Os arguidos da operação e-toupeira, desencadeada esta terça-feira com 50 elementos da Polícia Judiciária (PJ), um juiz de instrução criminal e dois magistrados do Ministério Público a realizarem 30 buscas nas áreas do Porto, Fafe, Guimarães, Santarém e Lisboa para apreensão de relevantes elementos probatórios, foram presentes a primeiro interrogatório esta tarde no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, e ficaram a conhecer as medidas de coação mais de quatro horas depois de terem terminado o mesmo.

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Assim, Paulo Gonçalves, assessor jurídico da SAD do Benfica para quem o Ministério Público tinha pedido a proibição de entrar no estádio da Luz, entre outras medidas, saiu em liberdade e ficará apenas proibido de contactar com os restantes arguidos no processo, estando indiciado de um crime de corrupção ativa e quatro de violação do segredo de Justiça em co-autoria com José Silva. Já o técnico de informática do Instituto de Gestão Financeira e Equipamento da Justiça teve mesmo a medida de coação mais pesada: prisão preventiva, estando indiciado de um crime de corrupção passiva, um de favorecimento pessoal, quatro de violação de segredo de Justiça, um crime de falsidade informática e nove crimes de acesso ilegítimo e burla informática.

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De referir que, ao longo do primeiro interrogatório, Paulo Gonçalves e José Silva terão optado por manter-se em silêncio em todas as perguntas feitas ao longo da sessão pela juíza Cláudia Pina.

“Não era a medida de coação que esperava, os crimes imputados ferem, no entender do tribunal, de forma bastante grave o sistema judicial e é por esses factos que ficou em prisão preventiva. Silêncio? Porque não nos foram facultados todos os elementos de prova no processo. Vamos analisar o despacho proferido, veremos se acedeu ou não e em que condições. Conhecimento do Benfica? Não me parece que isso resulte do processo, como jurista não me parece e, se assim fosse, já teria sido constituído arguido”, comentou à saída Paulo Gomes, advogado de José Silva, confirmando que houve não só perícias informáticas mas também escutas telefónicas e vigilâncias.

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Carlos Pinto Abreu, advogado de Paulo Gonçalves, deixou o Campus da Justiça sem prestar declarações aos jornalistas, à semelhança do que tinha acontecido à chegada ao início da tarde.

Como o Observador explicara esta terça-feira ao longo do dia, o esquema passaria por dar ofertas a funcionários judiciais e ter, através destes, informações antecipadas sobre os vários processos em que o Benfica está envolvido e também outros ligados aos rivais FC Porto e Sporting. As primeiras suspeitas deste processo têm seis meses, adensando-se a partir daí as suspeitas de que haveria pelo menos uma “toupeira” no sistema judicial que fornecia informações às águias. Para que essa “toupeira” fosse apanhada terá sido plantada informação falsa, que acabaria por se revelar fatal e incriminatória para os envolvidos.

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Ao que o Observador apurou, os indícios de corrupção recolhidos pela PJ assentam em prendas que alegadamente terão sido dadas por Paulo Gonçalves aos funcionários judiciais suspeitos de corrupção passiva. Bilhetes para lugares cativos ou privilegiados na Luz para assistir a jogos do Benfica ou peças de merchandising do clube encarnado são algumas das alegadas contrapartidas que a PJ suspeita que terão alegadamente sido dadas por Gonçalves aos funcionários judiciais sob suspeita. Tais prendas terão, de acordo com os dados recolhidos pela investigação, um valor financeiro significativo que não estava ao alcance do poder de compra daqueles funcionários públicos.

[Veja no vídeo as denúncias de Francisco J. Marques, diretor de comunicação do FC Porto, contra Paulo Gonçalves]

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Vice do Benfica garante que nem clube nem SAD receberam informações

Num outro plano, Nuno Gaioso, vice-presidente do Benfica e administrador da SAD encarnada, abordou numa entrevista à SIC Notícias a operação e-toupeira e garantiu que a sociedade nada tem a ver com o caso.

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“Não tenho conhecimento de nenhum destes factos ou indícios, a SAD não tem conhecimento. Temos de ter consciência de problema reputacional causado ao Benfica, temos de ver o tempo da justiça, que é importante, o tempo da comunicação social e das redes sociais… Não nos devemos precipitar nestas análises e não podemos esquecer a presunção de inocência. O sistema judicial funcional, quando acusa e quando inocenta”, garantiu.

“O Benfica tem sido objeto de algo sensível de revelação de informação privada e institucional e isso é sujeito a interpretações. Não teve conhecimento oficial desta investigação, colaborou e terá sempre atitude de colaboração. Nunca nenhuma dessas matérias foi objeto de decisão ou deliberação nas reuniões da SAD, não foi tomada nenhuma decisão nos órgãos sociais do Benfica que seja ilícita mas não podemos esconder que é grave institucionalmente porque o ruído criou um problema reputacional. Teremos de ter tempo para uma reação ponderada, não pode ser ao sabor do vento e da pressão que existe”, prosseguiu, concluindo: “Posso dizer que não acedi, nem eu nem nenhum dos meus colegas nas reuniões, a nenhuma dessa informação. É importante que fique claro que nunca tive acesso a informações dessa natureza. Estou a dizer que não participei nem conheço”.

Já depois de serem conhecidas as medidas de coação, o Benfica voltou a reiterar a confiança no assessor jurídico da SAD encarnada. “A Sport Lisboa e Benfica SAD reitera a sua total disponibilidade para colaborar de uma forma empenhada com as autoridades judiciais para o cabal esclarecimento deste processo, que desde ontem foi tornado oficialmente público, e reafirma a sua convicção e confiança de que o Dr. Paulo Gonçalves poderá no decurso do processo demonstrar a licitude de todos os seus procedimentos e condutas”, escreveu em comunicado oficial publicado no site do clube.

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