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HUGO AMARAL/OBSERVADOR

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Robin Klein. "Algumas startups estão a ficar demasiado agressivas"

Investiu em empresas que mais tarde foram compradas pela Amazon, Twitter, Virgin, Intel ou LinkedIn e tornou-se num ícone de referência das startups europeias. Robin Klein em entrevista ao Observador.

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Começou como empreendedor, mas foi como investidor que sustentou grande parte da sua carreira. Cofundador das capitais de risco britânicas The Accelerator Group, Local Globe e sócio da The Index Ventures, Robin Klein já fez mais de 100 investimentos na Europa, Estados Unidos e Israel. Investiu em empresas como a Lovefilm, que foi comprada pela Amazon por 317 milhões de euros; a Sit Up TV, que foi comprada pela Virgin Media; a SlideShare, comprada pelo LinkedIn por 119 milhões de euros; a TweetDeck, que foi comprada pelo Twitter por 40 milhões de euros ou a Mashery, que foi comprada pela Intel por 180 milhões, entre outras. A única startup portuguesa do seu portefólio é a Farfetch, tendo feito parte do conselho de administração. E é um dos nomes por detrás da TransferWise ou da britânica Second Home.

Foi no espaço que a incubadora abriu em Lisboa que recebeu o Observador, para explicar que o segredo do sucesso está “na dor” que sentiu quando lançou a sua primeira empresa e que é por isso que tem uma “empatia forte” pelos fundadores das startups em que investe. Assume que nem sempre esteve certo, mas que “falhar não te torna num falhadoe a quem quiser aventurar-se numa startup porque é moda, deixa um alerta: “as coisas cool não permanecem cool durante muito tempo”. Quanto à era de unicórnios (empresas que valem mais de mil milhões de dólares) em que vivemos, diz que “há muitas startups que estão sobrevalorizadas”. Nem a Uber de Travis Kalanick escapou à conversa, para dizer que o sucesso está, muitas vezes, na determinação. “Os empreendedores com mais sucesso são também, pela sua natureza, muito agressivos”, disse. Só lamenta ter perdido a oportunidade de investir no Pinterest.

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“Repetir o que se faz em Silicon Valley não é necessariamente o melhor para a Europa”

É um investidor com uma carreira de sucesso. Qual é o seu segredo?
Comecei como empreendedor e só comecei a investir nos últimos 20 anos. Acho que realmente ajuda ter construído a minha própria empresa, mais do que uma vez, e ter passado por essa dor. Porque é muito entusiasmante lançar uma empresa, uma das maiores vantagens é a liberdade que te dá, mas também tem grandes desvantagens. Torna-se muito difícil dormir à noite. É uma luta constante. E, por isso, tenho uma empatia forte pelos fundadores das startups em que invisto. Compreendo aquilo pelo qual passam e isso é muito importante. Porque quando investes numa empresa em fase muito inicial, na verdade, a tua decisão vai recair sob as pessoas. Óbvio que o negócio em que estão a trabalhar é importante, mas as pessoas são muito mais importantes, saber qual é a sua a motivação. Porque é que estão a fazer isto? Como se vão comportar quando as coisas correrem mal? Porque vão existir altos e baixos. Como vão lidar com essas dores?

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Podem existir muitas razões para esse tal sucesso de que falas. A empatia que sinto pelos fundadores e a compreensão é uma. A segunda é estar confortável com o risco. E a razão pela qual estamos confortáveis em arriscar é porque sabemos que, se conseguirmos ter sucesso, esse sucesso vai ser enorme e pode cobrir uma série de investimentos fracassados. Faz parte da experiência dos investidores em capital de risco aprender a lidar com os falhanços. Sem os encarar de uma forma muito pessoal, compreendendo que com o risco também vem o falhanço, e que às vezes não é culpa nossa. Nem dos empreendedores. E se não estivermos a falhar as vezes suficientes, então, muito provavelmente, é porque também não estamos a arriscar o suficiente. Falhar não te torna num falhado.

Acha que faz falta aos investidores europeus este tipo de experiência?
Estamos atrás de Silicon Valley. Não há duvidas sobre isso. Na Europa, os ecossistemas têm estado muito focados em crescer e acho que o do Reino Unido é o mais avançado no que diz respeito a startups e investidores. Mas sim, estamos alguns anos atrás. Mas a constante comparação com Silicon Valley não é necessariamente uma coisa boa. Acho que precisamos de nos focar naqueles que são os nossos pontos fortes, que são diferentes dos de Silicon Valley. E se conheceres o Valley, sabes que os pontos fracos deles são significativos. Por isso, repetir o que têm estado a fazer não é necessariamente a melhor coisa para a Europa.

"Acho que Silicon Valley é e sempre foi um sítio onde as pessoas sentem que são capazes de fazer a diferença. Porquê? Porque entendem o poder da tecnologia e sentem que quase todos os problemas podem ser resolvidos recorrendo à tecnologia. E é verdade, mas a tecnologia também cria problemas"

E que pontos fortes são esses que a Europa tem? Onde devíamos estar a apostar?
Acho que não se trata tanto de “onde” devíamos estar a investir – apesar de achar que há áreas que são mais naturais para a Europa -, mas penso que uma das nossas forças, particularmente se vieres de um país pequeno, é que pensamos de forma internacional desde o início. Temos de o fazer. Porque o mercado é demasiado pequeno.

Um bom exemplo disto é Israel. Os empreendedores israelitas nunca pensam em desenvolver o seu negócio apenas em Israel. Pensam sempre fora disso. Em Portugal, olho para o vosso património, para o vosso passado colonial, que é muitas vezes visto como negativo, mas no qual eu acho que é possível extrair coisas positivas: a aventura, o olhar para fora, o quererem conectar-se com o resto do mundo. Acho que isso é uma grande vantagem que vocês têm. Em Silicon Valley, eles muitas vezes têm um mercado doméstico tão grande que nem olham para fora desse mercado.

Sobre as fraquezas de Silicon Valley, lembrei-me das polémicas recentes que envolvem a cultura empresarial da Uber e outras tecnológicas. As startups estão a ficar demasiado agressivas e obsessivas?
Acho que algumas estão. E quando te tornas extremamente grande, tens de te tornar também mais sensível à forma como o mundo te vê. Quando és pequeno e não és propriamente relevante, talvez as pessoas percam visão. Parte daquilo que deveriam estar a fazer é resolver alguns dos problemas da sociedade e a tecnologia é uma grande oportunidade para fazerem isso. Alguns dos empreendedores mais inspiradores têm realmente um propósito, querem fazer a diferença.

Acho que Silicon Valley é e sempre foi um sítio onde as pessoas sentem que são capazes de fazer a diferença. Porquê? Porque entendem o poder da tecnologia e sentem que quase todos os problemas podem ser resolvidos recorrendo à tecnologia. E é verdade, mas a tecnologia também cria problemas. Pode tornar a vida das pessoas melhor, mas também pode levar ao desemprego, quando os trabalhos se tornam redundantes ou desaparecem. E estas responsabilidades mais abrangentes da sociedade são algo que talvez na Europa levemos mais a sério do que levam em Silicon Valley.

Em relação a alguma da má publicidade que temos visto, também é verdade que alguns dos empreendedores com mais sucesso são também, pela sua natureza, muito agressivos, muito determinados. Acreditam neles próprios acima de qualquer outra coisa. E é isso que faz com que tenham sucesso.

Então é assim que as coisas funcionam?
Sim, acho que é. Não com todas as pessoas, é óbvio que também estamos a generalizar e que há casos que são a exceção à regra.

"A educação é uma das grandes áreas agora para onde a tecnologia começou a olhar. E muitos dos grandes desafios que se colocam é que a educação precisa de parcerias com os governos para que possa funcionar"

“Ter medo da tecnologia atrasa o desenvolvimento”

Já viu o mundo tecnológico passa por muitas mudanças. O que é que representa hoje uma maior ameaça para as pessoas? Com o que é que se deviam preocupar?
Acho devíamos abraçar a tecnologia. Sem dúvida. Não devemos ter medo, mas devemos estar conscientes de alguns dos perigos. Acho que se olhares para os últimos 500 anos, percebes que é extraordinário ver como a vida das pessoas melhorou com a tecnologia. Em áreas muito diferentes. Na agricultura, saúde, etc. E ainda há tanta coisa por fazer. A educação é uma das grandes áreas para onde a tecnologia começou a olhar. E muitos dos grandes desafios que se colocam é que a educação precisa de parcerias com os governos para que possa funcionar bem. Acho que temos de estar conscientes dos perigos, que a sociedade precisa de fazer escolhas sobre o que quer ou não adotar. Mas ter medo de tecnologia é uma reação negativa, que atrasa o desenvolvimento. Além de que acho que é impossível. O espírito humano é assim: vai sempre querer explorar, criar coisas.

Como devem os governos lidar com os negócios que enfrentam estes desafios regulatórios? Porque a sociedade não se desenvolve tão rapidamente quanto a tecnologia.
Acho que os governo precisam, sem dúvida, de se envolver com o setor tecnológico. Esse é um dos grandes fatores de sucesso do ecossistema tecnológico do Reino Unido, no qual o governo se envolveu ativamente. Primeiro, porque depois do crash de 2008, viram que não existia crescimento na economia. O único crescimento que viam estava na tecnologia. Acho que os governantes disseram a eles próprios que tinham de encorajar as áreas que estavam a crescer e, por isso, envolveram-se de uma forma muito prática. Mas há aqui um ponto muito importante, porque acho que há uma linha que os governos não deviam passar. Não devem ser os governos a escolher os vencedores e a investir diretamente neles. Não estão na melhor posição para o fazer, não têm as competências.

O que os governos devem fazer é proporcionar um ambiente fiscal que encoraje o empreendedorismo, as empresas, o capital, a educação. Tudo o que vai criar as infra-estruturas de um setor tecnológico forte. Encorajar os reguladores a pensar não apenas em proteger os incumbentes – particularmente os bancos ou talvez os taxistas – mas naquilo que é melhor para os consumidores, entendendo, realmente, os benefícios de algumas das novas tecnologias. E desenhar uma regulação que reflita o que é melhor para os consumidores. Infelizmente, em muitos países, os incumbentes são muito fortes, têm o ouvido do governo e as startups não conseguem falar com ninguém dos partidos. E é isso que os governos devem começar a fazer: a ouvir

"Quando as pessoas têm sucesso, é muito mais fácil falarem dos seus falhanços. E quando as pessoas conhecem o José Neves [da Farfetch], percebem que ele é um tipo normal, como nós"

Disse há pouco que se não estivermos a falhar o suficiente, então é porque não estamos a arriscar o suficiente.
Sim.

Mas como preparamos as pessoas para o falhanço? Porque é uma questão cultural
Todos os ecossistemas de startups, todos os clusters que começam a emergir, todos os grupos precisam de heróis e precisam de ouvir as histórias desses heróis. Por exemplo, não sei se em Portugal é um herói, mas para mim é, porque foi um dos projetos em que investimos. Estou a falar do José Neves, da Farfetch. Ele é português, tem um sucesso grande com a Farfetch. Ainda não fez um exit [quando a empresa sai da esfera dos investidores privados porque é comprada por outra empresa ou é admitida em bolsa], mas não há dúvida de que é um líder global da indústria da moda de luxo. Estive no conselho de administração da Farfetch durante alguns anos e acho que ele devia ser convidado a falar da sua história, do seu passado. E se calhar descobrem que também teve alguns falhanços pelo caminho.

Quando as pessoas têm sucesso, é muito mais fácil falarem dos seus falhanços. E quando as pessoas o conhecem, percebem que ele é um tipo normal, como nós. Talvez tenha tido sorte, talvez tenha trabalhado muito, talvez seja esperto. Sejam quais forem os motivos que se reuniram, eles só por si não garantiam o sucesso. E podes ter a certeza que ele passou por momentos muito duros, eu sei que sim. Teve um negócio de retalho que não correu particularmente bem, mas aprendeu sobre moda e viu uma oportunidade para crescer a partir daí. Essa é uma das formas que podes utilizar para mostrar às pessoas que não há mal nenhum em falhar – quando elas vêem as pessoas que têm sucesso hoje a contar como falharam no passado.

A outra forma é aprendendo. As pessoas dizem sempre que se aprende mais com os falhanços do que com os sucessos. Não tenho a certeza se isso é verdade, porque a maioria das pessoas quer esquecer os seus fracassos, mas a melhor coisa que podes fazer é pensar sobre eles. O que é que correu mal? Entendi mal o mercado? Contratei as pessoas erradas? A minha tecnologia não era boa? Falhei em angariar dinheiro? E se falhei, porquê? Estes são os pensamentos que as pessoas precisam de ter, mas algumas destas coisas precisam de tempo. Falamos de Lisboa estar, talvez, atrás do Reino Unido. E o do Reino Unido está atrás de Silicon Valley. Com o tempo, recolhes mais falhanços, mas tens mais aprendizagens e mais sucessos. E constróis o ecossistema com base nisto.

"Uma das melhores coisas que podiam ter feito foi receber a Web Summit. Foi um grande impulso para o ecossistema"

“Em Lisboa, não devem copiar cegamente outros ecossistemas”

Porque é que investiu na Farfetch? É a única empresa portuguesa na qual investiu, apesar de a sede ser no Reino Unido.
Sim, mas eles têm um escritório muito grande no Porto. É uma operação grande, que está toda em Portugal e que eu não mudaria para nenhum outro sítio. Há grandes vantagens aqui: os custos com engenheiros são muito mais baixos do que em Londres. Por isso te estava a dizer que precisamos de olhar para as nossas forças. Vê quanto custa contratar um engenheiro em Silicon Valley. Se tiveres a sorte de conseguir contratá-lo, um ano depois aparece alguém que lhes paga mais 20 mil dólares e ele vai embora. Não é fácil começar um negócio em Silicon Valley. É provavelmente muito mais fácil aqui. E o mercado é o mesmo: é o mundo. Esta é a oportunidade

Conhece o ecossistema português?
Não muito, mas acho que uma das melhores coisas que podiam ter feito foi receber a Web Summit. Foi um grande impulso para o ecossistema. Esta é é a primeira vez que estou em Lisboa, não conheço a cidade muito bem, mas quando a Second Home decidiu vir para aqui (sou investidor e estou no conselho de administração da Second Home), discutimos porque haveríamos de escolher Lisboa e não outro sítio. Explicaram-nos o que estava a acontecer e eu achei que era muito excitante. Parece-me que o vosso Governo, a cidade de Lisboa, podem ver o espírito de empreendedorismo que há aqui. E acho que vamos encorajar a isso.

"Muitas vezes, as coisas parecem cool de fora, mas quando te envolves percebes que é um trabalho muito duro e que não é fácil. Para as pessoas que querem apenas fazer dinheiro, há provavelmente melhores maneiras"

Pela sua experiência, que erros é que não deveríamos cometer?
Não deviam copiar cegamente outros ecossistemas. Devem, analisar realmente quais são as vossos pontos fortes. Mas acho que há mais coisas para dizer sobre o que podem fazer do que sobre as que não podem fazer. Deviam trabalhar de perto com as universidades. O motor do talento do futuro está nas universidades – na ciência, engenharia, matemática, todas essas áreas. Estou praticamente certo que Portugal produz muitos licenciados que, em vez de irem para grandes organizações, podem estar interessadas em juntar-se a startups.

Acha que corremos o risco de algumas pessoas estarem a lançar startups porque parece ser uma coisa cool e não porque estão completamente conscientes do que significa?
Não, porque inevitavelmente esses negócios vão fracassar. Se não houver realmente uma paixão ou propósito, esses negócios vão falhar. As coisas cool não permanecem cool durante muito tempo. Muitas vezes, as coisas parecem cool de fora, mas quando te envolves percebes que é um trabalho muito duro e que não é fácil. Para as pessoas que querem apenas fazer dinheiro, há provavelmente melhores maneiras de o conseguir.

Vivemos na era dos unicórnios, com avaliações recorde. E tivemos recentemente a entrada em bolsa do Snapchat. As empresas tecnológicas estão sobrevalorizadas?
Nem todas estão, mas muitas sim. É muito difícil avaliar uma empresa quando aquilo que procuras é o que ainda está por vir. A avaliação faz-se mais com base no futuro e, por isso, há um grande elemento de julgamento e risco envolvido naquilo que é a perceção do valor de uma empresa. Mas muitas empresas estão a crescer muito rapidamente por isso. Mesmo que agora pareça que não conseguem justificar essa avaliação, algumas vão crescer para essa avaliação dentro de um ou dois anos. Quando o Facebook foi admitido em bolsa, as pessoas acharam que estava extremamente sobrevalorizado e teve uma grande queda alguns meses depois. Mas agora é a empresa de media mais proeminente do mundo. Talvez a segunda, depois do Google, se classificares o Google como uma empresa de media.

"Se os teus consumidores não adorarem o que fazes, então nem sequer tens direito a existir. Se os teus leitores não adorarem o que escreves, não tens direito a existir"

“O Snapchat estava sobrevalorizado e há grande risco no investimento”

E acha que temos espaço no mercado para o Snapchat e o Facebook? Porque, entretanto, o Facebook em estado a…
To crush it.

Sim, é essa a expressão. O que é que vai acontecer?
Acho que vai acontecer o que acontece em qualquer indústria estabelecida. Também tentaram destruir as coisas novas que apareceram. O Facebook tem sido extraordinariamente bem sucedido em compreender qual é a sua utilidade e os seus utilizadores. E essa é a chave para o sucesso de qualquer negócio. Se os teus consumidores não adorarem o que fazes, então nem sequer tens direito a existir. Se os teus leitores não adorarem o que escreves, não tens direito a existir. Se me perguntares agora, diria que o Snapchat estava sobrevalorizado e que existe um grande risco no investimento. Mas a melhor coisa no meu trabalho é que eu posso errar muitas vezes (e tenho estado). Por muitos sucessos que tenhamos tido, muito provavelmente tomámos decisões erradas em igual número.

Tem algum investimento do qual se arrepende?
Que me arrependo de não ter feito?

De não ter feito ou de ter feito.
Dos que fizemos nunca falamos, porque achamos que isso não seria justo para as empresas.

"Acho que, se olhar para trás, posso dizer que vendi a minha primeira empresa demasiado cedo. Mas fi-lo para poder ir viver para a África do Sul, país onde nasci"

E há algum que se arrepende de não ter feito?
Sim, sem dúvida. Foi muito provavelmente o Pinterest.

Porque é que não investiu no Pinterest?
Porque não conseguia ver o futuro. Não consegui perceber que se tornaria numa grande empresa. Vi-a numa fase muito inicial na Costa Oeste e o meu foco estava muito em Londres. Esta é a desculpa que encontrei, mas a verdade é que não tive visão para perceber mesmo no que o Pinterest se podia tornar. Quer dizer, eles ainda têm de trabalhar na forma como vão monetizar o tráfego incrível que têm, mas parece-me que com o nível de tráfego que têm atualmente, já representariam um bom investimento.

Tem algum momento que se lembre de ter mudado a sua vida?
Enquanto empreendedor, quando vendemos a nossa primeira empresa isso é game changer. Um dos fatores que contribui para fazer crescer um ecossistema como o do Reino Unido é que muitos dos empreendedores vendem as suas empresas muito cedo. E não podes culpá-los, porque isso vai mudar a sua vida. Mas acho que, se olhar para trás, posso dizer que vendi a minha primeira empresa demasiado cedo. Mas fi-lo para poder ir viver para a África do Sul, país onde nasci.

"Começar, ter e desenvolver um negócio é uma coisa muito pessoal. E acho que a altura certa para vender é aquela que o indivíduo achar que está certa"

Mas esse tipo de erros não ajuda os ecossistemas a amadurecer?
Não são erros. Começar, ter e desenvolver um negócio é uma coisa muito pessoal. E acho que a altura certa para vender é aquela que o indivíduo achar que está certa. O que os investidores mais espertos tentam fazer, quando percebem que os fundadores ainda estão apaixonados pelo negócio, é encorajá-los a ficar, tentando só que lhes vendam algumas ações. E continuam. Mas para que isso aconteça os ecossistemas têm de amadurecer muito, há um longo caminho por percorrer, porque temos de ter mercado públicos que também são fortes.

Falamos de startups, mas a verdade é que para construir uma grande empresa, no longo prazo, elas precisam de financiamento em múltiplos pontos. E precisam que o ecossistema tenha capital numa fase muito inicial – na dos “Family, Friends and Fools”, na fase semente, na ronda A, B ou C, e nos IPO [entrada em bolsa]. Tudo isto precisa de existir. E isso é o que têm em Silicon Valley. Mark Zuckerberg ofereceu mil milhões pelo Snapchat e ele recusou. Acho que a Zuckerber etambém lhe tinham oferecido o mesmo. Não sei se a Google ou a Microsoft. E ele recusou. Para um empreendedor europeu, é impensável recusar uma oferta destas.

E são tão jovens. Com 20 e poucos anos.
Sim. Parece-me óbvio que ele acreditava completamente que, nalgum momento da sua vida, faria um IPO e continuaria a desenvolver o negócio. Tinha tanto capital que não precisava de vender a empresa.

“No Reino Unido, há uma escassez tremenda de talento”

Passemos para Brexit. Vai ter impacto nas startups?
Acho que vai ter. Infelizmente, acho que sim. Porque uma das coisas boas de estarmos na União Europeia é a livre circulação de talento. E se o ecossistema requer alguma coisa, então requer talento. Acho que vai refletir-se no Reino Unido nisto, porque há uma escassez tremenda de talento. A não ser que consigamos introduzir de uma forma muito liberal políticas de migração que sejam bem direcionadas para esta falta de talento. E eu acho que vão, mas o Brexit vai introduzir fricção no processo, que tem sido muito suave até agora.

Uma cidade como Lisboa pode tirar alguma vantagem disto?
Acho que é bem possível que estas pessoas comecem a pensar lançar as suas equipas de engenharia aqui e noutros sítios da Europa. Estou a falar de empresas britânicas. Sei que existem algumas que já estão a fazer isso e acho que esse movimento tende a acelerar. Também acho que, se calhar, algumas das pessoas talentosas que estariam a pensar ir para o Reino Unido, agora estão menos inclinadas, porque não se sentem bem-vindas. Mas estou confiante que isso é temporário.

"Não existe nenhum governo no mundo que não diga que a tecnologia é importante, que as empresas não são importantes. Precisamos de construir sob isso"

Que conselhos dá aos empreendedores portugueses?
Diria para se envolverem na comunidade. A industria tecnológica funciona em cooperação e, ao contrário de algumas das indústrias mais antigas, que construíram um muro à sua volta, as empresas tecnológicas precisam de interagir. É muito importante interagir. Dar e receber da comunidade. Acho que queremos ver em Lisboa e noutras cidades da Europa os aceleradores a crescer, como aconteceu com o Seedcamp no Reino Unido. Precisamos desses aceleradores e de ter relações muito próximas com as universidades. Os nossos empreendedores devem manter relações próximas com as universidades e encorajar o novo talento que sai de lá. E devem interagir com o governo, de uma forma muito efetiva e eficiente.

Não sei o que o Governo está a fazer em Portugal, mas, no Reino Unido, criou-se a Tech City: 12 a 15 pessoas cujo trabalho é encorajar o ecossistema a dar feedback ao Governo, dizendo-lhe que coisas precisam de mudar ou melhorar. E foram feitas mudanças significativas no Reino Unido, que encorajaram muito capital a entrar na startup scene. Também introduziram benefícios fiscais para as pessoas poderem investir. Os empreendedores podem fazer a diferença se falarem com os políticos. Vão ser ouvidos. Porque não existe nenhum governo no mundo que não diga que a tecnologia é importante, que as empresas não são importantes. Precisamos de construir sob isso. Por isso, as suas vozes vão ser ouvidas. E eles precisam de se fazer ouvir.

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