“Está renhido”. Por estes dias, são estas as duas palavras mais ouvidas nos bastidores do CDS. Os leais a Francisco Rodrigues dos Santos acreditam levar uma vantagem na corrida de pelo menos 60/40, mas sabem que as tropas do challenger estão a esconder trunfos. Os apoiantes de Adolfo Mesquita Nunes reconhecem que o incumbente joga em casa mas estão convictos de que será possível virar o resultado. Mais: que a guerra não acaba aqui.
Ao desafio de eleições internas feito por Mesquita Nunes, Rodrigues dos Santos respondeu com a convocação de um Conselho Nacional para votar uma moção de confiança à sua liderança. Grande parte dos cerca de 290 conselheiros foram escolhidos nas eleições que deram a vitória a Rodrigues dos Santos, o que resta da direção ocupa mais de 60 assentos e estarão quase todos com o atual presidente e ainda há 24 elementos da Juventude Popular (JP), que estarão alinhados com o atual presidente. O campo está inclinado a favor de Francisco Rodrigues dos Santos.
Num universo de 290 conselheiros — a lista ainda não está fechada, mas a contagem final não andará longe deste número –, o líder do CDS acredita ter consigo garantidos qualquer coisa como 170 votos. Do lado de Francisco Rodrigues dos Santos, garante-se que essas contas são feitas por baixo e que não incluem os 24 conselheiros indicados pela JP ou os 12 indicados pela Federação dos Trabalhadores Democratas-Cristãos (FTDC).
Mesquita Nunes tem contas diferentes. “Está 50/50”, diz ao Observador um dos apoiantes do antigo vice-presidente de Assunção Cristas. Os aliados do ex-secretário de Estado do Turismo acreditam que os últimos dias têm contribuído para a conversão de alguns dos conselheiros que estariam, em teoria, com Rodrigues dos Santos e para o convencimento de muitos indecisos. Para os apoiantes de Adolfo Mesquita Nunes, mesmo o pior dos cenários — uma derrota por números redondos (75/25) — mantém todas as perspetivas de futuro para um eventual congresso.
Ainda assim, ninguém, nem mesmo os mais otimistas apoiantes de Adolfo Mesquita Nunes, ignora o facto de Rodrigues dos Santos ter uma vantagem teórica. Tal como explicava o Observador ainda em outubro, o presidente do CDS tem aproveitado o seu primeiro ano de mandato para reforçar o poder nas distritais e nas concelhias do partido. Nos últimos meses, Rodrigues dos Santos conseguiu conquistar ou reforçar a influência em estruturas como Porto, Coimbra, Aveiro, Santarém, Leiria, Vila Real e Setúbal. Pelo caminho, reativou 70 concelhias que não estavam a funcionar quando chegou à liderança do partido.
Líder do CDS em guerra com a bancada, reforça poder nas estruturas do partido
Este trabalho de formiguinha pode agora dar frutos. Até porque há oito estruturas que não estarão representadas no Conselho Nacional uma vez que as eleições internas foram adiadas em virtude da pandemia. Algumas delas, como a distrital de Braga, de Nuno Melo, estariam com Adolfo Mesquita Nunes, outras com Francisco Rodrigues dos Santos. Mas a ausência destes delegados torna mais preponderante o voto das estruturas controladas pelo líder e pela sua direção.
Espera-se, ainda assim, um Conselho Nacional marcado por muitas polémicas, avanços e recuos. Desde logo: a votação será secreta, como pediu Adolfo Mesquita Nunes, ou nominal, como tem sido até aqui? O secretismo do voto pode inverter a tendência, dar a cara sabendo que há uma dinâmica de voto a crescer pode condicionar. Será discutida a realização de um congresso ou apenas a moção de confiança? Há conselheiros que estão na direção de Rodrigues dos Santos dispostos a votar a favor de um congresso mas que não podem votar contra a moção de confiança porque estarão a votar contra si próprios.
Esta conjugação de fatores e os desenvolvimentos que possam vir a acontecer até sábado podem baralhar todas as contas. Os telefonemas, de resto, não param: quer Francisco Rodrigues dos Santos, quer Adolfo Mesquita Nunes têm ligado pessoalmente aos conselheiros do CDS para os conquistar. Estes, para já, são indefectíveis.
Os cinco do Parlamento
São os cinco rostos mais conhecidos do CDS e estão os cinco contra Francisco Rodrigues dos Santos. Há muito que bancada parlamentar e direção do partido estão de costas voltadas.
Cecília Meireles
A antiga líder parlamentar é há muito um dos alvos a abater por parte dos apoiantes de Rodrigues dos Santos, que nunca se pronunciou contra a Cecília Meireles. Eleita pelo Porto, se porventura deixasse o Parlamento, o líder do CDS teria entrada direta na Assembleia da República. A pressão para a saída de Cecília Meireles acabou por marcar o último Conselho Nacional do Partido, com a deputada a exigir “respeito”.
Telmo Correia
O líder parlamentar tem somado episódios de divergência com Rodrigues dos Santos. O caso da comissão de honra de Luís Filipe Vieira foi um ponto de não retorno na relação entre os dois. Há um mês, aproveitou a reunião do órgão máximo do partido entre congressos para acusar a direção de “hipocrisia” e de alimentar uma guerra com a bancada parlamentar enquanto faz apelos à unidade.
João Almeida
Foi o adversário de Rodrigues dos Santos nas últimas eleições e mantém-se de onde nunca saiu: na barricada oposta. “O partido está muito pior do que estava há um ano. Esta não é a minha liderança, este não é o meu caminho”, disse em dezembro. Tem estado ativamente com Adolfo Mesquita, a multiplicar-se entre contactos para arregimentar tropas.
Ana Rita Bessa
A mais discreta dos cinco, não teve hesitações em pôr-se ao lado de Adolfo Mesquita Nunes assim que o antigo vice-presidente do CDS defendeu, aqui no Observador, a convocação de eleições extraordinárias, alegando que partido está a enfrentar “um momento de crise” e não está a conseguir “criar atração no discurso”.
João Gonçalves Pereira
Líder da poderosa distrital de Lisboa, deputado e vereador, João Gonçalves Pereira tem sido um dos críticos mais vocais de Francisco Rodrigues dos Santos. Ainda em novembro, em entrevista ao Observador, lançou Cecília Meireles como candidata à liderança do CDS por entender que a atual direção estava a falhar. Foi um dos primeiros a pôr-se ao lado de Adolfo Mesquita Nunes e tem ajudado a garantir votos na região de Lisboa.
Os seis autarcas
Nas últimas eleições internas, os seis presidentes de câmara eleitos pelo CDS estiveram ao lado de João Almeida contra Francisco Rodrigues dos Santos. Os seis têm assento no Conselho Nacional e os seis estão fora das contas do atual líder do CDS, que parece convencido de que estes votos cairão para o lado Adolfo Mesquita Nunes.
Víctor Mendes
Dos seis, só o autarca de Ponte de Lima aceitou falar ao Observador. Sem se comprometer com um sentido de voto, Víctor Mendes notou que, por princípio, é “a favor de que os mandatos sejam terminados”. “Mas o partido está em dificuldades e é preciso fazer alguma coisa”, notou. O voto, garantiu, só o anunciará no sábado.
A direção
O líder tem na comissão executiva — órgão mais restrito da comissão política — uma maioria confortável. Quem podia votar contra (Filipe Lobo d’Ávila, Raul Almeida, Isabel Menéres Campos e José Miguel Garcez) demitiram-se antes de poderem contribuir com o voto no Conselho Nacional para o afastamento de Francisco Rodrigues dos Santos. Neste grupo de 14 pessoas, sobram apenas três elementos contra Francisco Rodrigues dos Santos, todos com assento por inerência: Nuno Melo (eurodeputado), Telmo Correia (líder parlamentar) e Rui Barreto (líder CDS-M). Os restantes mantiveram-se firmes e vão votar a favor da moção de confiança ao líder.
Miguel Barbosa
Miguel Barbosa deu nas vistas em 2002 quando era líder da distrital da JP e pediu ao Governo Civil que impedisse qualquer desfile no âmbito da Semana do Orgulho Gay, que estava a ser planeado para o Porto.
Defendia que a sexualidade só devia ser assumida no recato do lar e classificava a homossexualidade como “uma doença que não é normal”. O líder da JP, então João Almeida, criticou-o . Quando chegou à liderança do CDS, o Observador questionou a direção sobre estas declarações, respondeu o próprio Miguel Barbosa a dizer que não comentava “frases descontextualizadas” e “truncadas de forma torpe”. Ao contrário do que aconteceu com Abel Matos Santos, Francisco Rodrigues dos Santos segurou-o. É um dos vice-presidentes e votará a favor da moção.
Francisco Tavares
Secretário-geral de Rodrigues dos Santos na “jota”, secretário-geral no CDS também. É o homem das contas, do terreno. Tal como na JP, controla o aparelho e também a parte financeira do partido. É também porque ele que passam as contas deste conselho nacional, que tem religiosamente num Excel.
Francisco Laplaine Guimarães
O “Guima”, como era conhecido na JP, já era vice-presidente de Francisco Rodrigues dos Santos na estrutura juvenil e transitou para a direção do CDS com o mesmo cargo. É fiel e um dos homens de mão de Francisco Rodrigues dos Santos. Votará a favor da moção.
António Carlos Monteiro
Era apoiante de João Almeida, mas passou para o lado de Francisco Rodrigues dos Santos ainda o corpo estava quente. É visto do lado de Adolfo-ex-Cristas-portistas como um traidor. Já tinha sido secretário-geral do partido, com Portas, mas é um dos vice-presidentes que mais intervém publicamente, logo a seguir a Francisco Rodrigues dos Santos. Vai manter-se fiel ao seu novo lado e votar a favor da moção de confiança.
Sílvio Cervan
Mais um dos recuperados por Francisco Rodrigues dos Santos. Sílvio Cervan andava afastado da política ativa. Chegou a ser deputado entre 1995 e 2001, mas destacou-se mais como comentador desportivo. Acumula as funções de vice-presidente do CDS com as de vice-presidente do Benfica. Discorda na preferência clubística de Francisco Rodrigues dos Santos (que é do Sporting), mas é fiel ao líder. Vai votar a favor da moção de confiança.
Artur Lima
O líder do CDS/Açores, que é um dos protagonistas do Governo regional assente num coligação de direita, é indefectível apoiante de Francisco Rodrigues dos Santos. O também vice-presidente do Governo regional vai votar a favor da moção de confiança.
Cecília Anacoreta Correia
A porta-voz do partido apoia o líder e vai votar a favor da moção de confiança. É mulher do dirigente que vai presidir os trabalhos: Filipe Anacoreta Correia.
Rui Barreto
O líder do CDS/Madeira vai votar a favor de Adolfo Mesquita Nunes. Também ele integra o governo regional, mas — eleito ainda no tempo de Assunção Cristas — está com os mais próximos da anterior direção.
Lídia Brás
A vereadora da câmara municipal de Braga é uma das poucas mulheres na direção de Francisco Rodrigues dos Santos. Vai votar ao lado do líder.
Vogais
Entre os 36 vogais com poder de voto, Francisco Rodrigues dos Santos conta com o apoio de 31. É mais uma vez uma vantagem esmagadora. Ainda não se sabe para onde cairá o voto de Pedro Pestana Bastos (um dos desconhecidos/indecisos contabilizados pelo Observador) e o mesmo acontece com Altino Bessa (não terá lado, mas tenderá a ir contra a moção de confiança). Certo, certo do lado de Adolfo Mesquita Nunes, portanto contra a moção de confiança, está Tiago Oliveira Loureiro.
A inexistência de delegados distritais eleitos em oito estruturas – o que resulta da interrupção de eleições internas por causa da pandemia – é apenas um dos fatores que podem influenciar a votação.
A armada da JP
A Juventude Popular tem direito a indicar 24 conselheiros. Tendo em conta que Francisco Rodrigues dos Santos saiu diretamente da jota para a liderança do CDS é mais do que expectável que grande parte destes delegados estejam com “Chicão” como era conhecido.
Francisco Mota
O líder interino da JP — as eleições foram adiadas — está perfeitamente alinhado com Francisco Rodrigues dos Santos e tudo fará para que a moção de confiança seja aprovada. Dificilmente conseguirá mobilizar os 24, mas terá uma grande força do seu lado.
Os delegados do último Congresso
Tendo em conta que no último congresso a lista ao Conselho Nacional de Francisco Rodrigues dos Santos somou cerca de 51% dos votos é provável que o líder do CDS mantenha uma ligeira vantagem entre estes delegados. Mas Adolfo Mesquita Nunes também tem apoios importantes.
Hélder Amaral
O ex-deputado esteve ao lado de João Almeida na última disputa e tem sido crítico da atual liderança. Ainda há dias lamentou os erros da atual direção. “O meu partido está a morrer”, disse.
Nuno Magalhães
Apoiante de João Almeida nas últimas internas, o antigo líder parlamentar do CDS ficou de fora da Assembleia da República nas últimas legislativas. Está insatisfeito com o rumo que o partido seguiu e ao lado de Mesquita Nunes.
Álvaro Castello-Branco
Antigo deputado e ex-líder da distrital do CDS/Porto é outra das figuras que está ao lado de Mesquita Nunes nesta contenda.
Filipa Correia Pinto
A antiga vereadora na Câmara do Porto e dirigente do partido está com Francisco Rodrigues dos Santos desde o primeiro momento e é um apoio considerado importante pela equipa que está com o líder do CDS.
Gonçalo Alves
O líder da distrital de Vila Real é um dos importantes apoios do presidente democrata-cristão e terá uma palavra a dizer neste Conselho Nacional.
Ricardo Tavares da Silva
O presidente da distrital de Aveiro, que antes era leal a João Almeida, é um dos pesos pesados que está com Francisco Rodrigues dos Santos, até pela relevância política que o distrito tem na história do CDS.
Os delegados eleitos pelas distritais e ilhas
São 79, mas podiam ser muitos mais. Além dos conselheiros eleitos em Congresso, o CDS elege ciclicamente conselheiros diferentes por cada. Há várias distritais que não têm qualquer delegado e isso pode favorecer Francisco Rodrigues dos Santos. Neste grupo de oito, Braga, Guarda, Viana do Castelo e Madeira estariam com Adolfo. Beja, Bragança e Açores, por exemplo, estariam alinhadas com Rodrigues dos Santos, que tem, desde janeiro, vindo a reforçar a sua posição por todo o país.
Aveiro
É uma das estruturas que teve eleições em setembro. Esperava-se que houvesse divisões e que na altura surgisse um candidato do lado dos críticos (Pedro Magalhães, próximo de João Almeida), mas este acabou por não ir a votos e assim só avançou o candidato afeto a Rodrigues dos Santos. Praticamente todos os conselheiros estarão do lado do líder, com sete a oito votos num universo de dez.
Coimbra
Tem seis delegados e o clima é favorável a Francisco Rodrigues dos Santos. Aos seis, soma-se o líder distrital — Jorge Gonçalves de Almeida também está ao lado do líder.
Évora
Quatro delegados também favoráveis ao atual líder. Além destes quatro, o líder distrital Vítor Vicente também deverá votar favoravelmente a moção de confiança.
Leiria
Os delegados (oito no total) são maioritariamente pró-Francisco, numa distrital liderada pela sogra do líder do CDS, Rosa Maria Guerra, que votará pela moção de confiança do genro.
Lisboa
A distrital de Lisboa pende para os críticos de Francisco Rodrigues dos Santos: são quatro delegados anti-líder e há mais seis que indecisos que podem ir contra a liderança. Garantidos, garantidos, para já, do lado de “Chicão” estão, segundo as contas dos apoiantes do presidente, quatro: Lizette Carmo, Pedro Barros Ferreira, Paula Santos Marinho e João Galhofo.
João De Oliveira Martins, Maria LuisaAldim, Miguel Maria Arrobas, Nuno Gonçalves Pereira são contabilizados de ambos os lados como sendo pró-Adolfo.
Porto
No Porto a incerteza é grande. Em meados de outubro, Francisco Rodrigues dos Santos julgou ter reforçado a força no Porto, com 12 conselheiros contra apenas 3 da lista contrária à direção. Problema: muitos eram do grupo de Filipe Lobo d’Ávila, que deixou de ter cofiança no líder e se demitiu. Certa estará Ana Reis, no lado dos que votarão contra a moção de confiança. Quanto aos outros 14, a dúvida para sábado é grande sobre para que lado vão cair.
Setúbal
A maioria dos sete deputados também estará ao lado do líder.
Viseu
A maioria dos sete delegados eleitos por Viseu estará com Adolfo Mesquita Nunes. Miguel Baumgartner, que vai substituir o líder da distrital, também vai votar contra Francisco Rodrigues dos Santos. Saldo: 7-1 para Adolfo Mesquita Nunes em Viseu.
Vila Real
Há ainda uma grande dúvida sobre para que lado cairão os delegados escolhidos por Vila Real.
(Este artigo estará em permanente atualização até ao início do Conselho Nacional no próximo sábado, às 11h00)