Há 123 anos, Alfredo da Silva resolveu partir para a fusão da União Fabril com a Companhia Aliança Fabril, dando origem à Companhia União Fabril, mais conhecida por CUF. Hoje, o grupo da família designa-se por José de Mello, nome do neto de Alfredo da Silva. Mas é já a quarta geração que está a tomar conta do grupo. Salvador de Mello está à frente, desde janeiro de 2021, do grupo José de Mello, que ao nome CUF só associa, em termos de marcas, a área da saúde. A indústria, atividade que viu nascer o grupo, chama-se Bondalti e as residências seniores designam-se por José de Mello Residências. Ainda consolida no grupo José de Mello a participação que resta (17%) da Brisa. Fora deste perímetro, a família está ainda associada aos vinhos da Ravasqueira, à Efacec (14%) e à ATM (50%).

Salvador de Mello passou a presidente executivo do grupo que reúne os seus quatro irmãos, sucedendo a Vasco de Mello que passou a ser chairman. Um ano depois, o que mudou? “Foi um processo de continuidade e não de mudança”, assume Salvador de Mello, num quase inédito encontro com jornalistas para apresentar os resultados do grupo referentes em 2021, ano em que lucrou 58 milhões de euros, já sem consolidar a Brisa nem a mais-valia da venda da participação maioritária que empolaram os resultados de 2020 para mais de 355 milhões de euros.

Efacec? "Não sabemos os contornos da privatização em curso"

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O grupo José de Mello ainda tem uma participação de 14% na Efacec, cuja privatização de 71% (participação que era detida por Isabel dos Santos, mas que foi nacionalizada) está a decorrer. Salvador de Mello diz ainda aguardar o desfecho desta operação para perceber o que vai acontecer à posição da Efacec, que segundo foi realçado pelo Governo quando aceitou a proposta da DST para comprar os 71% será diluída pelo recapitalização que tem de acontecer na empresa da Maia.

“Não sabemos os contornos dessa privatização em curso. O Estado lidera esse processo que levará a um desfecho, espero eu que seja próximo”, dizendo, no entanto, não saber o desfecho.

Salvador de Mello não comenta mais sobre o assunto, nem assume que a diluição do grupo José de Mello na Efacec vá ser total. Também não quis comentar a escolha da DST.

“O grupo existe há mais de 120 anos e não é por acaso que cultivamos o legado com o respeito e admiração pela história e espero que continuemos a fazer a renovação permanente desse legado, com a adaptação aos novos tempos, como o grupo tem feito”. Para o gestor, “mudar por mudar não é aquilo que nos anima”, assumindo: “Sou diferente do meu irmão Vasco, mas também sou parecido com o meu irmão Vasco”.

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Assume a liderança do grupo familiar numa altura de menor aperto financeiro. Vasco de Mello teve de lidar, em tempos, com o peso da dívida que, segundo assume agora Salvador de Mello, “deixou de ser tema”. O endividamento do grupo está nos 998 milhões de euros. Chegou a dever 6,2 mil milhões de euros à banca em 2012. “Temos capacidade para construir o futuro”, com a desalavancagem conseguida mas também, assume o grupo, com a valorização dos ativos. O balanço apresenta um ativo de 2,4 mil milhões de euros. Sem a consolidação da Brisa, o grupo garante já uma faturação superior a mil milhões de euros.

Agora com uma autonomia financeira de 36,1%, o grupo espera que as suas empresas invistam mais de mil milhões de euros até 2030, sendo que nestes valores incluem-se os relacionados com o projeto de hidrogénio da Bondalti que está a candidatar-se ao PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) no âmbito das agendas mobilizadoras. Se não vier o dinheiro do PRR o projeto não fará sentido, assume Salvador de Mello. Nesse investimento total — que o empresário não quis alongar-se nas especificações — está também o hospital de Leiria.

O grupo José de Mello está hoje na área da indústria química e tratamento de águas (uma atividade onde entrou mais recentemente através de aquisições), na saúde e residências seniores, nas concessões de autoestradas e serviços associados. Mas o futuro poderá reservar novos negócios. “Nós temos uma estratégia definida, dependerá das oportunidades que encontrarmos. Não vou desenvolver mais”, mas deixou ainda a ideia de que pode ser fora das áreas onde está mas que tem de corresponder ao propósito de ser em compromisso com Portugal. Sempre “a partir de Portugal”, assume, lembrando o propósito, ainda, de serem áreas com impacto nas pessoas.

E é por isso que aproveita para unir todas as áreas em que o grupo está presente. Todas estão presentes no dia a dia das pessoas. “Temos um legado de excelência, empreendedorismo e talento”.

A folha salarial do grupo tem um total de 7.200 trabalhadores, aos quais se somam cerca de 5.000 prestadores de serviços. “O grupo tem sido capaz de atrair e mobilizar talento. Somos uma escola de talento”, assume o empresário que antes de assumir este papel liderou a área da CUF Saúde.

Aumentar os salários em 20%? Portugal tem um problema de competitividade

“Não é com um decreto que se aumenta os salários”, atira Salvador de Mello, quando questionado sobre as declarações de António Costa de que espera até ao fim da legislatura que o peso dos salários na riqueza nacional passe de 45% para 48%.

António Costa pede às empresas “esforço” coletivo para aumento dos salários

“Temos em Portugal um problema de competitividade sério e o tema tem de ser abordado de forma profunda e só com base num trabalho sério é que vai ser possível resolver o problema dos salários em Portugal”, realça Salvador de Mello que junta a esta questão da competitividade o tema da semana de quatro dias de trabalho. “Não me parece que a semana de quatro dias deva ser prioridade do país”, mas sim “o reforço do crescimento e da competitividade para gerar mais prosperidade”.

E por isso espera que o Governo — que diz ter condições únicas (pelo PRR e pela maioria absoluta) — “tenha coragem para abordar o problema numa lógica de longo prazo. A atração de investimento é absolutamente crítica”. O Governo, conclui o empresário, “tem todas as condições para olhar para o longo prazo e fazer as reformas necessárias para transformar o país. Se o fará ou não… veremos”.