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Seguro deixou farpa no final de debate sobre Europa
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Seguro deixou farpa no final de debate sobre Europa

Carlos Manuel Martins / Global Imagens

Seguro deixou farpa no final de debate sobre Europa

Carlos Manuel Martins / Global Imagens

Seguro diz-se "perplexo" com situação do país: "Os portugueses merecem melhor"

Ao lado de Assunção Cristas para falar de Europa, ex-líder do PS brincou sobre "reencarnações" passadas e não fechou a porta à vida política: "Seria hipócrita". Houve avisos sobre europeias.

Foi preciso várias recusas em falar sobre política nacional, garantias sobre estar fora da vida pública e um debate inteiro sobre Europa para que António José Seguro disparasse a frase que marcou a noite: “Quando olho para o país, fico perplexo com o que vejo. Acho que os portugueses merecem melhor”. Não quis elaborar sobre os motivos para a sua perplexidade nem lançar-se a mais análises políticas mas, em tempos de crise política e instabilidade entre São Bento e Belém, as entrelinhas deixaram pouco à imaginação: “Pelas razões de que vocês suspeitam”.

O recado político foi dado pelo antigo líder do PS já de fugida, à saída de uma sessão promovida pela plataforma Nossa Europa, para celebrar o dia da Europa. Depois do debate com Assunção Cristas, em cima do palco, onde fez referências bem mais tímidas à atualidade política e garantiu estar fora dessa “geometria”, Seguro ainda disse aos jornalistas que o esperavam que só estava ali, no pavilhão do Grupo Recreativo e Dramático 1º de Maio de Tires, para falar sobre Europa. Mas acabou por lançar a referência à crise política, antes de se escusar a fazer mais comentários.

Minutos antes, e ainda em cima do palco, tanto Seguro como Cristas tinham acedido por momentos a falar dos seus próprios planos políticos — com o antigo líder do PS, destronado por António Costa em 2014, a deixar uma porta aberta para o futuro. Apesar de, tal como Cristas, dizer estar totalmente dedicado à sua vida académica e a uma “pequenina” atividade empresarial, o socialista riu-se para lembrar que “há quem diga que não se deve voltar a um lugar onde se foi feliz” e que não tem “nenhum horizonte” sobre a vida política — a pergunta da moderadora, Maria Flor Pedroso, era se estariam disponíveis para uma candidatura europeia pelos respetivos partidos em 2024.

Mas depois de fazer a plateia rir-se, o ex-secretário-geral do PS preferiu deixar a porta entreaberta: “Não sou hipócrita de dizer que jamais em tempo algum”, frisou. Do lado de Cristas, que como Seguro foi fazendo algumas referências a “reencarnações” passadas — ou seja, aos tempos em que eram líderes do CDS e do PS, papéis em que já não se cruzaram — a “pergunta difícil” foi respondida também sem “planos” em matéria política: “O CDS tem pessoas ótimas que podem continuar na linha da frente e dar um contributo muito válido”. Isto enquanto Cristas se dedica, como explicou, à vida académica e à advocacia.

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Assunção Cristas mostrou-se mais otimista sobre projeto europeu e liderança da Europa em áreas concretas, como sustentabilidade

JOÃO PORFÍRIO/OBSERVADOR

Seguro avisa: europeias serão “dominadas” por leituras nacionais

Num debate em que, como Seguro descreveu, discordaram com “elegância” — a democrata-cristã mostra-se mais otimista em relação ao projeto europeu, o socialista descrente num projeto que nem sequer distingue e na falta de “coragem política” que vê nas lideranças europeias — também houve avisos para futuro.

Curiosamente, Seguro, que acabou por sair da liderança do PS por causa das eleições europeias de 2014 — apesar da vitória socialista nessas eleições, António Costa usou como pretexto o resultado, que classificou como “poucochinho”, para seduzir o aparelho do partido, desafiar a liderança segurista e lançar o que viria a ser o seu consulado — pareceu devolver o recado a Costa.

E isto porque, em resposta a uma pergunta sobre o que marcará a campanha europeia do próximo ano, Seguro não mostrou grandes dúvidas: é “fácil” reconhecer que as europeias serão “autenticamente dominadas pelo contexto nacional, da política nacional”.

“Se o calendário se mantiver” — isto é, se a ameaça da dissolução da Assembleia da República não se concretizar entretanto — “vão ter uma leitura, devido a toda a evolução política que tem existido, não só ultimamente. Será muito difícil dizer que vamos falar de Europa”. E é essa evolução que tem deixado o antigo líder do PS “perplexo”, como diria minutos depois. Um segundo recado: a marcação das europeias para a véspera do feriado de 10 de junho também não será avisada: “Se estávamos à procura de incentivos para as pessoas irem votar, esse é dos piores…”.

Seguro e Cristas foram brincando com os respetivos passados políticos ao longo de toda a sessão: haveria respostas que, reconheceram, noutros tempos — “noutras encarnações”, como foram dizendo — estariam, teriam de estar, na ponta da língua. Ainda assim, houve espaço para alguns recados: o ex-líder socialista também fez questão de dizer que “os tempos não estão fáceis” e nem a Europa nem a própria democracia são projetos que se possam dar por adquiridos. Com recados para os líderes atuais: “Temos todos os dias de lutar para lembrar esses valores e em nome desses valores resolver os problemas concretos das pessoas. Não há nenhum projeto político que consiga vingar sem apoio popular”.

Sobre o passado, Seguro ainda lembrou que enquanto líder do PS chegou a defender que era “imprescindível” que o Banco Central Europeu emprestasse dinheiro diretamente aos Estados, sem passar pelos respetivos bancos. “Havia muita gente que me criticava, uns porque não era permitido nos tratados, outros com fundamentos ideológicos. Depois isso teve de ser consagrado: a política tem sempre um papel, mesmo quando decisão está em instâncias como o BCE”. É também por isso que defende uma governação económica europeia, que olhe não só para a estabilidade, mas também para o crescimento — que deve, mais uma vez, servir para “resolver os problemas concretos das pessoas”.

Defensor da lógica mais federalista a nível europeu e da alteração de regras para impedir que decisões importantes tenham de contar com a aprovação por unanimidade dos Estados-membros — o que promove a “chantagem” e a negociação por “contrapartidas”, criticou — foi nesse ponto que Seguro mais chocou com Cristas: o CDS sempre foi contra a lógica federalista e defende que os países mais pequenos têm de se fazer valer por si, sem alterações de regras que os possam deixar à margem das tomadas de decisão.

Noutros pontos, Seguro continuou a mostrar-se desanimado: quanto à falta de políticas de acolhimento na Europa, são “aproveitadas pelos exploradores do medo para fins eleitorais”, alertou, pelo que é preciso que haja boa integração, “sob pena de criarmos vários barris de pólvora e que os imigrantes sejam presas fáceis”.

De acordo estiveram ambos sobre a importância de haver um “núcleo” europeu sobre áreas militares, “crucial não para fazer a guerra, mas para a Europa ganhar autonomia”, apontou Seguro. “Concordo. A UE sempre confiou na NATO e sempre teve medo de si própria“, lamentou Cristas.

Maria Flor Pedroso ainda brincou com os convidados e com a falta de pretextos para os convidar para o seu programa de “atualidade”: “Não têm feito parte da atualidade, dessa geometria”. Seguro sorriu: está mais “recatado”, confirmou. Cristas sorriu também: lembrou a sua vida passada para dizer que quando era ministra (no Governo de Passos Coelho e Paulo Portas) “não havia dinheiro, havia dívida, e tínhamos um programa duro de privatizações e quem apareceu não foram os europeus, que também não tinham dinheiro” — isto para defender que a Europa deve preocupar-se em não perder relevância e ser um ator económico dinâmico, e agarrar-se também aos progressos em áreas que lidera, como a da sustentabilidade, para ser protagonista internacional.

Não fosse a declaração de Seguro mesmo à porta de saída e a quente atualidade política teria ficado de fora da sessão. Mas o antigo rival de Costa não deixou.

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