895kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Maria Madalena está na "Última Ceia"? E a Mona Lisa olha sempre para nós? As verdades e as conspirações nas obras de Leonardo da Vinci

As participações em sociedades secretas, os erros científicos e a escrita em espelho. Onde reside a verdade e começa o mito na obra de Leonardo da Vinci: que mensagens escondidas há nos seus quadros?

A mente de Leonardo da Vinci era uma pintura eternamente inacabada. “Para ele, um génio, a infinitude do conhecimento era uma condenação inevitável à imperfeição”, explicou ao Observador o diretor da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, Fernando António Baptista Pereira. “Nunca ia saber o suficiente e isso causou-lhe uma inquietude que se transpareceu no singelo número de quadros que terminou”, acrescenta.

Para os outros, no entanto, a mente de Leonardo era “demasiado labiríntica” para ser completamente compreendida. Da Vinci vivia centenas de anos à frente do seu tempo. Projetou pontes e imaginou objetos voadores que precisaram de quase 500 anos para serem concretizados. E “é da necessidade de entender uma mente destas que nasce o mito”, interpreta o professor universitário.

De acordo com essas teorias, Leonardo da Vinci pertencia ao Priorado de Sião, uma sociedade secreta que protegia a identidade da descendência de Jesus. Sofria de Complexo de Édipo, um desejo amoroso pela mãe. E chegou a entrar nos Illuminati, uma sociedade secreta criada quase 300 anos depois de ele ter morrido.

São teorias que se expandem para lá da vida pessoal de Leonardo da Vinci e que engolem também as obras do italiano renascentista. Para uns, ele disserta sobre o papel que teria nessas sociedades secretas em quadros como Última Ceia. Confessa o desejo retorcido pela mãe em Mona Lisa. E esconde mensagens obscuras em textos ao contrário.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Onde está a verdade e onde é que tudo não passa de uma conspiração? O Observador conversou com especialistas de arte e historiadores, estudou relatórios científicos e procurou a origem das teorias mais famosas da obra de Leonardo da Vinci para apurar os contornos mais turvos do legado do génio do Renascimento. E descobriu mais mentiras do que factos.

Última Ceia

É Madalena, não João, ao lado de Jesus Cristo

Última Ceia, c. 1495-1497. Têmpera sob estuque. 460 x 880 cm. Milão, Santa Maria delle Grazie, Refeitório. Leonardo da Vinci.

A teoria

Às portas das celebrações da Páscoa, altura em que os judeus celebravam a libertação da escravidão no Egito, Jesus Cristo reuniu todos os discípulos e anunciou que seria morto por traição de Judas. Este é o momento bíblico que Leonardo da Vinci retratou em “Última Ceia”, uma pintura de têmpera sob estuque numa das paredes do refeitório do Convento de Santa Maria delle Grazie, em Milão.

Até há cerca de quinze anos não havia grandes dúvidas sobre a identidade dos discípulos retratados na obra. Leonardo da Vinci parecia ter agrupado as doze figuras em quatro grupos de três pessoas — dois grupos à esquerda de Jesus Cristo e outros dois grupos à direita. Seriam eles Bartolomeu, Tiago Menor e André; Judas Iscariotes, São Pedro e João;  Tomé, Tiago Maior e Filipe; e Mateus, Judas Tadeu e Simão Cananeu.

No entanto, após a publicação do romance “O Código da Vinci” do escritor Dan Brown em 2003, uma especulação nasceu em redor de Última Ceia. Segundo esse livro, a figura imediatamente à esquerda de Cristo — na perspetiva de quem observa a obra — não seria João Evangelista, mas antes Maria Madalena.

No entanto, após a publicação do romance "O Código da Vinci" pelo escritor Dan Brown em 2003, uma especulação nasceu em redor de Última Ceia. Segundo esse livro, a figura imediatamente à esquerda de Cristo -- na perspetiva de quem observa a obra -- não seria João Evangelista, mas antes Maria Madalena.

O livro, que mais tarde foi transformada num filme homónimo pela mão do realizador Ron Howard, até apresenta argumentos para sustentar essa conspiração. A teoria sugere que a figura de João parece fisicamente mais feminina do que os outros discípulos por representar efetivamente uma mulher. Essa mulher seria Madalena, com quem Jesus manteria uma relação amorosa. Por isso é que as vestes são opostas: enquanto Jesus veste vermelho com um manto azul, Madalena vestia azul com um manto vermelho — que na época seria um sinal de união pelo matrimónio.

Mas a teoria vai ainda mais longe. Dan Brown especula ainda que a forma triangular no espaço vazio entre Jesus e a figura à sua esquerda dá sustento à conspiração porque o triângulo é um símbolo do sexo feminino, representando o útero. E que se as posições dos dois foram alteradas, de tal forma que a figura passe a estar à direita e encostada a Jesus, os dois parecem abraçar-se.

Essa parte triangular podia ser também o significado do clálice, o Santo Graal que nunca aparece no quadro, apenas copos normais.

E há mais. Filipe, um dos discípulos que aparece na pintura mas cujo evangelho não consta na Bíblia, terá descrito Madalena como “companheira” de Jesus: “E a companheira do Salvador era Maria Madalena. Cristo amou Maria mais do que todos os discípulos, e costumava beijá-la frequentemente na boca. Os demais discípulos ofendiam-se com isso e expressaram o seu descontentamento. Eles disseram: ‘Por que a amas mais do que a nós?’. O Salvador respondeu-lhes: ‘Por que eu não vos amo como a amo’“.

Além desta teoria principal, há ainda outras. A faca na mão de Pedro é um dos pontos mais controversos: afinal, ela parece  sem sentido na obra. Javier Sierra, autor do livro “A Ceia Secreta”, afirma que essa seria uma crítica direta ao papa Alexandre VI, inimigo político do duque de Milão. Nessa visão, Pedro, que foi o primeiro papa, seguraria a faca, representando a traição do papa Alexandre VI contra os valores católicos. A postura de Pedro ainda tem outro ponto polémico. A mão aponta para Jesus com o dedo em riste ameaçador, o que indicaria a vontade de cortar o pescoço do apóstolo João ou o de Maria Madalena. A presença da mulher no grupo incomodaria os outros seguidores, ou poderia ser um ataque a João, o apóstolo mais próximo de Jesus.

A verdade

Tudo indica que era mesmo João Evangelista que estava à mesa da Última Ceia e que as teorias levantadas pelo “O Código da Vinci” não passam de uma ficção romântica. Um dos argumentos que sustentam a identidade dessa figura ao lado de Jesus Cristo à mesa é que há várias passagens bíblicas que fazem referência à presença de João nesse momento, mas nenhuma que sugira a presença de Maria Madalena.

Em Lucas, capítulo 22, versículos sete a 14, por exemplo, pode ler-se o seguinte: “Jesus enviou Pedro e João dizendo: ‘Vão preparar a refeição da Páscoa’. ‘Onde queres que a preparemos?’, perguntaram eles. Ele respondeu: ‘Ao entrarem na cidade, encontrarão um homem carregando um pote de água. Sigam-no até a casa em que ele entrar e digam ao dono da casa: <O Mestre pergunta: Onde é o salão de hóspedes no qual poderei comer a Páscoa com os meus discípulos?>. Ele lhes mostrará uma ampla sala no andar superior, toda mobilada. Façam ali os preparativos’. Eles saíram e encontraram tudo como Jesus lhes tinha dito. Então, prepararam a Páscoa. Quando chegou a hora, Jesus e os seus apóstolos reclinaram-se à mesa”.

O evangelho do próprio João faz referência à ceia que Jesus preparou com os apóstolos. No capítulo 13, versículos 21 a 30, diz a Bíblia: “Depois de dizer isso, Jesus perturbou-se em espírito e declarou: ‘Digo que certamente um de vocês me trairá’. Os seus discípulos olharam uns para os outros, sem saber a quem ele se referia. Um deles, o discípulo a quem Jesus amava, estava reclinado ao lado dele. Simão Pedro fez sinais para esse discípulo, como a dizer: ‘Pergunte-lhe a quem ele se está a referir’. Inclinando-se esse discípulo para Jesus, perguntou-lhe: ‘Senhor, quem é?’. Respondeu Jesus: ‘Aquele a quem eu der este pedaço de pão molhado no prato’. Então, molhando o pedaço de pão, deu-o a Judas Iscariotes, filho de Simão. Tão logo Judas comeu o pão, Satanás entrou nele. ‘O que você está para fazer, faça depressa’, disse-lhe Jesus”.

Ora, a expressão “o discípulo a quem Jesus amava” só aparece no evangelho de João. Surge no momento da Última Ceia, mas também nos relatos sobre a crucificação: “E junto à cruz de Jesus estava sua mãe, e a irmã de sua mãe, Maria mulher de Clopas, e Maria Madalena. Ora, Jesus, vendo ali a sua mãe, e que o discípulo a quem ele amava estava presente, disse à sua mãe: ‘Mulher, eis aí o teu filho’. Depois disse ao discípulo: ‘Eis aí a tua mãe’. E desde aquela hora o discípulo a recebeu em sua casa”.

Em princípio, admite-se que João faz referência a ele mesmo nessas passagens. Há quem argumente que, tendo em conta as palavras de Filipe no evangelho que não entra na Bíblia, “o discípulo a quem Jesus amava” também podia ser Maria Madalena.

Mas essa hipótese enfraquece quando voltamos a ler o evangelho de João, capítulo 20, versículos um a cinco. Nessa passagem, João explica como Jesus foi encontrado na altura da ressurreição: “E no primeiro dia da semana, Maria Madalena foi ao sepulcro de madrugada, sendo ainda escuro, e viu a pedra tirada do sepulcro. Correu, pois, e foi a Simão Pedro e ao outro discípulo a quem Jesus amava, e disse-lhes: ‘Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde o puseram’. Então Pedro saiu com o outro discípulo e foram ao sepulcro. E os dois corriam juntos, mas o outro discípulo correu mais apressadamente do que Pedro e chegou primeiro ao sepulcro. E, abaixando-se, viu no chão os lençóis. Todavia não entrou”.

Ora, Maria Madalena não poderia correr para avisar Simão e a ela própria. Além disso, mesmo que a Bíblia fosse enganadora, isso não significaria por si que Leonardo da Vinci quisesse alinhar nessa conspiração, já que o pintor foi contemporâneo da Inquisição. Colocar em causa qualquer crença ou indicação saída do seio da Igreja Católica seria considerado um crime de heresia, que podia ser punido com a prisão perpétua ou com a execução pública na fogueira ou por enforcamento.

Talvez isso acontecesse por da Vinci ser homossexual, mas não só. Na arte renascentista, era comum pintar homens sem barba e com traços femininos para indicar que eram jovens. Tanto que essa representação de João não surge apenas na obra de da Vinci, mas também em imagens de outras "Últimas Ceias" ao longo da história.

Além do mais, uma análise ao trabalho de Leonardo da Vinci desvenda como o artista italiano costumava desenhar e pintar as figuras masculinas com traços mais associados ao sexo feminino. Talvez isso acontecesse por da Vinci ser homossexual, mas não só. Na arte renascentista, era comum pintar homens sem barba e com traços femininos para indicar que eram jovens. Tanto que essa representação de João não surge apenas na obra de da Vinci, mas também em imagens de outras “Últimas Ceias” ao longo da história.

Mesmo a teoria de que, alterando a posição de suposta Madalena, a figura parece abraçar Jesus Cristo, não contraria a hipótese de essa figura ser mesmo o evangelista João. Ele mesmo escreve, no capítulo 13: “Ora, um de seus discípulos, aquele a quem Jesus amava, estava reclinado no seio de Jesus”. Assumindo, como tudo parece indicar, que João se autointitulava o preferido de Jesus, então faz sentido que os dois parecessem fisicamente mais próximos — uma proximidade que inspirou outras obras de arte de outros artistas.

Mona Lisa

Os olhos fixam o observador onde quer que esteja

Retrato de Lisa del Giocondo (Mona Lisa). 1503-1506 e mais tarde (1510?). Óleo sobre choupo, 77 x 53 cm. Paris, Musée du Louvre, Inv. 799. Leonardo da Vinci

A teoria

O olhar que Leonardo da Vinci pintou no retrato de Mona Lisa, mulher de Francesco del Giocondo, um abastado comerciante florentino de seda — mas que alguns especularam poder ser, na verdade, a mãe do artista ou o próprio mascarado com uma peruca — foi concebido de tal forma que, quem olhar para ele, independentemente do ângulo em que o faça, se sinta constantemente observado pela figura no quadro. É uma ilusão ótica tão famosa (e desconcertante) que até foi batizada em honra desta obra com o nome “efeito Mona Lisa”.

Denis Mandarino, artista plástico e professor de Design nas Faculdades Rio Branco e da Universidade Cruzeiro do Sul, no Brasil, publicou em 2011 uma explicação para essa ilusão. No ensaio “A divisão áurea por detrás do olhar de Mona Lisa”, Denis Mandarino sugere que Leonardo da Vinci “teria usado uma malha geométrica na estrutura do quadro, partindo da simetria dos eixos em comunhão com a proporção áurea”.

A proporção áurea, mais famosa por número de ouro, é um número irracional próximo a 0,618. De acordo com uma explicação da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, “se desenharmos um retângulo cujos lados tenham uma razão entre si igual ao número de ouro, este pode ser dividido num quadrado e noutro retângulo em que este tem, também ele, a razão entre os dois lados igual ao número de ouro”. “Este processo pode ser repetido indefinidamente mantendo-se a razão constante”, conclui a página da universidade.

Agora imagine que dividimos o quadro de Mona Lisa a meio. Se o fizéssemos desenhando uma linha vertical que atravesse a pintura de cima até baixo, essa linha passaria “pelo olho esquerdo de Mona Lisa, tangenciando a íris no lado interno”, descreve Denis Mandarino. Por outro lado, se a dividíssemos com uma linha horizontal que atravesse o quadro da esquerda para a direita, ela passaria no peito de Mona Lisa.

Agora imagine que dividimos o quadro de Mona Lisa a meio. Se o fizéssemos desenhando uma linha vertical que atravesse a pintura de cima até baixo, essa linha passaria "pelo olho esquerdo de Mona Lisa, tangenciando a íris no lado interno", descreve Denis Mandarino. Por outro lado, se a dividíssemos com uma linha horizontal que atravesse o quadro da esquerda para a direita, ela passaria no peito de Mona Lisa.

O quadro de Mona Lisa tem 77 centímetros de altura e 53 centímetros de comprimento. Isso significa que, se essa linha horizontal existisse mesmo, a parte superior do quadro teria 38,5 centímetros de altura. Ora, segundo Denis Mandarino, se multiplicássemos esses 38,5 centímetros pelo número de ouro (0,618) e desenhássemos um reta a essa distância da linha horizontal, a reta cairia mesmo por cima da boca da modelo. E se fizéssemos o mesmo, mas a partir da base superior do quadro, a reta cairia em cima da testa de Mona Lisa.

Até aqui, nenhuma destas linhas parece desvendar qualquer mistério. No entanto, realça o professor brasileiro, se fizermos o mesmo exercício uma terceira vez a partir das novas retas, então o quadro de Mona Lisa parece esconder um segredo: “A terceira divisão áurea envolve os dois traçados anteriores e determina de forma muito aproximada, a altura dos olhos de Mona Lisa”, descreve o professor.

Segundo Denis Mandarino, “o facto de o olho esquerdo estar sobre a linha central contribui para que a modelo pareça estar a olhar para quem a observa”: “Ao traçar-se a divisão áurea da base do quadro é possível ver que a linha passa pelo canto do olho direito da figura, acomodando o olhar da modelo entre a linha divisória central e as divisões áureas da malha geométrica que foi sendo estabelecida”, conclui.

Parecem existir ainda outras mensagens secretas no quadro mais visto do mundo. No olho direito, parece estarão as letras LV, iniciais do nome de Leonardo Da Vinci, enquanto no olho esquerdo, há também símbolos, mas não tão definidos porque se esbateram com o tempo. Serão letras ou números, ligadas a símbolos esotéricos.

A verdade

Dois investigadores da Universidade de Bielefeld, na Alemanha, publicaram um estudo no início do ano que afirmava que o “efeito Mona Lisa” é real. Isto é, confirma-se que, “se a pessoa representada numa imagem olhar diretamente para a câmara ou para o pintor, o espetador interpreta isso como estando a ser observado”. E que essa “perceção dos espetadores é independente da sua posição em relação à imagem”, tal como se afirma acontecer com La Gioconda.

No entanto, ironicamente, o estudo publicado na revista científica  i-Perception diz que esse efeito não se verifica no quadro que lhe dá nome. Os dois investigadores pediram a 24 voluntários para se sentarem à frente de um computador e olharem para umas ampliações da Mona Lisa. “Uma régua simples foi posicionada entre eles e a tela em várias distâncias. Os participantes indicaram onde o olhar de Mona Lisa se cruzava com a régua”, explica o resumo do relatório.

Esse procedimento foi repetido várias vezes para determinar “se as características individuais do rosto de Mona Lisa influenciaram a percepção do olhar dos espectadores”. Os investigadores usaram 15 secções diferentes do retrato, umas mais aproximadas do que outras, e mostraram-nas aleatoriamente em três vezes cada uma. A meio da experiência, a distância dos voluntários ao ecrã também foi alterada.

De acordo com o relatório, “os participantes tiveram a impressão de que o olhar de Mona Lisa estava voltado para o lado direito”: “Mais especificamente, o ângulo do olhar era de 15,4 graus em média. Ela parece olhar por cima do ombro direito do observador. Ou seja, o termo ‘efeito Mona Lisa’ não é senão um equívoco. Ele ilustra o forte desejo de sermos o centro das atenções de outra pessoa, de  ser relevante para alguém”, concluíram os investigadores.

De acordo com o relatório, "os participantes tiveram a impressão de que o olhar de Mona Lisa estava voltado para o lado direito": "Mais especificamente, o ângulo do olhar era de 15,4 graus em média. Ela parece olhar por cima do ombro direito do observador. Ou seja, o termo 'efeito Mona Lisa' não é senão um equívoco. Ele ilustra o forte desejo de sermos o centro das atenções de outra pessoa, de  ser relevante para alguém", concluíram os investigadores.

Segundo explicações Gernot Horstmann, psicólogo neurocognitivo que participou no estado, é um facto que “as pessoas são muito boas a perceber se estão a ser vistas pelos outros”. “As pessoas podem sentir-se como se estivessem a ser observadas a partir de fotografias e pinturas, se a pessoa retratada olhar em frente. Com um olhar ligeiramente lateral, como que para a orelha, isso pode continuar a acontecer. Mas a partir de um ângulo de cinco graus, o efeito começa a desaparecer. É o que acontece com Mona Lisa, que tem um ângulo de 15 graus”, conclui.

Ou seja, tudo não passa de um mito.

Salvator Mundi

Há um erro científico no quadro mais caro do mundo

Circa 1490-1519, oil on panel, 45.4 cm × 65.6 cm (25.8 in × 17.9 in), private collection. (Photo by VCG Wilson/Corbis via Getty Images)

A teoria

Há uma “anomalia intrigante” em Salvator Mundi, uma obra de Leonardo da Vinci redescoberta em 2005 e vendida por um valor recorde de 450 milhões de dólares num leilão da Christie’s em novembro de 2017. No quadro, que mostra Jesus Cristo a fazer um símbolo de bênção com a mão direita e a segurar uma esfera de cristal com a esquerda, Leonardo da Vinci deixou um “lapso incomum ou indisposição” para aplicar princípios científicos.

Um dos primeiros a chamar a atenção para esse detalhe foi Walter Isaacson, antigo editor da revista TIME e ex-diretor executivo do Instituto Aspen e da CNN. Depois de ter escrito as biografias de Henry Kissinger, Benjamin Franklin, Albert Einstein e Steve Jobs, em 2007 debruçou-se sobre a vida de Leonardo da Vinci. E apercebeu-se que, apesar do perfecionismo e rigor científico que o artista costumava aplicar nas suas obras, “tinha falhado a pintar a distorção que ocorreria ao olhar através de um orbe sólido e transparente em objetos que não tocam a esfera”.

Segundo Walter Isaacson, se a pintura estivesse de acordo com as leis científicas, a palma da mão esquerda de Jesus estaria tal como aparece no quadro, mas a imagem dentro da esfera seria uma versão mais reduzida e invertida das vestes e do braço de Jesus. “Os cristais ou vidros sólidos, tenham eles forma esférica ou de lente, produzem imagens aumentadas, invertidas e viradas. Em vez disso, Leonardo pintou a esfera como se fosse uma bolha oca de vidro que não refrata nem distorce a luz que passa por ela”, concretiza o escritor.

"Os cristais ou vidros sólidos, tenham eles forma esférica ou de lente, produzem imagens aumentadas, invertidas e viradas. Em vez disso, Leonardo pintou a esfera como se fosse uma bolha oca de vidro que não refrata nem distorce a luz que passa por ela", concretiza o escritor.

Como Leonardo da Vinci era um obcecado pelo perfecionismo e um grande estudioso das luzes, das sombras e da ótica, este detalhe foi o suficiente para colocar em causa a autoria do quadro — que foi atribuído ao pintor renascentista em 2011 por Luke Syson quando era curador da National Gallery.

Frank Zöllner, por exemplo, um académico da Universidade de Leipzig especializado no trabalho de Leonardo da Vinci, sugeriu em 2013 que Salvator Mundi pode não ter saído inteiramente da mão do pintor, mas antes de um seguidor. Até Michael Daley, um investigador de arte e diretor do ArtWatch UK, sublinhou que “não há provas suficientes para afirmar que este quadro é um Leonardo”.

A verdade

As esferas de vidro como a que Jesus Cristo aparece a segurar na mão esquerda comportam-se como lentes convergentes, também chamas de lentes convexas. Quando a luz incide nessas esferas, os raios sofrem um fenómeno chamado refração — são “dobrados” e desviados porque viajam mais devagar no vidro (assim como na água, por exemplo) do que no ar. No caso das esferas e das lentes convergentes, os raios convergem, cruzam-se num ponto e seguem viagem.

Imagine que está a olhar para uma pessoa que está de pé à sua frente. O que vai acontecer é que, se colocar a esfera de vidro à frente dos olhos, a pessoa vai parecer estar de cabeça para baixo. É assim exatamente por causa da refração: os raios de luz refletidos da cabeça da pessoa são desviados para baixo, passam pelo ponto focal e seguem viagem — por isso, quando chegam até si, estão na parte de baixo da imagem. E os raios refletidos dos pés da pessoa desviam-se para si, também passam pelo ponto focal e continuam — sendo assim, surgem na parte de cima da imagem.

Em conclusão, há mesmo um erro científico em Salvator Mundi. As vestes de Jesus Cristo deviam aparecer ao contrário.

Mas o que é realmente estranho é que Leonardo da Vinci não tenha tido isso em conta nos quadros — ele que saberia de tudo isto, visto que dedicou muito tempo a estudar o comportamento da luz através de um ramo da física chamado Ótica. Walter Isaacson, o biógrafo que levantou as dúvidas, diz que há três justificações em cima da mesa: ou o pintor decidiu não incluir essa informação científica para não ser “um fator de distração” na obra; ou porque o erro servia precisamente para retratar “um milagre nas mãos de Cristo”; ou Salvator Mundi nem sequer é uma peça de Leonardo da Vinci.

"Mas eu prefiro uma terceira explicação", acrescenta: "Eu acho que ele sabia como o orbe iria distorcer a imagem e que alguns dos espetadores mais sofisticados também saberiam, mas o que ele está a fazer no retrato de Cristo como salvador do mundo é tentar transmitir a miraculosa qualidade da sua mordomia. Que nada que ele toca é distorcido".

Essa última teoria é a defendida por Michael Daley, o mesmo estudioso que sublinha que não há provas suficientes para dizer com 100% de certeza que Salvator Mundi foi pintado por Leonardo da Vinci: “A evolução figurativa [do pintor renascentista] foi em direção a um maior naturalismo e complexidade de postura. Cabeças a mexerem, ombros a virarem, com reviravoltas e movimentos. O Salvator Mundi é um plano morto, como um ícone, sem profundidade real. E a figura em si é cortada de forma acentuada e pouco comum”, apontou.

A Christie’s, que leiloou o quadro, desvaloriza esses aspetos. “As pinturas de Leonardo são conhecidas por seu mistério e ambiguidade. Ele estava intimamente familiarizado com o tecnicismo e as qualidades da ótica e da luz. Se ele tivesse recriado a imagem com exatidão ótica, o fundo teria sido distorcido. É nossa opinião que ele optou por não retratá-lo dessa maneira porque seria muito perturbador para o assunto da pintura”, argumentou a empresa.

Walter Isaacson também aposta nas outras duas opções. Num texto publicado no The Washington Post por altura do leilão, o biógrafo defendeu: “Outra explicação, mais plausível, é que ele  [Leonardo] sabia que o orbe iria distorcer a imagem, mas optou por não pintar dessa maneira porque achava que seria uma distração. De facto, teria parecido estranho”.

“Mas eu prefiro uma terceira explicação”, acrescenta: “Eu acho que ele sabia como o orbe iria distorcer a imagem e que alguns dos espetadores mais sofisticados também saberiam, mas o que ele está a fazer no retrato de Cristo como salvador do mundo é tentar transmitir a miraculosa qualidade da sua mordomia. Que nada que ele toca é distorcido”.

Homem Vitruviano

Os textos ao avesso escondem mensagens secretas

As Proporções do Corpo Humano (segundo Vitrúvio), c. 1490. Pena e tinta sobre ponta metálica. 344 x 245 mm. Veneza, Gallerie dell’Accademia. Inv. 228. Leonardo da Vinci

A teoria

Nos apontamentos que fazia nos desenhos anatómicos e estudos que antecipavam as pinturas, Leonardo da Vinci escrevia da direita para a esquerda de tal modo que, para perceber a mensagem no texto, era preciso refletir o manuscrito num espelho. Por exemplo, a frase “Leonardo da Vinci morreu há 500 anos” seria escrita assim: “sona 005 ah uerrom icniV ad odranoeL”. Há quem especule que esse hábito do artista servia para esconder segredos para que não estivessem ao alcance dos rivais, até porque era habitual as grandes descobertas serem encriptadas naquele tempo.

Isso mesmo é explorado por Frank Zöllner no livro “Leonardo da Vinci – Desenhos e Esboços”, editado pela Taschen: “Durante séculos, o hábito de Leonardo de praticar a escrita invertida, ou seja, de escrever da direita para a esquerda, confere ao seu legado uma áurea de mistério, tendo tal particularidade sempre levado a pensar que Leonardo criptou voluntariamente os seus textos para que os espíritos não autorizados não pudessem aceder aos seus escritos e às suas invenções”.

O mito foi ainda mais adensado com o lançamento do livro e do filme “O Código da Vinci”, quando os protagonistas entram em contacto com um criptex, um intrumento alegadamente inventado por Leonardo da Vinci que funciona como um cofre. Quem soubesse a combinação que abriria o criptex podia saber a localização do Santo Graal, o cálice usado por Jesus na Última Ceia e que José de Arimateia terá usado para recolher o sangue de Cristo durante a crucificação. Quem forçasse a abertura do criptex iria destruir o papiro com essa informação porque um líquido avinagrado o arruinaria.

Por exemplo, a frase "Leonardo da Vinci morreu há 500 anos" seria escrita assim: "sona 005 ah uerrom icniV ad odranoeL". Há quem especule que esse hábito do artista servia para esconder segredos para que não estivessem ao alcance dos rivais, até porque era habitual as grandes descobertas serem encriptadas naquele tempo.

Ora, no romance de Dan Brown levado ao cinema pelo realizador Ron Howard, o criptex estaria guardado numa caixa de pau-preto com uma inscrição invertida, tal como Leonardo da Vinci costumava escrever nos manuscritos. O escritor teorizou que essa forma de escrita tinha sido adotada por Leonardo da Vinci para “evitar que os outros lhe espreitassem por cima dos ombros e roubassem as ideias dele”.

Mas essa não é apenas uma teoria saídas dos romances como “O Código da Vinci”. Michael White, o escritor que em 2000 publicou o livro “Leonardo, o Primeiro Cientista”, afirmou numa biografia do artista que da Vinci “empregava códigos e cifras regularmente para disfarçar melhor as ideias”. Terá havido até uma vez em que Leonardo da Vinci, temendo que dois assistentes alemães o andassem a espiar, começou a escrever não só em espelho, mas de forma “altamente codificada”.

A historiadora de arte Carmen Bambach sugere o mesmo no livro “Leonardo Da Vinci Master Draftsman”, de 2003: “Em circunstâncias muito específicos, o Leonardo inventava códigos de escrita, como aconteceu no chamado memorando de Ligny de 1499, que apontava a viagem do artista até Roma”. Esses códigos seriam baseados em “rebus [usar imagens em vez de palavras] lúdicos e pictografias criativas.

Ainda mais cedo, em 1965, Iris Noble, escritora e jornalista que desenvolveu uma biografia de Leonardo da Vinci para adolescentes, tinha afirmado que o tratado anatómico “De Figura Umana” que o artista tinha desenvolvido estava repleto de textos escritos ao contrário porque “ele sabia muito bem que os tempos teriam de mudar antes que o livro fosse publicado”. Era “demasiado perigoso” que a informação fosse de fácil compreensão já que todos aqueles conhecimentos tinham sido obtidos depois de Leonardo da Vinci ter dissecado cadáveres.

A verdade

A teoria de que Leonardo da Vinci escrevia ao contrário para esconder algum tipo de segredo — algo que seria necessário se pertencesse mesmo a sociedades secretas como o Priorado de Sião, como chega a ser sugerido em “O Código da Vinci” — pode ser mais rebuscada que a realidade. O mais certo é que a “escrita em espelho” servisse apenas para evitar que a tinta borrasse o papel e os esboços. É que Leonardo era canhoto e escrever ao contrário parecia-lhe mais natural.

Isso mesmo é sublinhado por Frank Zöllner: “As razões do emprego da escrita invertida seriam antes de mais de ordem prática. No sentido normal da escrita, um canhoto que escreva com pena arrisca-se de facto a macular a folha ao passar sobre a tinta ainda húmida”. Mais: “Leonardo nunca fez qualquer mistério das particularidades da sua escrita e as fontes antigas indicam com frequência que os seus escritos se leem com facilidade com o auxílio de um espelho”.

Algumas pessoas escrevem da esquerda para a direita e em espelho como consequência de uma lesão cerebral, explicam Robert D. McIntosh e Sergio Della Sala, dois neurocientistas da Sociedade Psicológica Britânica: “A escrita em espelho é comum entre crianças que estão a aprender a escrever. E é observada em adultos que sofrem danos cerebrais, geralmente no hemisfério esquerdo”.

No entanto, esse não parece ser o caso de Leonardo da Vinci. Tudo indica que ele escrevia em espelho não como consequência de um problema cerebral, mas sim deliberadamente. É mesmo verdade que Leonardo da Vinci escondia mensagens nos seus manuscritos, mas não através da escrita em espelho. Quando tinha algo a encriptar, o pintor inventava línguas e letras próprias ou imagens que substituíssem as frases, como confirma Carmen Bambach.

Só que a escrita em espelho era mesmo mais prática para Leonardo da Vinci: “As investigações científicas, novas e antigas, parecem sugerir que, para os canhotos, a escrita em espelho pode surgir com mais facilidade do que a escrita convencional da esquerda para a direita. A mão mexe-se com menos esforço e, estando os dedos à frente da escrita, a mão não borra a tinta”, concretiza a historiadora de arte num catálogo do Museu Metropolitano de Arte.

Além disso, há crenças de que Leonardo da Vinci sofria de dislexia. E isso pode ser parte da resposta para a peculiar forma de escrever do artista: “As escrituras fluentes e expostas de Leonardo, o sentido elegantemente estruturado, a sua quantidade copiosa, e particularmente o atrativo estilo de caligrafia nas suas primeiras notas indicam vagamente uma pessoa a sofrer de dislexia“, desvenda o catálogo.

Mas então, o que está escrito nos textos ao contrário de Leonardo da Vinci no Homem Vitruviano?

Só que a escrita em espelho era mesmo mais prática para Leonardo da Vinci: "As investigações científicas, novas e antigas, parecem sugerir que, para os canhotos, a escrita em espelho pode surgir com mais facilidade do que a escrita convencional da esquerda para a direita. A mão mexe-se com menos esforço e, estando os dedos à frente da escrita, a mão não borra a tinta", concretiza a historiadora de arte num catálogo do Museu Metropolitano de Arte.

A parte de cima diz: “Vitrúvio, o arquiteto, diz no seu trabalho de arquitetura que as medidas do corpo humano estão distribuídas na Natureza como de seguida. Que quatro dedos perfazem um palmo e que quatro palmos perfazem um pé, seis palmos são um cúbito, quatro cúbitos são a altura de um homem. E quatro cúbitos perfazem um passo e 24 palmos fazem um homem. E estas medidas ele usou nas suas construções. Se abrirmos as pernas tanto que diminuamos a nossa altura em 1/14 e abrirmos e levantarmos os braços até que o dedo do meio toque o nível do topo da cabeça, fique a saber que o centro dos membros abertos vão estar no umbigo e que o espaço entre as pernas vai ser um triângulo equilátero”.

A parte de baixo do texto diz: “O comprimento dos braços estendidos é igual à altura de um homem. Da linha do cabelo até o fundo do queixo é um décimo da altura de um homem. De baixo do queixo até o topo da cabeça é um oitavo da altura de um homem. De cima do peito até o topo da cabeça é um sexto da altura de um homem. De cima do peito até a linha do cabelo é um sétimo da altura de um homem”.

E prossegue: “A largura máxima dos ombros é um quarto da altura de um homem. Dos seios até o topo da cabeça é um quarto da altura de um homem. A distância do cotovelo até à ponta da mão é de um quarto da altura de um homem. A distância do cotovelo até a axila é um oitavo da altura de um homem. O comprimento da mão é um décimo da altura de um homem. A base do pénis está na metade da altura de um homem. O pé é um sétimo da altura de um homem. De debaixo do pé até abaixo do joelho há um quarto da altura de um homem. De baixo do joelho até à do pénis é um quarto da altura de um homem. As distâncias abaixo do queixo até ao nariz e das sobrancelhas à linha do cabelo são iguais às das orelhas e a um terço do rosto”.

A Adoração dos Magos

Esconde o primeiro auto-retrato de Leonardo

A Adoração dos Magos. c. 1481-1482. Óleo sobre madeira. 246,4 × 243,8 cm. Galleria degli Uffizi, Florença, Itália. Leonardo da Vinci.

A teoria

Pouco depois de nascer, Jesus e a mãe, Virgem Maria, foram visitados pelos Reis Magos e por uma multidão de populares. Esse é o momento bíblico que inspirou A Adoração dos Magos, uma obra iniciada por Leonardo da Vinci em 1481 a pedido dos monges da Igreja de São Donato de Scopeto em Florença, mas deixada em aguadas de tinta quando o artista partiu para Milão. Neste momento, a obra, um óleo sobre madeira, está na Galleria degli Uffizi em Itália.

Ora, A Adoração dos Magos parece estar recheada de detalhes que o jovem Leonardo deixou no quadro inacabada, mas que já adivinham a preocupação do artista com os jogos de luz e de sombra, a ilusão da profundidade e perspetiva, o domínio da anatomia humana e as influências de Rogier van der Weyden. Por exemplo, as ruínas do prédio que umas figuras parecem reerguer no fundo podem ser uma referência à Basílica de Maxêncio, que embora tenha sido erguida muito depois do nascimento de Jesus, algumas lendas insistem que foi destruída no dia em que o Messias nasceu.

Embora todos esses simbolismos ainda levantem dúvidas, há uma teoria que está ainda mais envolta em interrogações. Diz-se que Leonardo da Vinci se autorretratou no lado direito da pintura enquanto um jovem de 30 anos com longos cabelos. Angelo Paratico, escritor e investigador da vida de Leonardo, refere-se a essa teoria quando explora a hipótese de Mona Lisa ser Caterina, a mãe do pintor.

A palmeira que aparece na pintura também pode ser um simbolismo para a Virgem Maria, já que os  Cânticos de Salomão, um dos livros do Antigo Testamento, chegam a referir-se à mãe de Jesus no versículo: “Teu porte assemelha-se ao da palmeira, de que teus dois seios são os cachos”. A outra árvore é uma alfarrobeira, cujas sementes eram usadas como unidades de medida para jóias.

Embora todos esses simbolismos ainda levantem dúvidas, há uma teoria que está ainda mais envolta em interrogações. Diz-se que Leonardo da Vinci se autorretratou no lado direito da pintura enquanto um jovem de 30 anos com longos cabelos. Angelo Paratico, escritor e investigador da vida de Leonardo, refere-se a essa teoria quando explora a hipótese de Mona Lisa ser Caterina, a mãe do pintor.

A verdade

É possível que Leonardo da Vinci esteja mesmo autorretratado neste quadro. Anónimo Gaddiano, um autor nunca identificado que escreveu um manuscrito com apontamentos biográficos de artistas italianos — inclusivamente de Leonardo — chega a descrevê-lo no Codice Magliabechiano, guardado na Biblioteca Nacional Central de Floreça: “Tinha uns belos cabelos encaracolados, muito bem arranjados, que lhe davam até meio do peito”. É, de facto, uma figura com essas características que surge em A Adoração dos Magos.

A suportar esta teoria está o facto de este ser a primeira grande encomenda de Leonardo da Vinci, um jovem que nesta época ainda dependia das cunhas do pai para ser notado. A Adoração dos Magos foi pedida em março de 1481 pelo mesmo convento onde o pai do pintor era intendente. O contrato entre Leonardo e o contratatador dizia: “Leonardo, filho de Ser Piero da Vinci, inimou em março de 1480 [o ano está errado no documento] a pintura de um retábulo para o nosso alta-mor, que ele se compromete a completar no prazo de 24 meses, o mais tardar em 30 meses. No caso de o trabalho não estar completado neste prazo, ficará nossa pertença e poderemos dispor dele como nos aprouver”.

"Tinha uns belos cabelos encaracolados, muito bem arranjados, que lhe davam até meio do peito". É, de facto, uma figura com essas características que surge em A Adoração dos Magos.

Mas o rasto que levou até à ideia de que Leonardo da Vinci se desenhou neste quadro começa com Sigmund Freud e outra obra: Mona Lisa. É que Sigmund Freud foi o primeiro a sugerir que a Mona Lisa, no Museu do Louvre, em Paris, retrata Caterina, a mãe do pintor. Num ensaio publicado em 1911, o psicanalista argumenta que a paisagem no fundo de Mona Lisa tem um aspeto oriental e que, naquele tempo, as chinesas escravas eram descritas como tendo olhos encovados sem sobrancelhas — tal como Lisa de Giocondo foi pintada por da Vinci.

Tal como Mona Lisa, há um outro quadro protegido por vidro anti-balas. É o Ginevra de’Benci, na Galeria Nacional de Arte em Washington: “A imagem é conhecida como a Senhora de Lichtenstein, mas por uma série de razões essa sombria e sofrida senhora olhando para nós não pode ser a Ginevra de 18 anos, então uma reconhecida beleza em Florença. Os traços faciais dessa senhora parecem muito semelhantes aos do único autorretrato definido de Leonardo da Vinci — o da Adoração dos Magos”.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.