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A Digi nasceu na Roménia e está desde há alguns anos em Itália e Espanha. Chega agora a Portugal

Bloomberg via Getty Images

A Digi nasceu na Roménia e está desde há alguns anos em Itália e Espanha. Chega agora a Portugal

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Começou a vender gelados, acabou como milionário das telecomunicações. Quem é o misterioso dono da Digi, a nova operadora em Portugal?

É um dos homens mais ricos da Roménia, onde fundou a empresa de telecomunicações Digi. Gosta de manter-se afastado da imprensa ao ponto de, no país, ser conhecido como o “multimilionário sem rosto".

No início da década de 90, quando a maior parte dos romenos conduzia um Dacia, Zoltan Teszari fez uma extravagância: comprou um reluzente Audi 80 vermelho. Num país acabado de sair do domínio soviético, a aquisição foi uma invulgar demonstração de riqueza.

É um dos poucos episódios conhecidos de Teszari, de 54 anos, um ex-campeão de judo transformado em empresário e fundador da Digi, a empresa de telecomunicações romena que arrancou com a operação no mercado português esta semana. Teszari é uma figura que se mantém afastada dos olhares públicos — é tão discreto que, na Roménia, é conhecido como “o multimilionário sem rosto”. Segundo uma investigação da económica Capital Magazine, até foi Teszari quem quis ser apelidado desta forma.

As aparições em eventos públicos e as entrevistas são praticamente inexistentes nos últimos anos e a imprensa teve de encontrar soluções alternativas para ilustrar notícias sobre Teszari: usar uma fotografia que tem quase 20 anos, de quando recebeu um prémio de empreendedorismo, ou uma imagem de paparazzi, mais recente, de quando foi apanhado a falar ao telefone durante um passeio num parque. Os jornais romenos referem que as máquinas fotográficas “são o seu maior inimigo”. “Ele não quer aparecer nas fotografias. É um princípio seu que as memórias têm de ficar na mente, não em fotografias”, revelou um amigo do empresário à Capital Magazine.

Com tanto secretismo, há poucas certezas sobre o aspeto atual daquele que é o 14.º homem mais rico da Roménia. De acordo com as estimativas da Forbes Roménia feitas em 2023, o discreto empresário tem um património estimado de 1.900 milhões de lei romenos, o equivalente a cerca de 382 milhões de euros, maioritariamente ligado à área das telecomunicações. Ainda que com algumas oscilações, é uma presença habitual na lista dos romenos mais ricos desde pelo menos 2010.

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Inicialmente, era uma presença assídua nas tarefas diárias da empresa de telecomunicações. Mas, segundo relatos de ex-trabalhadores, era difícil interagir com ele. “Ninguém na Digi sabe como chegar ao Tészari”, adiantou um ex-funcionário da empresa à revista romena. Praticamente todas as fontes ouvidas para aquele trabalho falaram de forma anónima, resumindo que o empresário tem um cuidado especial com quem fala e sobre o quê.

Digi. Há uma nova empresa de telecomunicações em Portugal. O que muda?

Em 2015, Teszari passou o testemunho de diretor-executivo a Serghei Bulgac e assumiu funções não executivas no conselho de administração. Sem a rotina do dia a dia, o mistério à volta da figura do empresário adensou-se e acompanhou o crescimento da Digi, que entretanto entrou em mercados como Espanha, Itália e, agora, Portugal, com ofertas aparentemente concorrenciais.

Mantendo a aura de mistério, não é clara qual é a morada principal do empresário, que ainda é dono de 60% da Digi. Segundo quem lhe é próximo, tem um modesto escritório em Oradea, a sua cidade natal, até hoje. A imprensa romena especula que divide o tempo entre uma residência próxima de um resort na Transilvânia e Budapeste, na Hungria. A vida privada também é parca em pormenores, tirando o facto de ter um filho, Christian Zoltan Teszari, que competiu em vários torneios de ténis, e que terá 19 ou 20 anos.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre Zoltan Teszari.

A história do discreto romeno dono da DIGI

A vida antes da Digi, dos combates de judo até ao negócio dos gelados

Zoltan Teszari nasceu a 14 de setembro de 1970, em Oradea, na Roménia, uma cidade a alguns quilómetros da fronteira com a Hungria. A família, uma minoria de origem húngara na cidade, tinha um rendimento modesto durante o regime comunista. O pai, Zoltan, era mecânico e a mãe, Idiko, estava ligada à área das ciências.

A família manteve-se sempre em Oradea. Depois da Revolução de 89, quando se viveram os anos do El Dorado para os pequenos empreendedores romenos, os pais do jovem Zoltan criaram, em 1991, uma empresa de serviços automóveis chamada Tesazai SRL. Hoje em dia, opera com o nome Autocenter e, segundo os jornais locais, tem “algum prestígio” no país.

Os colegas de escola do empresário romeno descreveram Zoltan à Capital Magazine como um jovem que não tinha um aproveitamento escolar notável, mas era dono de uma “capacidade mental aguçada” e um excelente atleta.

Sempre de poucas palavras e muito ponderado, o já então discreto Zoltan só dava nas vistas num sítio: o tatami, onde se revelou um atleta empenhado nas artes do judo. Quando acabou o liceu, aos 18 anos, foi convidado para a equipa de judo do CS Dínamo, na capital Bucareste.

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São poucas as imagens do fundador da Digi, um operador de telecomunicações nascido na Roménia

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Foi durante as viagens para o estrangeiro que Zoltan Teszári terá começado a mostrar olho para o mundo dos negócios. Fora da Roménia, conseguia obter muitos artigos que eram de difícil acesso aos compatriotas, como whisky, certas marcas de roupa, cigarros ou café. A fórmula era fácil: comprar barato nos países onde ia competir mas vender caro em casa, com uma margem de lucro generosa. O discreto jovem passou a ter dinheiro e o objetivo de aumentar o seu património. Só cedeu numa extravagância: a compra do tal Audi vermelho — ato que, na opinião de um colega próximo da altura, serviu como prémio de consolação por não se ter sagrado campeão de judo em Atenas.

Em 1991, depois da Revolução, Zoltan regressou a Oradea, onde decidiu investir os ganhos das suas vendas numa gelataria, a Rubin & King, instalada no quintal de uma igreja. A localização não terá sido inocente. “O Zoli [como foi apelidado por um amigo próximo] pensou tudo de maneira muito inteligente”, referiu o amigo à Capital Magazine. Primeiro, escolheu um dos amigos, Ludescher Csaba, como parceiro de negócio. “Escolheu-o porque era neto do bispo Tempfli Jozsef e por isso podiam usar o quintal da Igreja Católica Romana, que era uma zona muito boa para este tipo de negócio.” A Rubin & King, que recebeu o nome pela combinação das alcunhas dos fundadores, cresceu e tornou-se no maior distribuidor para produção de gelados da Transilvânia.

O negócio adoçou a vida financeira da dupla e serviu, mais tarde, como pilar para a criação de outro negócio, de importação de equipamentos para televisores, até evoluir, por fim, para uma empresa de telecomunicações.

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A Digi considera que Espanha é um dos seus mercados de crescimento

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Um império made in Roménia, que começou nas telecomunicações e já chegou aos media

A empresa de Teszari passou por várias etapas até chegar ao que é hoje. Mas tudo começou por um negócio de televisão por cabo, em 1992, então chamado TVS Holding Brasov. De acordo com a página de história da Digi, fornecia apenas serviços em Timisoara e Brasov, duas das principais cidades da Roménia. Quatro anos depois, o fundador Teszari decidiu expandir a sua empresa e o nome deixou de ser apenas regional: nasceu a Romania Cable Systems S.A, conhecida como RCS.

Durante alguns anos, a RCS cresceu de forma orgânica e embarcou na novidade da internet. Além dos serviços de TV por cabo, passa a disponibilizar acesso à internet um pouco por todo o país. Foi assim que surgiu, em 1997, uma subsidiária da RCS chamada Romania Data Systems (RDS). É na mudança de milénio que surgiu a holding Digi Communications.

Alguns anos mais tarde, a companhia entrou no negócio da voz fixa, disponibilizando chamadas de telefone fixo apenas a clientes empresariais e clientes internacionais. Em 2004, após um acordo de interconexões com a Telekom Romania, massifica-se no mercado da telefonia fixa. Em dezembro desse mesmo ano, surge no mercado a marca Digi, para refletir os serviços DTH (direct to home).

Durante todos estes anos, as palavras do fundador e CEO à imprensa foram escassas. Só em 2002, em raras declarações de viva voz, é que mostrou a ambição que tinha. “Quero tornar o RCS no grupo de telecomunicações mais importante da Roménia”, disse à Capital Magazine.

Com o passar do tempo, a empresa foi-se adaptando às tendências do mercado. Com a expansão do mercado de rede móvel e a popularização do 3G, surgiu uma nova marca, a Digi Mobil, já em 2007, dedicada apenas aos serviços de telecomunicações móveis.

Depois da rede, vieram os canais próprios de televisão e estações de rádio. Primeiro, pelos canais desportivos até chegar a uma oferta de quatro canais na Roménia e três na Hungria. Hoje em dia, a Digi tem ainda um serviço de filmes pagos, chamado Digi Film, um canal de notícias, Digi 24, e canais de documentários (Digi World, Digi Life e Digi Animal World). Também tem canais de música (UTV e Hora TV) e uma participação na Music Channel. Desde 2015 tem também quatro estações de rádio na Roménia (Pro FM, Music FM, Dance FM e Digi FM).

Embora a Roménia seja o principal mercado da Digi, desde 1998 que está em curso uma expansão internacional. A vizinha Hungria foi o primeiro país para os testes e, até 2006, a Digi foi tentando estabelecer-se com “pequenas subsidiárias” em países da Europa central e de leste. “Subsidiárias de que nos vimos livres depois”, especifica a página de história da companhia.

O mercado de crescimento mais significativo fora da Roménia foi mesmo Espanha, onde a empresa está presente desde 2008. A receita da Digi para o mercado espanhol é contada pela Bloomberg: responder à vaga de romenos que migraram para Espanha, com a promessa de preços baixos, cartões de telefone acessíveis em lojas de conveniência e um serviço ao cliente sem barreiras linguísticas, falado em romeno. Depois dos migrantes que queriam “sentir-se em casa”, piscou o olho aos espanhóis à procura de internet fixa e telemóvel a preços baixos. Hoje em dia, tem 6,1 milhões de clientes em Espanha e, segundo os números revelados pela empresa na apresentação em Lisboa, é o quarto operador no mercado espanhol, com uma quota de 9,1%. A empresa cresceu, em parte, porque tirou partido dos remédios implementados durante a fusão entre as operadoras Orange e MásMóvil no país vizinho, em 2023.

Depois de Espanha, seguiu-se a entrada em Itália, em 2010, e em 2021, à boleia do leilão do 5G, Portugal entrou na lista de destinos da Digi. Passados quase três anos, a empresa entrou esta semana no mercado português com a “vantagem”, como disse o diretor executivo, conquistada pela aquisição da Nowo, por 150 milhões de euros. Depois de Portugal, segue-se a Bélgica, país onde a empresa adquiriu espectro do 5G em 2023.

Digi avança para compra da Nowo por 150 milhões

A expansão da Digi tem ainda sido marcada por algumas controvérsias, nomeadamente a que ensombrou a oferta pública inicial (IPO) da empresa em 2017. Quando entrou em bolsa em Bucareste com um IPO de 190 milhões de euros, o maior  feito por uma empresa de telecomunicações na Roménia, também enfrentava um escândalo de corrupção ligado à venda dos direitos de transmissão dos jogos de futebol da liga romena de futebol. Na altura, Ioan Bendei, sócio de Teszari, foi acusado de ter subornado o então presidente da Liga de Futebol Romena em 3,5 milhões de euros. Polémicas e investigações à parte, nem a entrada em bolsa foi suficiente para trazer o “multimilionário sem rosto” à ribalta.

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