No dia em que o novo diretor da Direção-Geral de Reinserção Social e Serviços Prisionais (DGRSP) toma posse, Rui Abrunhosa Gonçalves, ex-diretor geral das prisões, fez questão de explicar o que fez e o que tinha previsto para o último ano de mandato — que não cumpriu após uma demissão no seguimento da fuga de cinco reclusos da prisão de Vale de Judeus.

Num artigo de opinião assinado no jornal Público, Rui Abrunhosa Gonçalves explicou que as propostas que iria apresentar à tutela na cerimónia do 12.º aniversário da DGRSP que ocorreu a 1 e 2 de outubro em Leiria tinham um “pendor reformista e estratégico“. E referiu que várias já estavam “em curso, adjudicadas ou em fase de finalização”, por fazerem “parte da gestão quotidiana da organização”, como por exemplo a “abertura de concursos de ingresso e promoção para o Corpo da Guarda Prisional (CGP), abertura de concursos de ingresso e promoção para técnicos superiores de reinserção e reeducação, aquisição de viaturas celulares, obras em estabelecimentos prisionais, centros educativos e instalações de equipas de reinserção social, entre outras”.

Mas tinha outra preocupação, que descreve como “muito mais estratégica” e que passava pela “efetiva fusão dos serviços prisionais e de reinserção”. Um objetivo que, segundo escreveu, já completou 12 anos, mas “apenas obedeceu a critérios economicistas, nunca tendo havido uma reflexão séria que conduzisse a um projeto integrado”.

O ex-diretor das prisões destacou também que seria “imperioso rever a Lei Orgânica da DGRSP (LODGRSP), dela expurgando, por exemplo, tudo aquilo que remetia para diferenças de tratamento salarial de profissionais com responsabilidades semelhantes (técnicos de reinserção social e técnicos de reeducação) e promovendo a possibilidade da rotação dos mesmos, entre os sectores prisional e da reinserção social e vice-versa.”

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Até porque, segundo apontou, o que existe nas leis orgânicas das instituições em causa contribuiu “para uma enorme entropia dos serviços e sobretudo descontentamento dos profissionais, que nuns e noutros casos se viram privados durante 15 e mais anos de promoções a que justamente tinham direito”.

Sobre as prisões em si, Rui Abrunhosa Gonçalves sublinhou que o diagnóstico “há muito que estava (bem) feito“, frisando que “não se pode conceber que no século XXI subsistam prisões com mais de 60 anos, para um número reduzido de reclusos, mas que ainda assim se amontoam em camaratas, com muito poucas atividades de reinserção possíveis de levar a cabo e que, ainda por cima, consomem um rácio de pessoal vigilante, técnico e administrativo que dificilmente pode ser rentabilizado”.

Desta forma, e com base no documento elaborado em 2017 e intitulado Olhar para o Futuro para Guiar o Presente, o ex-diretor das prisões propõe “quanto antes” o “arranque imediato para a construção de um Estabelecimento Prisional (EP) com lotação para 400 indivíduos no Minho, que permitiria fechar os EP de Braga, Guimarães, Viana do Castelo e Chaves (que na atualidade comportam 350 reclusos), com uma ala para preventivos e um espaço para reclusas, e que “consomem” 157 elementos do Corpo da Guarda Prisional, 27 técnicos superiores ou equiparados, 20 administrativos, para além de alguns profissionais avençados da área da saúde”. “O mesmo para o Algarve, onde Faro, Olhão, Silves e Odemira, que somam em conjunto 287 reclusos, custodiados por 158 elementos da vigilância e 15 técnicos superiores ou equiparados e 21 administrativos”, escreveu.

Assim, considera, estaria à vista a “rentabilização de pessoal” que poderia acontecer, desde logo, com “benefícios para a satisfação dos mesmos e a possibilidade de serem promovidos programas de reabilitação, assistência na saúde e tratamento penitenciário consequentes”. Para Rui Abrunhosa Gonçalves, estes estabelecimentos “permitiriam aliviar alguns dos EP cronicamente sobrelotados no Norte (e.g., Custóias) e socorrer no Sul outras necessidades mais pontuais (e. g., Beja e Setúbal, este último também a ter de ser repensado), para além de permitirem arrecadar verbas com a alienação para as autarquias ou para equipamentos culturais ou mesmo para urbanização, dos anteriores espaços carcerários”.

“A outra construção imprescindível teria de ser na zona de Lisboa, usando eventualmente terrenos do EP Sintra, para um grande estabelecimento que permita canalizar os “utentes” do EP Lisboa, para uma lotação de pelo menos 600 indivíduos, primordialmente preventivos”, acrescentou, reconhecendo que “o valor destes empreendimentos é avultado, mas os ganhos a médio e a longo prazo são inequívocos”.