A falta de espaço próprio e a essência do novo espetáculo de Mónica Calle, “As mulheres que não veremos duas vezes”, levam a atriz e encenadora a apresentá-lo em espaços diferentes de Lisboa, nos próximos dois meses. “As mulheres que não veremos duas vezes – ensaio sobre Minetti, retrato do artista quando velho” estará em cena, num total de 11 récitas, na ZDB 8 Marvila, no Drama Bar e no CAL – Centro de Artes de Lisboa, onde terminará as representações, em janeiro de 2025.
A sede da Casa Conveniente, que a artista fundou em 1992 e dirige desde então, aguarda obras prometidas pela Câmara de Lisboa, em 2020-2021, que já tinham projeto aprovado. A mudança na câmara, nas autárquicas de setembro de 2021, no entanto, fez tudo “voltar à estaca zero”.
Hoje, “sem janelas e com tapumes”, por causa das obras nunca concretizadas, a sede da Casa Conveniente, na Zona J de Chelas, “limita-se a um pequeno corredor sem condições”, utilizado apenas como armazém.
A falta de um local fixo de trabalho não é nova para Mónica Calle. Em 2014, quando tinha 48 anos e mais de duas décadas de atividade da companhia, teve de abandonar as instalações no Cais do Sodré, quando esta área de Lisboa entrou “na moda”, com as consequentes “especulações imobiliárias e turísticas”, disse à Lusa. Do antigo Bar Luso, na Rua Nova do Carvalho (Rua Cor de Rosa), para onde se mudara em 2002 das instalações originais, passou para a Zona J de Chelas. Nesta zona da cidade, beneficiou de um espaço de 100 metros quadrados, cedido pela Câmara de Lisboa, que inicialmente fora projetado como loja e depois transformado em apartamento.
Em 2020, o local foi fechado, com promessas de obras pela autarquia, ainda no tempo da gestão de Fernando Medina, que reduziram o local a tapumes. Desde então, a espera, e a necessidade de refletir a continuidade do trabalho. Foi nesse espaço, que viria a ficar conhecido como Zona J/Zona Não Vigiada, que Mónica Calle “começou de novo”, tornando-o num espaço onde realizou os festivais Zona Não Vigiada, numa produção conjunta com a associação Filho Único.
Por vários motivos burocráticos, e apesar de ter investido dinheiro naquele local, Mónica Calle vê-se de novo, à beira dos 60 anos, sem espaço para a companhia Casa Conveniente.
O espaço ficou sem portas sem janelas “e acabou por ser fechado pela autarquia”, disse a encenadora à Lusa, acrescentando que “o anterior executivo camarário”, liderado pelo socialista Fernando Medina, se “comprometeu a concluir as obras no espaço, que tinha já projetos aprovados e estava pronto para ir a concurso público, para um investimento na ordem dos 35.000 euros”.
O assassínio do ator Bruno Candé, da Casa Conveniente, em 25 de julho de 2020, em Moscavide, no que foi o primeiro crime condenado por ódio racial na história da justiça portuguesa, perturbou e desmotivou a fundadora e a habitual equipa com que trabalha a permanecer no espaço em Chelas, disse a atriz à Lusa.
Na sequência das eleições autárquicas de setembro de 2021, que ditaram a eleição do social-democrata Carlos Moedas, “voltou tudo à estaca zero”. “Apesar de não nos terem retirado a chave do local, não podemos utilizá-lo como sede. Sem janelas e com tapumes, limita-se a um pequeno corredor sem condições que utilizamos apenas como armazém”, acrescentou.
A Casa Conveniente, no entanto, não parou. Foi criando espetáculos para digressão, numa relação com a comunidade que caracteriza a companhia, como “Este escuro que te ilumina ou as últimas sete palavras de Cristo” e “Este é o meu corpo — Quatro solos de Mónica Calle”.
Desde fevereiro que a atriz afirma aguardar que o executivo autárquico de Lisboa retome o processo, “sem nenhum resultado em concreto”.
“As mulheres que não veremos duas vezes” estará em cena, num total de 11 récitas, na ZDB 8 Marvila, onde terá quatro sessões (de 02 a 05 de dezembro), outras tantas no Drama Bar (dias 09 a 12) e três no CAL — Centro de Artes de Lisboa (de 22 a 24 de janeiro de 2025). Todas as apresentações começam às 19h00.
A companhia de teatro os Artistas Unidos, despejada do Teatro da Politécnica, em julho, pela Reitoria da Universidade de Lisboa, aguarda igualmente uma solução, prometida pela autarquia, para poder continuar o seu trabalho regular de duas décadas. Os Artistas Unidos têm em cena “Vento Forte”, de Jon Fosse, no Teatro Variedades, no Parque Mayer, um equipamento da Empresa de Gestão de Equipamentos e Animação Cultural (EGEAC), da câmara de Lisboa, que em 2025 acolherá grande parte da programação do Teatro Nacional D. Maria II, na capital portuguesa.