Foi mais ou menos como olhar ao microscópio para tantas pessoas quantas as da população do Vaticano. A quatro dias no início oficial do Campeonato Mundial de Futebol a Rússia de Vladimir Putin — que é tão grande que a distância entre a cidade mais a este (Kaliningrado) e a cidade mais a oeste (Ecaterimburgo) a receber jogos é a mesma que separa Moscovo de Londres (2.424 quilómetros) — recebeu 736 jogadores com as camisolas das 32 seleções apuaradas.

Todos vão tentar a partir de quinta-feira uma só missão: levar para o país que representam o título de campeão mundial. Se os portugueses só regressam a território nacional a 16 de julho, igualando uma promessa que Fernando Santos fez (e cumpriu) em 2016,  ainda estamos longe de saber. Mas consegui-lo seria um feito histórico: Portugal tornar-se-ia na quarta seleção da história a vencer o Campeonato da Europa e o Campeonato do Mundo de forma consecutiva. Antes de nós, só a Alemanha, a França e a Espanha é que conquistaram a dobradinha: os alemães conquistaram o Euro 72 e o Mundial 74, os franceses fizeram-no no Mundial 98 e no Euro 2000 e os espanhóis ganharam o Euro 2008, o Mundial 2010 e ainda o Euro 2012.

O Mundial 2018 em solo russo traz grandes expetativas para os portugueses, mas há outros países igualmente entusiasmados com o evento desportivo que consegue pôr 46% de toda a população mundial de olhos postos na bola que foi inspirada na que rolou no Mundial de 1970 no México.

Mas há mais números para conhecer: dos 32 países em competição, há duas seleções estreantes: o Panamá e a Islândia. Os panamenhos ficaram tão contentes com o apuramento que o presidente da República declarou o dia 11 de outubro — o dia em que a seleção se qualificou pela primeira vez para um Mundial — feriado nacional já a partir deste ano. Além do Panamá, a Islândia também tem toda a fé do mundo na equipa que escolheu: embora este seja o país com menos habitantes que alguma vez competiu num Mundial (há apenas 334 mil islandeses), 20% da população da Islândia tem bilhete para assistir a pelo menos um jogo da seleção no Mundial da Rússia, ou seja 66 mil adeptos vão novamente torcer daquela forma única que já fizeram no Euro 2016 pela sua seleção. Mas a matemática não ajuda à festa, visto que a última seleção estreante a ir além da fase de grupos foi a Eslováquia em 2010, no Mundial da África do Sul.

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Apesar de tudo, Portugal tem alguns dados estatísticos do seu lado: em primeiro lugar, todos os campeonatos do mundo foram conquistados por seleções cujos treinadores eram da mesma nacionalidade da equipa; e em segundo lugar porque a Espanha, que é o principal adversário de Portugal no seu grupo (as outras equipas são o Irão e Marrocos), tem alguns azares futebolísticos no currículo: nos dois últimos Campeonatos do Mundo, as seleções campeãs em título foram eliminadas logo na fase de grupos: a Itália em 2010 e a Espanha em 2014.

Até a própria biologia pode ajudar à festa portuguesa: lembra-se da praga de traças que assolou o estádio na final do Euro 2016 em França, de onde Portugal saiu campeão da Europa frente aos anfitriões? Ora, o Ministério da Agricultura russo alertou para uma possível praga de gafanhotos em algumas regiões do país durante o período em que o Mundial decorre.

Com o título de campeões do mundo na mão ou não, a Federação Portuguesa de Futebol já está a ganhar só pelo facto de a nossa seleção pisar o relvado do Estádio Fisht na próxima sexta-feira às 19 horas: cada participante no Mundial ganha oito milhões de euros. Este valor, assim como os prémios dados aos vencedores, serão superiores aos entregues no Mundial do Brasil: este ano, serão 35 milhões de euros para o vencedor e 25 milhões de euros para o segundo classificado. Mesmo assim, a maior relíquia de todas não é dada aos campeões: é que o país vencedor do campeonato do mundo fica apenas com uma réplica do troféu. A FIFA fica com o verdadeiro e só os chefes de Estado e os jogadores vencedores estão autorizados a tocar na taça real. Aliás, em 2038, este troféu real deixará de ter espaço para gravar o nome das seleções vencedoras e um segundo terá de ser fabricado.

Mas nem só de vencedores se fazem as curiosidades deste Mundial: os perdedores também fazem histórias, a começar logo pela seleção do país anfitrião. O jogo de abertura do Mundial 2018 é entre as duas seleções com pior classificação no ranking da FIFA: a Arábia Saudita está na 67.ª posição e a Rússia na 70.ª. A partida não promete futebol espetáculo, mas até entre as seleções mais apreciadas a derrota é mal vista: em 1958, quando a Alemanha e a Suécia se defrontaram, os suecos venceram por 3-1. No dia seguinte, a grande maioria dos pneus de carros suecos em Hamburgo foram cortados e um prato tradicional sueco, muito popular na Alemanha, foi eliminado dos menus de grande parte dos restaurantes alemães. Sessenta anos depois, as coisas tornam-se tensas mais uma vez entre os dois clubes: a Alemanha e a Suécia estão no mesmo grupo neste Mundial.

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Também há curiosidades a reter entre os jogadores: Essam Kamal Tawfik El-Hadary, o guarda-redes do Egito, que atua no Al-Taawoun da Arábia Saudita, é o futebolista mais velho de todos: nasceu a 15 de janeiro de 1973, por isso tem 45 anos e cinco meses. A diferença entre ele e o segundo mais velho ainda é grande: Rafa Márquez, que é também o jogador com mais presenças em fases finais (já lá esteve cinco vezes), tem 39 anos e quatro meses. Além do título de veterano, El-Hadary acumula ainda o rótulo de jogador com mais internacializações: já lá vão 158.

Em questões de idade, o selecionador uruguaio também se demarca dos restantes: Óscar Washington Tabárez Silva é o selecionador uruguaio há mais de uma década, tem 71 anos completados a 3 de março e é também o treinador que mais jogos comandou à frente duma seleção nacional: 173.

Do outro lado da tabela etária dos futebolista está Daniel Arzani, o australiano que joga no Melbourne City e que nasceu a 4 de janeiro de 1999 no Irão. Tem 19 anos e cinco meses, o que faz dele o atleta mais jovem entre os 736 convocados para a Rússia. A diferença entre ele e os restantes atletas no pódio não é muito grande: Kylian Mbappé, que joga pela França, tem 19 anos e seis meses e Francis Uzoho, da Nigéria, tem 19 anos e oito meses.

Entre os selecionadores, o “caçula” do grupo é Aliou Cissé, treinador senegalês que já vestiu as camisolas do Birmingham City, Crystal Palace e Portsmouth. É o mais novo de todos os treinadores: tem 42 anos completados a 24 de março.

Com as idades arrumadas, vamos falar de tamanhos: Lovre Kalinić, o guarda-redes croata que defende o KAA Gent, além de ser um dos mais pesados — esse título pertence ao panamenho Román Torres Morcillo e aos seus quase 100 kg — , é o mais alto de todos: tem dois metros e um centímetro de altura. Mas é só um pouquinho mais alto que Jannik Vestergaard da Dinamarca, que tem dois metros certinhos. São valores contrastantes com os que estão no fundo desta régua: Alberto Abdiel Quintero Medina do Panamá, Xherdan Shaqiri da Suíça e Yahya Sulaiman Ali Al-Shehri da Arábia Saudita têm apenas 1, 65 metros. Este último também é um dos mais leves, porque pesa 60 kg, mas o peso pluma do Mundial é Takashi Inui, o futebolista japonês do Betis, que tem 1,69 metros e apenas 59 kg.

De resto, há valores a decorar porque podem ser batidos já este ano. Thomas Müller é o futebolista que mais alegrias deu à seleção que representa: já marcou 10 golos com a camisola da Alemanha em mundiais e curiosamente também é aquele que mais assistências fez: há seis golos alemães em campeonatos do Mundo que se concretizaram com uma ajudinha de Muller. Menos eficaz é o avançado mexicano Javier Ignacio Aquino Carmona, porque foi o que mais oportunidades teve para marcar sem nunca o fazer: não há um único golo dele nos 53 jogos em que esteve em campo.

Na história dos mundiais há ainda um outro recorde por bater: o golo que Hakan Sukur marcou aos 10 segundos e 89 centésimos do jogo entre a Turquia e a Coreia do Sul no campeonato de 2002. É o golo mais rápido do mundo, em contraste com o que saiu dos pés do italiano Alessandro del Piero: o golo mais tardio chegou aos 121 minutos da partida entre Itália e Alemanha do Mundial 2006, e onde os italianos saíram vencedores por 2-0 e chegaram à final, onde bateram a França nos penáltis. Extraordinário, sim, mas modesto se comparado com o memorável jogo entre a Áustria e a Suíça, país anfitrião do Mundial de 1954. A Áustria marcou sete golos e a Suíça marcou cinco. Foi este o jogo que mais fez mexer o contador.

E por falar em valores, falemos agora de cifrões. E esqueça Cristiano Ronaldo, Neymar ou Messi: o jogador mais valioso de todos é o inglês Harry Kane, que está avaliado em 201,2 milhões de euros. Aliás, Inglaterra tem muitos lugares cativos neste Mundial: tem a equipa mais ‘caseira’ porque todos os jogadores atuam em clubes da liga do país (a Arábia Saudita chega lá perto, mas tem três emprestados a clubes espanhóis). Também é inglesa a liga mais representada no campeonato graças aos 124 jogadores convocados para o Mundial que atuam em clubes da Premier League — 16 dos quais vêm do Manchester City.

Ainda assim, enquanto seleção, a Inglaterra é ultrapassada pela França em muitos cifrões: a seleção de Pogba, Mbappé e Griezmann vale 1.410 milhões de euros se somarmos os valores estimados para cada um dos jogadores da  equipa.

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As contas estão feitas, as histórias estão contadas e as curiosidades estão enumeradas. O Mundial de 2018 está prestes a arrancar e a contagem decrescente já começou: agora é confiar nas estatísticas históricas e torcer o nariz às probabilidades que nos dão poucas hipóteses de vitória frente à Espanha.