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Magne Furuholmen, Morten Harket e Paul Waaktaar-Savoy: os a-ha no auge do sucesso, na década de 80
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Magne Furuholmen, Morten Harket e Paul Waaktaar-Savoy: os a-ha no auge do sucesso, na década de 80

Magne Furuholmen

Magne Furuholmen, Morten Harket e Paul Waaktaar-Savoy: os a-ha no auge do sucesso, na década de 80

Magne Furuholmen

A ascensão e as guerras dos a-ha: um filme para contar a história invulgar de uma banda pop

Puseram a Noruega no centro do mundo pop com "Take On Me" (e não só). A história e as divisões de uma banda que ainda está por descobrir, contadas pelo autor do filme que passa no Doclisboa.

Quando Thomas Robsahm, realizador norueguês, apaixonado por música e antigo punk, teve a ideia de fazer um filme sobre os a-ha, tudo parecia bem com a banda que ajudou a definir o som dos anos 80, com o tema “Take on Me” e não só.

Naquela altura, os a-ha tinham acabado de editar o seu nono álbum da carreira, Foot of the Mountain (2009). Era um regresso triunfante da banda, com especial impacto nos mercados da Noruega, Alemanha (onde o disco chegou a número um de vendas) e Reino Unido (5º lugar de vendas).

Robsahm pensou: depois do nono álbum há-de chegar o décimo. Era a sua oportunidade para fazer o que desejava há muito, filmar uma banda — ainda para mais a banda pop mais importante da história do seu país, e uma de que era fã — em estúdio, a gravar um álbum simbolicamente importante na sua discografia.

O realizador sugeriu isto, na altura, a um dos membros dos a-ha, que até achou boa ideia. Problema: não ia haver décimo disco nenhum. “Iam separar-se e acabar com a banda”, conta Robsahm ao Observador. “Na altura disse: ok, liguem-me quando os a-ha voltarem. Disseram-me que não valia a pena porque os a-ha nunca mais voltariam. Claro: cinco anos depois acabaram por voltar”.

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O décimo disco acabou mesmo por ser feito, ficando com o título Casting Steel e sendo editado em 2015. Thomas Robsahm não pôde filmar nada porque a banda “esqueceu-se de ligar” e porque o álbum foi feito à distância, sem que os três membros e elementos nucleares — Paul (guitarra), Magne (teclas e guitarra) e Morten (voz) — estivessem juntos em estúdio. Em vez disso, fez um filme para mostrar a história invulgar de uma banda que ninguém esperava que tivesse sucesso, que marcou o mundo, que mudou para sempre a história da música e da cultura da Noruega mas que vive em permanente paz podre interna.

O filme intitula-se a-ha: The Movie, faz parte da programação do festival de cinema Doclisboa — pode ser visto esta sexta-feira, 22 de outubro, no Cinema São Jorge — e leva os espectadores numa viagem pela história dos a-ha, que no próximo verão (dia 25 de junho) atuam em Portugal, no festival Rock in Rio Lisboa.

[o trailer de “a-ha The Movie”:]

Com imagens de arquivo nunca vistas, excertos de telediscos dos a-ha, entrevistas antigas e entrevistas recentes aos três membros da banda feitas de propósito para o filme, a-ha: The Movie mostra duas facetas do trio. Por um lado, lembra o espectacular e inesperado sucesso de um grupo vindo de um país que, até aos a-ha, ainda não tivera nenhuma estrela pop mundial — e tenta explicar como os a-ha se tornaram exatamente isso. Por outro lado, expõe uma banda cheia de tensões.

Para se ter uma ideia, nas entrevistas feitas para o filme o realizador não conseguiu por uma única vez juntar os três membros da banda na mesma sala, a conversar. Paul, Magne e Morten vão mantendo os a-ha vivos com uma certa distância de segurança.

De um lado está Paul, o músico imaginativo que, percebemos, não lida especialmente bem com o sucesso comercial da banda e com a forma como os a-ha são vistos. A dada altura do filme, recorda mesmo um concerto dos Echo & The Bunnymen numa sala mais pequena, com poucas luzes e os músicos voltados de costas para o público — e confessa: “deveria ter estado numa banda como aquela”. Do outro lado estão Magne e a voz da banda, o vistoso Morten, que pelo impacto que tinha nas adolescentes (pelo visual) e pela portentosa voz, levou a banda para territórios mais pop.

Uma coisa fica evidente após o filme: os a-ha têm música para dar e vender, em algumas fases mais acessível, pop e juvenil, noutras fases mais adulta, sóbria e pouco condizente que a imagem que se poderia ter deles conhecendo apenas “Take On Me”.

Para perceber melhor a história do filme e a história de uma banda a quem ninguém previu sucesso, que levou pela primeira vez a música norueguesa ao centro do mundo e que vive hoje com os membros a desdizerem-se uns aos outros a toda hora (e a confessarem que é um martírio trabalhar com eles), entrevistámos Thomas Robsahm, ideólogo do filme e que o realizou com o também cineasta Aslaug Holm.

A ideia de fazer um filme sobre os a-ha era algo que já andava a pensar há muitos anos ou teve a ideia de o fazer mais recentemente, pouco antes de começar a filmar?
É uma ideia muito antiga, que até começou por não depender dos a-ha no sentido em que há muitos anos queria fazer um filme sobre uma banda durante a feitura de um disco. Queria estar em estúdio e filmar o processo de uma banda a fazer um álbum. Tentei isso uma ou outra vez nos anos 90 com outras bandas, porque durante uma boa parte dos anos 90 os a-ha não estavam juntos, mas não aconteceu.

Em 2019 sugeri pela primeira vez aos a-ha fazer isto com eles. Tinham acabado de fazer o seu nono álbum, que teve muito sucesso. Tudo parecia estar bem com os a-ha, portanto porque não fazer um filme sobre os a-ha a fazerem o seu décimo disco, um marco importante? Sugeri isso a um deles, que até achou boa ideia. Mas havia um problema: eles não iam fazer um décimo álbum porque iam separar-se e acabar com a banda. Na altura disse: ok, liguem-me quando os a-ha voltarem. Disseram-me que não valia a pena porque os a-ha nunca mais voltariam. Claro: cinco anos depois acabaram por voltar.

Portanto a sua previsão estava certa.
Estava, mas esqueceram-se de me ligar — portanto fizeram o décimo álbum sem que eu filmsse o processo. De qualquer forma, gravaram esse disco [Cast in Steel, editado em 2015] de forma muito separada, à distância, com o Paul [guitarrista] em Nova Iorque e os outros dois em Oslo — bom, na verdade o Morten [vocalista] prefere trabalhar a partir de Estocolmo. Foi basicamente um álbum que fizeram sem estarem alguma vez juntos na mesma sala.

Para este filme estava a tentar levá-los a regressar ao estúdio e fazerem um disco todos juntos, mas não o quiseram. Durante as gravações do filme nunca foram para estúdio para fazer um disco novo, decidiram fazê-lo só depois de já ter tudo filmado. Neste preciso momento estão a fazer um álbum novo em conjunto.

Pareceu-me muito significativo que o filme comece com uma divergência de opiniões entre os membros da banda sobre se devem ou não gravar um novo álbum. Isso mostra uma diferença de visões dentro de uma banda que começou há muito tempo e também coloca o filme no presente, questionando o presente e o futuro dos a-ha. Queria mostrar logo desde o início do filme que isto também é um documentário sobre quem são os a-ha hoje, que banda e organismo vivo é este no presente? 

Quando percebi que a ideia original do filme — que era fazer um filme sobre os a-ha a gravarem um disco novo — não seria possível, passou a ser muito mais sobre porque é que isso não acontece, porque têm tantas dificuldades em trabalhar juntos e porque cada um dos membros da banda não está assim tão feliz com o facto de fazer parte dos a-ha. É estranho ter uma banda que tem tanto sucesso e em que todos os elementos sentem que não são muito apreciados pelos restantes.

É especialmente triste para quem é fã dos a-ha, como eu sou, porque poderiam ter feito muito mais música juntos se conseguissem ser mais simpáticos uns para os outros e se se respeitassem mais entre eles. Mas a banda é assim — e por outro lado, talvez não tivessem feito música tão boa se não tivessem personalidades tão fortes e estranhas. Talvez seja o preço que temos de pagar para os ter.

Existe a ideia de que o dinheiro, a fama e o sucesso podem alimentar falsas amizades — e que quando se depende de outra pessoa para se manter isso, se mantém uma amizade por interesse. Aqui temos o contrário: ao ver o filme ficamos com a impressão que o Paul e o Magne [teclista e guitarrista] tinham uma amizade muito forte — até viveram em Londres quase sem nada, “abaixo do limiar da pobreza” — mas quando quando todos os sonhos que tinham se tornaram realidade, quando conseguiram finalmente o sucesso que procuravam, não conseguiram manter a proximidade.
Sim.

Paul e Magne em Londres, quando viviam (garantem) "abaixo do limiar da pobreza", antes do sucesso de "Take On Me"

Henning Kramer Dahl

Parece-lhe que foi o sucesso que tiveram o responsável por essa deterioração da amizade que tinham? Do que se apercebeu das dinâmicas da banda, enquanto filmava, acha que começaram a afastar-se assim que tiveram sucesso e se tornaram estrelas pop ou isso aconteceu mais recentemente?
Quanto mais sucesso tens, mais és forçado a continuar a trabalhar com as mesmas pessoas. Se a banda não tivesse tido tanto sucesso, provavelmente acabava e não teriam de lidar tanto um com o outro. Seria mais fácil. Porém, quando tens sucesso queres continuar. Nas bandas que conseguem singrar acontece muitas vezes os artistas começarem carreiras a solo, mas é muito raro que essas carreiras tenham mais sucesso do que teve a banda. E nesse caso, a banda regressa.

Quando os a-ha voltaram [no final dos anos 90], o Magne e o Morten já não tinham interesse em que o Paul continuasse a ser o líder da banda. Não é que concordem necessariamente que o Paul era o líder da banda nos primeiros anos, sequer, mas apesar de dizerem o contrário há alguns exemplos no que vemos no filme e na forma como o Morten fala do Paul que permitem perceber que de alguma forma o seria.

Pelo menos na escrita de canções.
No início nada disso era muito estranho porque o Paul era mais velho do que o Magne e porque era o melhor a fazer canções completas — mesmo que o Magne tenha tido sempre grandes ideias para temas, como o “Take On Me”. No ofício de conseguir completar uma canção, de a tornar completa, o Paul destacava-se. Claro que o Magne foi melhorando cada vez mais com os anos, o Morten também começou a fazer canções e de repente queriam competir com o Paul nisso. O Paul é muito competitivo e não gostou especialmente da ideia, sobretudo porque nem sempre gostava das canções que os outros faziam.

Também lhes fez falta, sobretudo desde o regresso, um produtor ou um manager que os ajudasse a trabalhar em equipa. Parece-me que os últimos 20 anos foram muito mais extenuantes para eles do que os primeiros, porque no início tinham sucesso e tinham ideias mais próximas, chegavam mais facilmente a acordo. Só que manter uma banda junta quando as pessoas moram em países diferentes, quando só se encontram por causa da banda, torna difícil trabalhar em conjunto. Basicamente parece-me que os conflitos pioraram nos últimos 20 anos, desde que a banda voltou.

Motlys

No filme ouvimo-los referir influências como os The Velvet Underground e os Joy Division. É curioso, isso. Há uma construção mediática sobre quem foram os a-ha, devido ao sucesso gigante e mainstream da “Take on Me”, que não encaixa exatamente na ideia de que teriam este tipo de influências musicais.
Sim. Até os The Doors e o Jimi Hendrix [os influenciavam]. A questão é que no início, quando tinham a banda Bridges [que antecedeu os a-ha], não ouviam muito synth-pop. Depois começaram a fazê-lo. Mesmo eu, que era um pouco mais novo do que eles, comecei a interessar-me pelo movimento da música com sintetizadores, que talvez se possa dizer que tenha começado com os Kraftwerk e com bandas de antigos punks.

Os a-ha não eram antigos punks. Eu era, por exemplo. Talvez fossem um pouco velhos de mais para o terem sido naquela fase, portanto gostavam mais de um tipo de música hippie, dos anos 60. Só que começaram a ver o impacto do movimento punk e a forma como evoluiu para o pós-punk. Quando o Paul e o Magne foram para Londres, tiveram de usar uma drum-machine porque não tinham baterista. Começaram a ficar influenciados pela música com sintetizadores que ouviam em Londres, desde logo dos Soft Cell, mas também por bandas de rock como os Echo & The Bunnymen.

Ainda assim, tornaram-se uma banda diferente dessas que os influenciavam, certo?
Quando o Morten [vocalista] entrou, tornaram-se de forma natural mais comerciais. Isso aconteceu tanto pelo visual [beleza] do vocalista como pela voz que tinha, mas também porque o primeiro single que fizeram [“Take on Me”] teve aquele sucesso todo. Isso colocou-os imediatamente na gaveta das bandas de synth-pop, mesmo que o primeiro álbum tivesse canções que não eram tipicamente synth-pop como a “The Sun Always Shines on TV” e a “Hunting High and Low”.

Chegaram ali a um ponto em que era difícil mudar a forma como eram vistos. No segundo álbum ainda tentaram distanciar-se um pouco da imagem que as pessoas tinham deles mas foi muito difícil. A partir do momento em que és um certo tipo de banda, é muito difícil tornares-te depois outra banda diferente.

A história dos a-ha é também uma história sobre o conflito e as tensões de uma banda com o seu país? Ouvimos no filme expressões como “a Noruega é demasiado pequena para nós” ou “como podemos sair da Noruega?”. A música dos a-ha e a forma como orientaram a sua carreira foi  também uma reação de rutura face ao que viam na Noruega e no que os rodeava enquanto cresciam?

Sim, porque na Noruega, antes dos a-ha, não havia propriamente muita música boa. Grande parte do que existia consistia em traduzir letras para o norueguês: traduziam-se hits pop do mundo mudando a letra para norueguês. Isso era possivelmente aquilo que vendia mais. Também existiam alguns artistas que compunhavam e cantavam temas com guitarra acústica e voz, dado que a tradição folk era popular. Bandas de pop ou rock é que não existia grande coisa, sobretudo com algum sucesso fora da Noruega.

Lembro-me que quando os a-ha foram para Londres à procura de sucesso, uns amigos meus conheceram-nos, ouviram a música deles e acharam que nunca iriam singrar. Achavam que era má ideia os a-ha cantarem em inglês e que a música não soava nem suficientemente boa nem na onda das grandes bandas de sintetizadores que tinham aparecido um ou dois anos antes, como os Depeche Mode e os Soft Cell.

O historial das bandas norueguesas também não fazia prever grande sucesso internacional, certo?
Exato. Quando o primeiro single saiu [a primeira versão de “Take on Me”] todos quisemos que finalmente uma banda norueguesa tivesse sucesso no mundo. A Noruega era uma espécie de país sub-desenvolvido no que respeitava à cultura. Estávamos todos desejosos que alguma coisa de bom acontecesse a uma banda norueguesa. O primeiro single, porém, era suficientemente bom para ser um êxito na Noruega mas não fora da Norueuga. Depois, quando o refizeram, tudo mudou.

Lembro-me que foi quando ouvi a “The Sun Always Shines on T.V.” que pensei: isto é algo que nunca ouvi de uma banda norueugesa, é algo que está num campeonato só seu e que está no nível internacional que desejávamos. Achei depois o mesmo da “Hunting High and Low” — e, claro, da segunda versão da “Tkae On Me”, que fez com que tudo mudasse para os a-ha. Talvez tenha sido uma bênção mas talvez não tenha sido a melhor forma para uma banda se desenvolver. Talvez se o primeiro sucesso deles não tivesse sido tão grande e não tivesse chegado a número um, poderiam ter  tido um crescimento mais lento e sustentado tudo fosse melhor para o futuro da banda. Ou talvez não, é impossível dizer.

Talvez nesse caso não fossem vistos por tanta gente como o caso de tradicional de uma banda pop “one-hit wonder”, que não tinha grande coisa para oferecer musicalmente e artisticamente.
Exatamente.

Mas como é que alguém que foi um músico punk, e que fez também um filme/série sobre o movimento punk da Noruega [“Punx”], se interessa pela música dos a-ha a ponto de fazer um filme sobre eles?
Quando saiu a “The Sun Always Shines on T.V.” tornei-me um grande fã. Mais do que isso, apercebi-me que se os a-ha não eram definitivamente punks, eram ainda assim inspirados pelo movimento punk. O primeiro álbum que tinham feito como Bridges foi todo feito por eles, numa estética muito do it yourself: imprimiram mil cópias e andaram a vendê-las por aí como nós fazíamos com os nossos discos e cassetes de punk. Também fizeram uns concertos com umas bandas punk. Além disto, o punk mudou tanto toda a indústria da música que era impossível não se ser inspirado por ele, de uma forma ou de outra. Ou o odiavas ou o adoravas, mas até quem o odiava sentia que isso fazia parte das suas vidas e daquela época, de alguma forma.

Todas as miúdas que adoravam disco e odiavam o punk naqueles tempos adoraram quando eu fiz um filme sobre o movimento punk. De igual modo, também eu comecei a gostar de disco mais tardiamente. Toda a gente acaba por vir a gostar de coisas que odiava quando era novo. Acho que os a-ha em específico foram inspirados pelas primeiras bandas de pós-punk. Podiam não adorar os Sex Pistols ou os The Clash, mas definitivamente adoravam os Echo & the Bunnymen, os Joy Division, os The Velvet Underground (que eram uma espécie de banda pré-punk)… para mim foi natural, gostando de punk, vir a gostar depois dos a-ha porque eram de alguma forma uma espécie de banda pós-punk new wave.

Viggo Bondi

Como descreveria o sucesso e o impacto que os a-ha tiveram na música da Noruega, na confiança dos noruegueses, na moda norueguesa, na cultura? Mudaram o país?
Mudaram o país, definitivamente. Os a-ha deram a muitas pessoas a crença de que era possível ter sucesso vindo da Noruega. Houve bandas que apareceram logo a seguir que não tiveram tanto sucesso, mas tiveram algum sucesso. E outras que vieram bem mais tarde. Todas as bandas posteriores ouviram e deixaram-se inspirar pela história e percurso dos a-ha enquanto cresciam.

Os a-ha mudaram tudo na Noruega, mudaram até a confiança que cada norueguês tinha. Finalmente tínhamos algo com impacto. O estranho é isto: no ano em que os a-ha chegaram a número um no top da Billboard [dos EUA] com a “Take On Me”, a Noruega ganhou a Eurovisão. Normalmente ficávamos em último, o habitual era as canções norueguesas não receberam pontos nenhuns. Aquela época específica foi um momento definidor e de mudança para todo o país e para a cultura da Noruega.

Como é que a banda é vista hoje no seu país? Falámos de como a opinião de algumas pessoas pelos a-ha ficou muito marcada pelo sucesso estrondoso e de massas da “Take On Me”. A banda é consensual na Norueguesa ou, artisticamente falando, é subvalorizada?
Na Noruega os a-ha são muito mais respeitados por toda a sua carreira, não apenas pela “Take On Me”. Acho que este filme pode abrir os olhos das pessoas de outros países e fazê-las ver que os a-ha não foram apenas a banda da “Take On Me”. Na Noruega, como no Reino Unido e até na Alemanha, os a-ha tiveram mais canções de enorme sucesso. E as pessoas que acompanharam e ouviram os a-ha ao longo dos anos sabem que têm muito mais êxitos e muito mais música que merece respeito. Os álbuns deveriam ser mais considerados. A minha opinião é similar à de pessoas que acompanharam o percurso dos a-ha: é uma banda subvalorizada.

Os a-ha deveriam ser muito mais respeitados, mas é culpa deles que não o sejam e eles sabem [ri-se]. Até quando tiveram um grande regresso com o [disco de 2009] Foot of the Mountain, tinham aí uma oportunidade para elevar a banda. Em vez de o fazerem, separaram-se. Cometeram erros e não foram assim tão poucos. No início dos anos 90, por exemplo, deveriam ter andado muito mais em digressão, deveriam ter ido aos EUA e deveriam ter tocado em todas as universidades americanas e em salas mais pequenas. Tiveram essa oportunidade para serem uma banda mais respeitada artisticamente mas não a aproveitaram. Espero que o filme ajude a rever o legado da banda. Muitas pessoas têm-me dito depois de verem o filme que lamentam que a banda seja tão disfuncional mas que também ficam curiosos porque sentem que há imensa música fantástica para descobrirem.

Para os leitores portugueses que não conhecerem bem a banda além desse êxito que foi a “Take On Me”, que outras duas ou três canções sugeriria para desconstruir a ideia que possam ter dos a-ha?
Algumas das minhas canções favoritas são, claro, alguns dos grandes êxitos que tiveram. Mas sugeriria a “Summer Moved On”, que foi um grande êxito mas não dos anos 80 — é uma forma de descobrir um lado diferente dos a-ha porque é sem dúvida uma das grandes canções que lançaram depois da banda ter voltado. Diria também a “Memorial Beach”, que parece quase uma balada jazz e que mostra um lado dos a-ha totalmente diferente da “Take on Me”. Para última sugestão, talvez a “Living a Boy’s Adventure Tale”, que pertence ao primeiro álbum mas que é uma canção muito diferente da “Take On Me” e de outras canções famosas. Este tema chegou mesmo a ser pensado para primeiro single dos a-ha. Pergunto-me o que teria acontecido à banda se o primeiro single tivesse sido este.

Dizia há pouco que não conseguiu juntar os três membros dos a-ha na mesma sala para conversar, durante as filmagens. Pareceu-lhe que essa “distância de segurança” era um mecanismo de proteção para evitarem gritar e andar à bulha uns com os outros — que é o que imaginamos quando pensamos em “grandes tensões” dentro de uma banda — ou as personalidades que têm nunca levariam a isso?
Eles lutam sobretudo por e-mail e através do silêncio. Mesmo agora que estão em estúdio, não é como se andassem ao soco. A luta é mais assim: toda a gente vai ter com o manager ou com o produtor e leva as suas queixas, diz o que sente.

Isso é algo tipicamente norueguês?
É. É a forma norueguesa de fazer as coisas: há muito mais facadas nas costas e conversas nas costas dos outros. Portanto, o que acontecerá é isto: um pequeno grupo conversa sobre o quão horrível o Paul é, outro pequeno grupo fala sobre a dificuldade que é lidar com o Morten e um terceiro grupo diz ‘aquelas canções do Magne não são assim tão boas’ [risos]. Todos falam nas costas dos outros, é isso que acontece.

Não é possível captar tudo isso num filme e, já agora, um filme sobre a feitura de um álbum não teria de ser necessariamente um filme sobre os a-ha a discutir. Poderia ser um filme sobre como lentamente, e apesar das divergências, a magia acontece — sobre como uma canção cresce de uma ideia inicial, de base, até se completar e tornar uma grande canção. Não estava a pensar necessariamente que quereria tê-los no estúdio a discutir, se fizesse esse tipo de filme. Queria captar o momento em que a música mais espectacular acontece.

Magne Furuholmen

Tinha alguma referência em mente, nesse modelo de filmes?
O “Let It Be” era a minha grande inspiração. Vi-o pela primeira vez quando tinha dez anos. Antes de tudo o resto, fiquei maravilhado por ver uma banda a trabalhar em equipa, as pessoas no estúdio a fazerem as canções. Como as canções são feitas: para mim isso era o mais incrível.

Mas também fiquei chocado na altura por ver os Beatles a discutir. Acontece que quando revi o filme há uns meses, depois de não o ver há quase 50 anos, descobri que só discutem durante uns 19 segundos [ri-se].

Ninguém lhe leva a mal que com dez anos não estivesse à espera de ver os Beatles a discutir, mesmo que só durante 19 segundos. Uma última questão: há mais alguma banda sobre a qual gostasse de fazer um filme no futuro?
A primeira escolha seria ABBA. Porque são suecos, porque são nossos vizinhos [da Noruega] e porque os adorava quando tinha dez anos, porque os odiei quando tinha 16 e porque voltei a adorá-los quando tinha 20 anos. É impossível superar aquelas melodias — só os Beatles o conseguiram.

Além disso foram feitos imensos documentários sobre os ABBA mas todos eles… não sei, acho que seria fantástico conseguir chegar mesmo ao interior da banda e ao fundo das questões, ainda mais agora que voltaram. Não acho que isso vá acontecer mas seria a minha escolha número um. Depois tenho outras dez ou 20 bandas que adoraria filmar, claro. Ainda tenho a esperança de conseguir fazer um filme sobre uma banda a fazer um disco em estúdio. Veremos se isso ainda acontece.

Talvez ainda aconteça com os a-ha, quem sabe?
[Risos]. Desta vez, para o próximo disco, já não. Talvez quando tiverem uns 70 anos ou assim.

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