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Por dia, os lisboetas produzem 900 toneladas de lixo, segundo o presidente da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas. E agora, durante dois dias — os que se seguem ao Natal —, os funcionários com a função de recolher estes resíduos vão fazer greve. O social-democrata já antecipou que a situação, por causa desta iniciativa organizada pelo Sindicato dos Trabalhadores do Município de Lisboa (STML), será “caótica”, daí ter requisitado serviços mínimos (entretanto decretados).

Moedas tem apelado aos sindicalistas que se sentem à mesa de negociações para chegar a um acordo, mas os trabalhadores da higiene urbana da capital — que alegam ter feito vários alertas nos últimos meses — têm outra versão: dizem que se reuniram com o executivo, mas não foram ouvidos. Exigem o cumprimento do acordo assinado em junho de 2023 (que prevê a melhoria das condições de trabalho) e querem agora também que esta profissão seja reconhecida como sendo de desgaste rápido e a atualização do suplemento de insalubridade e penosidade.

Em que dias haverá greve?

Os trabalhadores da higiene urbana de Lisboa vão fazer greve nos dias 26 e 27 de dezembro. No dia de Natal (25) vão fazer greve apenas às horas extraordinárias, modelo que se vai repetir no último dia do ano (31).

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Já em 2025 estes trabalhadores municipais vão parar apenas durante o período da noite (entre as 22h de dia 1 de janeiro e as 6h de dia 2), fazendo greve ao trabalho normal e suplementar.

Em declarações ao Observador, o dirigente Luís Dias admitiu que as datas escolhidas “são datas em que o impacto e visibilidade — que estes trabalhadores não têm durante o ano — têm mais força”. “Greves no Natal e nos Santos Populares são ações de luta que já aconteceram noutras situações. Não é um drama, falamos de dois dias, é só um alerta que vai causar um impacto maior. Estes trabalhadores são esquecidos ao longo do ano e agora vão mostrar que estão cá e querem respostas”, acrescentou.

O que está em causa?

Desde, pelo menos, maio de 2022 que os trabalhadores da higiene urbana de Lisboa têm protestado, garante Luís Dias ao Observador, acrescentando que na base está o facto de o executivo de Carlos Moedas não dar respostas aos problemas que afetam este setor. “Estes problemas têm já entre dois e dois anos e meio. No verão passado houve uma greve parcial que acabou por ser suspensa e daí decorre o acordo assinado na época e que agora dizemos não estar a ser cumprido”, conta. E é aqui que tudo começa.

No acordo assinado em junho de 2023 constavam medidas como a melhoria das condições das estruturas destes trabalhadores. Atualmente, há “oito instalações de higiene urbana e é o espaço onde se come e onde se está”, diz o sindicalista. “No acordo ficou consensualizado que, até dezembro de 2023, todos os espaços estariam abertos a toda a hora. Agora, só há duas instalações com estes espaços a funcionar e só à noite.”

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Além disto, num dos espaços “há um problema elétrico que ainda não está resolvido e os trabalhadores não podem tomar banho porque não há água quente. Ou então tomam banho com água fria, mas agora no inverno…”

No documento estava também definido um “investimento em meios materiais e viaturas”, porque, segundo o sindicato, “45,2% das viaturas essenciais à remoção encontram-se inoperacionais” e “22,6% da força de trabalho está diminuída fisicamente ou de baixa”, levando a que “todas as semanas fiquem por fazer inúmeros circuitos”.

No acordo decretava-se também o fim dos “castigos informais” (que segundo Luís Dias consistem em castigos verbais atribuídos quando os trabalhadores, por algum motivo, não podem cumprir horas extraordinárias), assim como o aumento do número de trabalhadores (pondo fim à sua canalização para outras funções). E ficou ainda determinado que seria respeitado “que um trabalhador, quando tem um acidente de trabalho, só volte quando estiver totalmente apto, algo que não acontece”.

O sindicado garante que Carlos Moedas “diz que 80% do acordo foi cumprido” e que isso “não é verdade”. “Cerca de 60 a 70% do acordo não está a ser respeitado”, aponta, acrescentando que o sindicato alertou a Câmara Municipal de Lisboa para este incumprimento “em 2023 e em janeiro, março e maio deste ano”.

Além de exigirem “o cumprimento do acordo”, surgem agora “ mais duas matérias”: a atualização do suplemento de insalubridade e penosidade e o reconhecimento desta como profissão como sendo de desgaste rápido.

Sindicato e Câmara de Lisboa já tentaram negociar?

Sim. Só esta semana, o STML e a Câmara Municipal estiveram frente a frente duas vezes: nos dias 16 e 19 de dezembro.

Na véspera da última reunião, no dia 18, o autarca Carlos Moedas garantiu numa conferência de imprensa que iria fazer “tudo para negociar e evitar a greve”. “Este executivo que lidero há apenas três anos tem vindo a fazer tudo o que pode para melhorar as condições do trabalho das mulheres e dos homens da higiene urbana. Os sindicatos sabem que tenho o maior respeito pelo seu trabalho, mas venham sentar-se à mesa e negociar como temos feito nos últimos três anos”, disse.

Acusando os sindicatos de estarem indisponíveis para negociar, Carlos Moedas disse não compreender porque é que decidiram avançar agora para a greve, após três anos “de paz social”.

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No entanto, no último encontro com os sindicalistas, o autarca terá deixado a reunião menos de 30 minutos após ter iniciado, conta Luís Dias. O resto da negociação foi feita com o vice-presidente da autarquia lisboeta, Filipe Anacoreta Correia, mas não foi alcançado nenhum acordo.

A greve tem motivações políticas?

A existência (ou não) de motivações políticas por trás da marcação da greve é o verdadeiro  de braço de ferro entre Moedas e o sindicato. Por duas vezes, o autarca lisboeta criticou o timing da iniciativa sindicalista. A primeira foi a 18 de dezembro (na véspera da última reunião negocial), quando alertou que não é “criando o caos que se ganha o direito [à greve]” e que os lisboetas não “podem ser vítimas de qualquer estratégia de afirmação política ou sindical”.

E a segunda, já de forma mais incisiva, foi após a última reunião. “Estou aqui e faço tudo o que quiserem para evitar esta greve”, mas a resposta dos sindicatos após a negociação foi “não, não, vamos fazer greve”, disse Carlos Moedas em entrevista à SIC Notícias, dando a entender que existe uma ligação entre a greve e as eleições autárquicas de 2025.

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O presidente da Câmara pediu ainda aos trabalhadores da higiene urbana de Lisboa que questionem as motivações do sindicato, criticando o facto de o sindicato se ter sentado à mesa das negociações sem “pedir nada”. Confrontado com estas declarações, o dirigente sindical Luís Dias lembrou que “estes problemas não foram inventados anteontem”.

“A Câmara Municipal de Lisboa já os conhece quase desde que chegou ao executivo. Nada disto foi inventado. Mas dá mais jeito dizer isso para pôr de lado os reais problemas da higiene urbana e desvalorizar os trabalhadores. Se isto são só criações do sindicato, então para quê todo este alarido?“, questionou.

Quais os próximos passos da Câmara de Lisboa?

Segundo Luís Dias não estão previstas mais rondas negociais entre o sindicato e a Câmara Municipal, mas o Observador sabe que o presidente da autarquia vai reunir-se esta sexta-feira com representantes de restaurantes, do comércio e da hotelaria, numa tentativa de encontrar soluções que minimizem a situação e os impactos da greve.

Além disto, Carlos Moedas já adiantou duas outras medidas: a criação de um gabinete de crise e a disponibilização de contentores de obras para que as pessoas possam ter onde colocar as 900 toneladas de lixo diário que é produzido em Lisboa.

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“A equipa de gestão de crise estará 24 horas à disposição dos presidentes de junta. Mas vamos fazer mais: vamos distribuir pelas freguesias de Lisboa alguns contentores de obras, onde as pessoas, em último caso, podem depositar o lixo. Também é muito importante pedir às pessoas que nestes dias tenham consciência do que estamos a viver e evitar depositar o lixo”, disse o presidente da Câmara em conferência de imprensa.

O presidente da Câmara requisitou também serviços mínimos, que foram aprovados no final desta sexta-feira, sendo a recolha assegurada por dois terços dos trabalhadores. E apelou ainda aos outros municípios que disponibilizassem “ilhas móveis”, além de estar a avaliar a possibilidade de decretar teletrabalho para os trabalhadores da autarquia durante a greve e recomendar a mesma prática nas empresas privadas.

O que diz a oposição?

Todos os vereadores dos partidos da oposição na Câmara Municipal de Lisboa se uniram contra Carlos Moedas e a sua “má gestão” da higiene urbana numa reunião pública.

Pelo PS, Inês Drummond acusou o autarca de ser “muito mais rápido” a convocar uma conferência de imprensa do que a agendar uma reunião com o sindicato e lamentou a postura de Moedas: “A culpa é sempre de todos menos sua”, criticou.

Considerando que o problema “é da responsabilidade inteira” do presidente da Câmara, Patrícia Gonçalves, do Livre, defendeu ser “imprescindível para Lisboa assumir um compromisso credível e cabal com estes serviços e com estes trabalhadores”. Já Beatriz Gomes Dias alertou para o facto de a indicação do executivo de o sindicato não ter disponibilidade para negociar chocar de frente com a informação dada pelos sindicalistas.

Por último, João Ferreira, do PCP, ficou ao lado do sindicato e lembrou que o acordo celebrado em 2023 entre os sindicalistas e a Câmara “não foi cumprido”, pelo que o autarca “não pode agora vir fingir em cima do Natal que quer resolver tudo de repente ou dizer-lhes que vai resolver o que não resolveu num ano”.

Podem esperar-se mais greves?

Sim. Ao Observador, o dirigente Luís Dias garante que “em 2025, obviamente”, haverá “novas greves se os problemas não forem resolvidos”.