os serviços municipais competentes procederam à análise da proposta em causa”, apresentada “por uma pessoa singular — uma senhora cujo nome não suscitou qualquer alerta”, tendo como indicação de entidade promotora um coletivo de jovens do partido Chega e de que o evento seria uma conferência sobre “relação entre modernidade e coletivismo e os seus efeitos na sociedade portuguesa”.
No entanto, o dirigente da Juventude Chega, Rui Cardoso, afirmou à Lusa que o partido não tinha conhecimento do evento, nem esteve envolvido na marcação e na sua organização.
“Se foi eventualmente utilizado para a marcação do espaço o nome do partido Chega ou da Juventude Chega, esse uso foi abusivo e foi desproporcional, na medida em que nós não temos nada a ver com esse evento”, reforçou Cardoso, adiantando que o departamento jurídico do partido vai avaliar as ações a tomar.
Por seu lado, o grupo Reconquista também negou ter-se feito passar por um coletivo de jovens do Chega para alugar a sede da AML.
“Eles entenderam que tinha sido um erro aprovar a realização do evento e, agora, para se legitimarem aos olhos do público, vêm utilizar a justificação de que entenderam que nós estávamos diretamente associados, ou que éramos parte do Chega”, afirmou o presidente do Reconquista, Afonso Gonçalves.
Segundo o também fundador do grupo, a confirmação da cedência só foi feita após um e-mail em que detalharam “o título do evento, a organização promotora do evento, bem como todos os oradores e todos os discursos”.
“A Reconquista nunca mentiu à Câmara sobre os oradores presentes e os seus temas, nem sobre o teor do evento, algo que se pode provar em sede própria pela consulta dos e-mails trocados entre as partes”, escreveu, em comunicado, a organização.
A deputada municipal do BE Leonor Rosas reforçou, numa nota, a necessidade de saber se a presidente da AML sabia do evento, do cariz de “política de ódio deste evento” e que este foi “um congresso de um grupo de extrema-direita racista, supremacista branco, homofóbico, misógino, que veicula uma política de ódio contra imigrantes e contra pessoas racializadas, que veicula até ideias que as mulheres não deveriam ter direito ao voto, que são inferiores aos homens”.
De acordo com o Expresso, o congresso do Reconquista, no Fórum Lisboa, contou com o britânico Steve Laws, ativista que se autodenomina “caçador de migrantes”, o belga Dries Van Langenhove, que lidera um movimento de jovens nacionalistas flamengos, e o irlandês Keith Woods, descrito pelos media locais como sendo um dos maiores influencers da extrema-direita daquele país, com contactos entre as milícias supremacistas norte-americanas, como o Ku Klux Klan.
Grupo neonazi alugou sala da Assembleia Municipal de Lisboa e realizou evento com 100 pessoas