Na baliza, Moreira. O quarteto defensivo inclui Miguel, Argel, Hélder (capitão) e Ricardo Rocha. No meio-campo, Geovanni, Tiago, Petit e Simão. O ataque entregue a Sokota mais Nuno Gomes. Entram ainda Armando, Roger e Carlitos. O treinador é espanhol e chama-se José Antonio Camacho. Estamos a 2 novembro 2003, um domingo. A ressaca eleitoral de sexta-feira à noite já lá vai e Luís Filipe Vieira ocupa comodamente o lugar na bancada central. É o seu primeiro jogo como presidente. E é também a estreia oficial da nova Luz. O adversário é o Beira-Mar e, nessa altura, o campeonato denomina-se SuperLiga.
É super, mesmo. O resultado final de 2-1 para o Beira-Mar. É o Benfica a marcar primeiro, por Simão, assistido por Hélder, aos 40 minutos. A segunda parte é um carrossel de emoções sem igual. Dois lances pensados por Juninho Petrolina isolam Sandro (52′) e Wijnhard (63′) para a reviravolta. Em 22 jogos na casa do Benfica para o campeonato, é a primeira vitória de sempre dos aveirenses. A festa é imensa. Parabéns à equipa de António Sousa. A de Camacho nem por isso. Vieira sai de fininho da Luz, como quem não quer a coisa. Voltaria lá quatro dias depois, para a Taça UEFA. E sai com um sorriso nos lábios, pelo 3-1 ao Molde (Noruega), golos de Nuno Gomes, Geovanni e Nuno Gomes. A primeira semana do presidente acaba em Alverca. E esta, hein?! Coincidência das coincidências. O Benfica ganha largo, 3-0 por Tiago, Geovanni e Tiago.
Doze anos, onze meses e tantos dias depois, eis Vieira ainda no Benfica. Com outra estrutura, com outro palavreado, com outro ar, com outra equipa. Esta é a do tri. O último jogo é o do Restelo, onde se faz história pela 16.ª vitória seguida fora para o campeonato, algo nunca visto em Portugal (bate o recorde do Benfica de Hagan em 1973). Com golos de Mitroglou e Grimaldo, o Benfica confirma o primeiro lugar à passagem da oitava jornada na semana em que ganha 2-0 em Kiev para ganhar outro élan no grupo B da Liga dos Campeões. A equipa é totalmente diferente. E totalmente nova. Por nova, entenda-se isto: do onze, mais de metade é sub-23 (Ederson, Nélson Semedo, Lindelof, Grimaldo, Gonçalo Guedes e Cervi).
Hoje, aos 67 anos de vida, Luís Filipe Ferreira Vieira arranca para o quinto mandato no Benfica. Como lhe correm os outros quatro? Ei-los, com dois títulos de campeão europeu em futsal e hóquei.
1.º mandato (2003-2006)
Candidata-se às eleições presidenciais de 31 outubro 2003 como gestor de futebol profissional do Benfica. Os sócios escolhem o sucessor de Manuel Vilarinho e a lista de Luís Filipe Vieira ganha confortavelmente com 90,47% (174.074 votos), a maior percentagem de sempre desde os 87,6% de Manuel Damásio em 1997. Sem hipótese para os rivais Jaime Antunes (7,32%) e Guerra Madaleno (0,7%).
https://www.youtube.com/watch?v=KrQ47toeF7Y
No seu mandato, a primeira notícia relevante é a trágica morte de Miklos Féher durante um jogo em Guimarães para o campeonato, a 25 janeiro 2004. O Benfica inicia uma fase de luto e o número 29 é retirado em memória do jovem húngaro. Em abril desse ano, entra José Viega na SAD e chega o primeiro título da era-Vieira. É a Taça de Portugal 2003-04, com José Antonio Camacho ao leme (2-1 ao Porto, no Jamor) naquela que ainda hoje é a única final perdida por Mourinho. No verão 2004, sai Camacho e entra Trapattoni. O italiano ajuda o Benfica a sagrar-se campeão nacional 11 anos depois e perde a final da Taça com o Vitória de José Rachão. Ao italiano segue-se o holandês Ronald Koeman, vencedor da Supertaça nacional, além da ida aos quartos da Liga dos Campeões (Barcelona, 0-0 na Luz, 2-0 em Camp Nou). Em maio 2006, Vieira cumpre um sonho antigo e contrata Rui Costa ao Milan.
2.º mandato (2006-2009)
No dia 27 de outubro de 2006, os sócios do Benfica deslocam-se ao Estádio da Luz para escolher o sucessor de Vieira: ou sim ou sim. É que não há rival para o atual presidente e assim é com naturalidade que Vieira abarca 95,6 por cento dos votos. A primeira ação digna de registo é a demissão de José Veiga como diretor-geral da SAD, a 16 novembro 2006. Nunca mais volta a desempenhar funções no clube e, a partir daí, abre uma guerra aberta com Vieira, consolidada em 2009 ao dar a cara pelo movimento Vencer, Vencer, que desiste de ir a votos à última hora.
Sem Veiga, o Benfica continua, é claro. A 5 outubro 2007, o livro dos recordes do Guiness reconhece o clube de Vieira como aquele com mais sócios do mundo. Desportivamente, o Benfica é quase um zero. Sem títulos à vista, Rui Costa inicia em maio 2008 o cargo de diretor desportivo, um dos objetivos de Vieira para tapar o lugar deixado em aberto pela saída de José Veiga. A primeira decisão em comum é contratar o treinador Quique Flores, vencedor do quarto troféu da era Vieira: a Taça da Liga 2009, naquela final com o Sporting resolvida nos penáltis. Primeiro por Lucílio Baptista, ainda no tempo regulamentar, depois por Carlos Martins, no desempate. Apesar disso, o espanhol não vinga e é contratado Jorge Jesus.
3.º mandato (2009-2012)
Com protestos da oposição, Vieira marca eleições para o início da pré-época desportiva 2009-10 e esmaga uma vez mais a concorrência, desta vez representada por Bruno Carvalho, que tem a capacidade de somar menos votos (6610) do que aqueles em branco e dos indecisos (13 519). É a segunda eleição mais concorrida de sempre, com 223.665 votos. No seu terceiro mandato, Vieira começa muito bem com o título de campeão nacional mais a revalidação da Taça da Liga com um claro 3-0 ao Porto, no Algarve.
Jorge Jesus confirma-se como aposta acertada. O que se segue não é de todo animador. A equipa perde espaço para o Porto e só consegue festejar na Taça da Liga: dois-um ao Paços de Ferreira em 2011 e outro 2-1 em 2012, ao Gil Vicente. Ao trajeto desportivo, segue-se a contestação em setembro 2012, durante a Assembleia Geral. Quatro mil sócios aprovam o relatório e contas 2011/12 (saldo negativo de 12,9 milhões de euros), só que sete mil estão contra. Vieira sobe ao palanque e é de tal maneira contestado com insultos vários que nem intervém. A cena prolonga-se e até rebenta um petardo no interior da sala. Os sócios pedem a demissão de Vieira e o presidente é obrigado a sair escoltado pela polícia.
4.º mandato (2012-2016)
O Benfica adere ao voto eletrónico (viva a modernidade) e tudo corre pelo melhor nas eleições mais concorridas de sempre, com 22.676 votos (83,02% para Vieira, resultante de 18 139 votantes), à frente dos 21.804 de Vale e Azevedo vs. Manuel Vilarinho em outubro 2000. No período eleitoral, o adversário é Rui Rangel. E a figura é o brasileiro David Luiz, apoiante categórico de Vieira. “Só quem não acompanhou o período de Vieira nestes anos é que pode questioná-lo. É o homem ideal para o Benfica e seria eleito se se candidatasse às eleições do Brasil.”
É o melhor período do Benfica, em termos desportivos. O de afirmação plena, com ultrapassagem ao Porto em matéria de títulos. O início é desagradável, com aquele final de época 2012-13 desconcertante. Ao empate em casa com o Estoril (1-1), segue-se o golo de Kelvin no último suspiro (2-1 no Dragão), o cabeceamento de Ivanovic aos 90’+2 (Chelsea, 2-1 na final da Liga Europa) e a reviravolta do Vitória de Vitória (2-1 no Jamor). Vieira mantém Jesus contra tudo e contra todos. A época seguinte inicia-se nos Barreiros, com uma derrota vs Marítimo. A polémica cresce imenso. Na jornada seguinte, o Gil está a ganhar 1-0 ao Benfica na Luz até aos 90’+2. Markovic empata, Lima faz o 2-1 aos 90’+3. A partir daqui, o céu é azul. Três títulos seguidos de campeão nacional, algo nunca visto desde os anos 70, uma Taça de Portugal, três Taças da Liga e duas Supertaças.