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Aos 40 anos, Ayres Gonçalo é um dos alfaiates mais jovens do Porto e a Suíça é o seu maior mercado de trabalho
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Aos 40 anos, Ayres Gonçalo é um dos alfaiates mais jovens do Porto e a Suíça é o seu maior mercado de trabalho

Rui Oliveira/Observador

Aos 40 anos, Ayres Gonçalo é um dos alfaiates mais jovens do Porto e a Suíça é o seu maior mercado de trabalho

Rui Oliveira/Observador

Ayres Gonçalo, o alfaiate que aprendeu tudo com o avô, já vestiu o príncipe Carlos e agora vai ser professor

Ayres Gonçalo aprendeu a ser alfaiate com o avô, trabalhou em quatro países e até já vestiu o príncipe Carlos. Em breve, será professor na Escola de Moda no Porto, para não deixar o ofício morrer.

É no número 22 da Praça D. Filipa de Lencastre, no Porto, que há 10 anos mora o ateliê de Ayres Gonçalo, um dos mais jovens alfaiates da cidade. Aprendeu tudo o que sabe sobre corte e costura com o avô, com quem começou a trabalhar com apenas 16 anos. “Via os tecidos a chegarem e dois ou três dias depois tinham-se transformado numa peça para vestir. Construíam tudo com as próprias mãos ali à minha frente, era fantástico.”

Motivado pela vontade de aprofundar o ofício, e perante a inexistência de oferta no país, partiu para Madrid para estudar. Trabalhou em Savile Row, a famosa rua londrina onde em cada porta encontramos uma alfaiataria, e foi lá que, em 2009, teve a oportunidade de fazer um fato à medida para o príncipe Carlos. “Lembro-me que estava muito nervoso, mas ele foi muito simpático e acessível, acredito que quanto mais importantes as pessoas são, mais simpáticas e simples se tornam.”

O jovem alfaiate ainda passou por Nova Iorque e Hong Kong, mas foi numa das muitas viagens de avião que decidiu regressar a Portugal definitivamente. “Foi no ar que comecei a desenhar o meu website, escolhi a música e escrevi o texto de apresentação. Voltei com a ideia de abrir um espaço em Lisboa, mas quando chego ao Porto tenho um amigo que se vai casar e pediu-me para lhe fazer o fato.”

Instalou-se numa sala pincelada de verde escuro e muita madeira, com uma vista privilegiada sobre o Porto, e é la que, entre tesouras, giz, amostras de tecidos e fitas métricas, faz fatos e camisas à medida para noivos, empresários estrangeiros e algumas figuras públicas. Ayres Gonçalo fez do casaco trespasse com apenas um botão e dos forros coloridos e com padrões a sua imagem de marca, criou uma coleção de sapatos portugueses e recentemente fundou a Pazzi, uma marca de camisas iguais para pais e filhos.

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Habituado a visitar clientes pelo mundo, com a pandemia viu voos a serem cancelados, casamentos adiados e a sua produção a reduzir 20%. “Este sobretudo era para ter sido entregue ao cliente na Suíça em março, mas ainda está aqui pendurado”, explica. Otimista, exigente e provocador, Ayres lamenta que a sua profissão continue em vias de extinção e acusa os mais velhos de não se modernizarem. “Os alfaiates nunca se interessaram em dar formação porque estavam bem, tinham as suas costureiras, os seus clientes fiéis e não quiseram saber das gerações que vieram a seguir. Não se modernizaram, estão agarrados as técnicas que aprenderam há 50 anos e os jovens hoje querem uma coisa completamente diferente.”

A partir de maio, dará aulas de alfaiataria na Escola de Moda do Porto e espera assim que o ofício não desapareça. Acredita que vai trabalhar até morrer, mas antes de arrumar as tesouras e guardar as linhas gostava de vestir um James Bond, “de preferência o ator Pierce Brosnan”.

Adepto de um estilo clássico, Ayres fez do casaco de trespasse com apenas um botão e dos forros coloridos as duas imagens de marca

Rui Oliveira/Observador

Como descobriu a alfaiataria?
O meu avô é alfaiate e vivia muito na alfaiataria dele, na baixa do Porto. A minha mãe atendia o público e o meu infantário era na mesma rua, tanto eu como os meus irmãos, acabávamos a escola e íamos diretamente para a loja esperar que a minha mãe acabasse de trabalhar. Lembro-me de ir brincar para a oficina e mais tarde, já na primária, no preparatório e no secundário, a alfaiataria era o nosso ponto de encontro, seja para almoçar, lanchar ou até mesmo ir buscar dinheiro.

O que o fascinava?
A arte em si, a peça a ser construída do zero. Via os tecidos a chegarem e dois ou três dias depois eles tinham-se transformado numa peça para vestir. Construíam tudo com as próprias mãos ali à minha frente, era fantástico. Sempre gostei muito de moda, mas as pessoas ligadas à alfaiataria eram quase todas da terceira idade, não tinha uma referência jovem nessa área. Observava alguns alfaiates que trabalhavam com o meu avô e não me identificava com aquela imagem, via-os corcundas, sempre a trabalhar numa cadeira, não imaginava aquilo para mim.

O gosto pela moda surgiu quando?
Os meus pais gostavam de se vestir bem e incutiam muito isso em nós, não nos deixavam vestir qualquer coisa, tinham essa preocupação. Tenho uma paixão grande por sapatilhas, na minha adolescência comprava sempre modelos diferentes que mais ninguém tinha. Aos 16 anos, fui viver com os meus avós e comecei a acompanhar muito mais o meu avô. Terminava as aulas e ia trabalhar com ele, fazia provas e visitava clientes, que eram sobretudo homens de negócios, banqueiros, industriais e grandes advogados. Comecei a perceber que estas pessoas tinham que vestir fatos diariamente, eu gostava de fazer aquilo, então poderia ser uma boa oportunidade para mim. Foi assim que senti o clique e aos 16 ou 17 anos já estava a trabalhar a full time com o meu avô.

Lembra-se da primeira peça que fez?
Foi um colete que fiz com sete anos, por brincadeira. Para outra pessoa, foi um casaco e umas calças de bombazine que dei a uma amiga.

Ponderou fazer outra coisa na vida?
Nunca. Para mim era importante ter formação nesta área, mas havia pouca coisa, não havia internet e os alfaiates nunca se deram bem uns com os outros, sentia-se muita rivalidade. Ainda hoje, se vou visitar outro alfaiate, ele não me deixa entrar na oficina, não há esse habito. Naquela altura, só via o trabalho que o meu avô fazia e queria descobrir mais, tinha essa vontade. Num livro dele encontrei uma escola de alfaiataria em Lisboa e fui de comboio sozinho até lá para saber informações, mas percebi que era o último ano que iam fazer o curso, pois não havia procura. Regressei triste para o Porto e comecei a pensar em soluções, porque trabalhar em família nem sempre é fácil. O meu avô sempre teve um feitio complicado, é muito rígido e exigente, às vezes tem razão, outras vezes não tem razão. Precisava de ganhar experiência noutros sítios, queria muito viver lá fora, tinha que me libertar.

"Três ou quatro meses depois, mudei-me para Londres, vesti o meu melhor fato, que o meu avô me tinha feito, e comecei a bater literalmente às portas para me apresentar. Tinha 24 anos e em alfaiataria não há propriamente um portofólio, é uma profissão prática em que é necessário fazer, experimentar, ver e avaliar."

Em 2004 vai para Madrid estudar, como foi esse salto?
Fui passar o ano novo a Marraquexe e passei por Madrid, onde passei uma noite. Fui logo ver nas Páginas Amarelas alfaiates na zona e entrava nas lojas como cliente para fazer perguntas e mexer nas peças, até que entrei numa e percebi que havia uma escola duas portas ao lado. Estive lá um ano, durante o dia trabalhava com o Pedro Muñoz, o melhor alfaiate madrileno, e à noite fazia o curso. Era mesmo o melhor dos dois mundos. Comecei a aprender muito mais a trabalhar do que na escola. O tipo de clientes era semelhante aos do meu avô, mas numa escala diferente, uma vez que tinham muito mais disponibilidade económica.

Dois anos depois, parte para Londres?
Quando acabei o curso em Espanha ouvi falar de Savile Row pela primeira vez, uma rua cheia de alfaiatarias. Comprei uma viagem para Londres para ver com os meus próprios olhos e era mais do que tinha imaginado. Fiquei completamente deslumbrado, vi 30 pessoas de todas as idades, incluindo mulheres, a trabalhar numa oficina no rés do chão de uma loja, não conhecia ninguém, mas senti que tinha de tentar a minha sorte. Três ou quatro meses depois, mudei-me para Londres, vesti o meu melhor fato, que o meu avô me tinha feito, e comecei a bater literalmente às portas para me apresentar. Tinha 24 anos e em alfaiataria não há propriamente um portfólio, é uma profissão prática em que é necessária fazer, experimentar, ver e avaliar. Na terceira loja a que fui, tive a sorte de ser atendido pelo gerente do espaço que me disse que tinham uma mesa livre e perguntou se não queria ir à experiência. Não hesitei, ao fim de três meses à experiência fizeram-me um contrato de trabalho, fiquei lá quatro anos e sentia-me a crescer diariamente. Estava noutro campeonato, trabalhávamos da família real britânica ao presidente da Air France, os nossos fatos começavam nas 5 mil libras, havia clientes árabes que chegavam e escolhiam cinco ou seis fatos.

O que recorda mais desse tempo?
Eles têm um método de trabalho espetacular, trabalha-se por objetivos, conseguia gerir o meu horário e nunca senti pressão. Estava lá de manhã à noite porque queria fazer sempre mais, nos tempos livres fazia peças para mim e quanto mais tempo estivesse na oficina, mais aprendia. Havia uma equipa muito jovem, que ainda hoje são dos meus melhores amigos, existia muita competitividade entre nós, mas vivida de uma forma saudável. Ajudávamo-nos mutuamente e cresci muito assim. Ao contrário do que acontecia no Porto, todos os alfaiates daquela zona se davam bem, encontrávamo-nos ao fim do dia para ir beber um copo a um pub, foi uma aprendizagem constante.

Como surge a oportunidade de fazer um fato para o príncipe Carlos?
A casa onde trabalhei, a Gieves & Hawkes, tem uma tradição de 300 anos e há 210 que trabalha para a família real britânica. Para comemorar os 200 anos desta ligação, o príncipe Carlos visitou, com a duquesa Camilla Parker-Bowles, durante poucos minutos a oficina. Eles só chegavam às 10h00, mas tivemos que chegar às 6h30, porque vinham os cães das minas e armadilhas e quando eles saíssem da loja, mais ninguém podia entrar ou sair. Lembro-me que estava muito nervoso, mas ele foi muito simpático e acessível, acredito que quanto mais importantes as pessoas são, mais simpáticas e simples se tornam. Ao aproximar-se da minha mesa, a Camilla percebeu que o meu sotaque era diferente e perguntou de onde era. Quando soube tinha nascido no Porto, disse-me que ambos já tinham visitado o Douro às escondidas e foi aí que ela o chamou e coincidiu com a altura em que decidiu fazer um fato. Peguei logo nas amostras de tecido e como tinha a fita métrica por perto tirei-lhe logo ali as medidas. Não o deixei escapar, foi mesmo uma questão de sorte.

Lembra-se de como era o fato?
Um azul escuro com xadrez. É engraçado porque depois fiquei atento e não o vi com fato vestido nas revistas ou na televisão, só dois anos mais tarde é que encontrei uma fotografia dele vestido com a peça numa exposição em São Paulo. Demorei três ou quatro meses para fazer o fato, dependíamos muito da agenda dele. Fomos fazer provas ao apartamento do príncipe e percebi que tirava um dia inteiro só para fazer provas.

Tecidos coloridos para forros, tesouras compradas pelo avô ao alfaiate do rei D. Carlos ou um antigo caderno de clientes, onde constam nomes como Artur Santos Silva ou José Maria Pedroto

Rui Oliveira/Observador

Depois disso, parte para Nova Iorque e ainda passa pelo continente asiático?
Sim, tive um convite para ir para Nova Iorque fazer uma experiência com outro alfaiate. Londres é uma cidade bonita para trabalhar, mas não é uma cidade bonita para viver e a minha intenção sempre foi regressar. O meu avô já tinha fechado a loja, mas tinha ficado com bons clientes, por isso, sabia que poderia arrancar aqui. Tendo recebido esse convite, queria viver a experiência e acabei por ficar lá um ano. A nossa produção era feita em Hong Kong, então tinha que passar lá temporadas regularmente, fazer controlo de qualidade, aliás cheguei a organizar a minha festa de 30 anos lá. Os americanos não têm tradição nenhuma em alfaiataria, em Manhattan só fazia provas. Pagavam-me muito bem, tinha casa e tudo, mas a minha cabeça já estava aqui.

Regressa em maio de 2011, já com a ideia de que seria definitivo?
Sim, fartei-me e decidi que me ia despedir numa viagem de avião, aliás foi nessa mesma viagem que comecei a desenhar o meu website, escolhi a música e escrevi o texto de apresentação. Volto com a ideia de abrir um espaço em Lisboa, mas quando chego ao Porto um amigo que ia casar pediu-me para lhe fazer o fato. Na prova apareceu com o pai e os padrinhos, então acabei por fazer para eles também. Comecei logo a ter trabalho, mas a minha ideia inicial era ir para Lisboa, cidade onde estava todo o mercado financeiro.

Quem eram os seus clientes?
Herdei dois ou três clientes do meu avô, o resto morreu porque o meu avô já tem 91 anos. Depois começaram a aparecer os netos dos clientes meu avô, o que é muito engraçado porque saltou uma geração, os que nasceram na época do pronto a vestir, e depois os netos queriam recuperar a pinta e as origens dos avôs. Os preços são completamente diferentes, mas vêm com a noção de investimento, porque a durabilidade de um fato feito por medida é vitalícia.

Como encontra este espaço na baixa?
Estive na Rua do Almada durante quatro meses, no escritório de arquitetura de um amigo, mas precisava de ter um espaço maior para receber os clientes no Porto e fazer a produção. Esta era a sala onde o porteiro do prédio vendia livros da Porto Editora, adorei a vista, a luz natural e fiquei. Nessa altura já ia a Lisboa visitar clientes todas as semanas, tinha a necessidade de abrir lá um espaço só para realizar provas, coisa que aconteceu dois anos depois de abrir no Porto.

Chega a Portugal em plena crise financeira, quando toda a gente queria ir embora. Não sentiu receio de que as coisas corressem mal?
Sim, muita gente achava esquisito estar a regressar na altura da Troika, quando toda a gente estava a querer fugir, mas a minha intenção sempre foi trabalhar daqui para fora, ir à Suíça dois dias visitar clientes ao escritório ou ao hotel, passar por Paris, São Paulo ou Londres. A ideia é ter aqui a minha base, mas trabalhar com clientes portugueses que trabalhem lá fora, na banca por exemplo, ou até mesmo estrangeiros. O passa a palavra é a minha publicidade, um cliente satisfeito diz a outro, mas um insatisfeito tira-me logo 10 contactos.

"As mulheres compram muito mais do que homens, mas não compram tão caro e em Portugal não temos mulheres executivas, que sejam presidentes de um banco, por exemplo. Acho que chegaremos lá, gostava muito de ver uma mulher como primeira-ministra."

Trabalhou em três continentes, há diferenças do que é a alfaiataria em cada um deles?
Há três países com tradição em alfaiataria: Itália, Inglaterra e Japão. Os tecidos com mais qualidade são produzidos em Itália e em Inglaterra, mas depois há os estilos de corte que podem ser muito diferentes. Os italianos têm um estilo mais leve, é um país mais quente, a estrutura do casaco não é tão pesada, já os ingleses parecem ter uma armadura, os fatos são mais rígidos. Os japoneses fazem uma mistura, gosto muito das linhas retas deles, usam muitos fatos de riscas para negócios, mas depois para uma cerimónia o noivo pode ir de branco.

Há algum modelo que goste mais de fazer?
O meu preferido é o trespasse, era a especialidade do meu avô e também o que adotei porque o considero muito elegante. O meu estilo prende-se com um trespasse feito só com um botão, em vez dos seis habituais.

Muitas das suas peças têm forros com padrões coloridos. Esse lado provocador e irreverente é o que o distingue na alfaiataria?
Acho que sim. Posso vestir um homem clássico com um fato azul escuro para trabalho, ele estará clássico por fora, mas por dentro pode ter um forro com mulheres nuas. Só vai ver aquilo quem ele quiser, quando ele abrir ou tirar o casaco. Normalmente proponho esta ideia, pergunto o hobby para me inspirar, mas depois o cliente ou aceita ou prefere ser mais discreto.

A relação com o cliente deve ser algo intimista e cúmplice. Como faz essa abordagem?
Normalmente tento quebrar o gelo, quando entra aqui um jovem e trata-me por senhor, peço para me tratar por tu. Começamos por escolher os tecidos e tirar as medidas, por isso, a primeira vez que estou com o cliente vejo-lhe logo as cuecas e toco-lhe logo no corpo. Depois ao longo do tempo vou ganhando mais confiança e faço também um trabalho de aconselhamento e consultoria, pois se um homem de negócios já vem com uma ideia concebida de um fato para trabalho, um noivo normalmente chega aqui com muitas dúvidas. Aliás, foi por causa dos noivos que decidi alargar a oferta para complementos como camisas ou sapatos, tudo feito em Portugal.

Nunca se aventurou no universo feminino?
Sim, fiz coisas pontuais, aprendi a fazer bem tailleurs, não faço regularmente porque não há grande procura. As mulheres compram muito mais do que homens, mas não compram tão caro e em Portugal não temos mulheres executivas, que sejam presidentes de um banco, por exemplo. Acho que chegaremos lá, gostava muito de ver uma mulher como primeira-ministra.

Escovas, sapatos, espelhos e casacos inacabados pendurados integram o ateliê de Ayres, que em breve dará aulas de alfaiataria

Rui Oliveira/Observador

Já está farto de ouvir que a sua profissão está em vias de extinção?
Sempre senti isso. A taxa de desemprego na alfaiataria é zero e isso entristece-me, tenho esperança que mude. Ainda bem que sai do Porto para ver como eram as coisas lá fora, cheguei a Madrid e tinha uma escola, em Londres há colégios de alfaiataria com 200 pessoas, na Ásia era mesma coisa. Em Portugal nada acontecia, os alfaiates nunca se interessaram em dar formação porque estavam bem, tinham as suas costureiras, os seus clientes fiéis e não quiseram saber das gerações que vieram a seguir. Não se modernizaram, estão agarrados as técnicas que aprenderam há 50 anos e os jovens hoje querem uma coisa completamente diferente. Não houve uma evolução na profissão, não foi passado o testemunho, não existiu gente nova a aprender este ofício muito por culpa dos alfaiates mais antigos.

Sempre quis dar aulas?
Tive duas grandes oportunidades, uma na faculdade de Belas Artes, no Porto, e outra da faculdade de Arquitetura, em Lisboa, mas não se concretizaram. Há três semanas ligaram-me da Escola de Moda do Porto e convidaram-me a dar um curso de alfaiataria, que vou começar em maio. É um desafio espetacular e vai fazer com que a alfaiataria não morra. Quem vai para o curso quer mesmo isto, darei aulas duas vezes por semana e para já está bastante equilibrado entre rapazes e raparigas.

O que mudou a pandemia na sua rotina de trabalho?
Mudou logo nos casamentos que foram adiados, foi o primeiro sinal que tive. Para este ano estão a ser adiados novamente, por isso preocupa-me que em 2022 existam um excesso de trabalho e terei que estar preparado para dar essa resposta. Depois condicionou-me muito as viagens que fazia para visitar clientes, ainda tenho sobretudos no ateliê que deveriam ter sido entregues em março e não foram. Estou à espera que abram as fronteiras para me poder movimentar. Não estou a com a produção a 100% mas a 70%.

Quem ainda gostaria de vestir?
Gostava de fazer um fato para um James Bond, o que mais gosto é o Pierce Brosnan, é o que tem mais pinta e mais charme.

Que peça lhe faria?
Talvez um smoking verde escuro.

Imagina-se a trabalhar até aos 91 anos, como o seu avô?
Claro que sim, um alfaiate morre na mesa e a trabalhar. Sei que o meu avô nunca quis que seguisse isto, antigamente a alfaiataria não era uma profissão nobre e ele sonhava com uma coisa diferente para mim. Só quando na adolescência comecei a trabalhar na oficina ao lado dele é que percebeu que levava as coisas a sério. Quando saí de Portugal é que percebeu que queria mesmo seguir isto e talvez tivesse algum jeito.

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