886kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

Sidney e Nélida terão cometido quatro assaltos em Portugal antes de seguirem para Espanha (ANA MOREIRA/OBSERVADOR)
i

Sidney e Nélida terão cometido quatro assaltos em Portugal antes de seguirem para Espanha (ANA MOREIRA/OBSERVADOR)

Sidney e Nélida terão cometido quatro assaltos em Portugal antes de seguirem para Espanha (ANA MOREIRA/OBSERVADOR)

Sexo, drogas, assaltos, quatro homicídios e a fuga à polícia. O rasto de crimes dos Bonnie e Clyde portugueses que assusta Espanha

Na lista de crimes, há dezenas de assaltos e quatro homicídios: um no Algarve (foram absolvidos) e três em Bragança. Fugiram em carros roubados e puseram Espanha em alvoroço. Podem já estar em França.

Quando abriu a porta que dava para a rua, a mulher de 65 anos foi instantaneamente esfaqueada até à morte. O marido, de 67, correu para a tentar salvar: também ele gravemente golpeado, ainda conseguiu sobreviver para contar à polícia que o autor do homicídio tinha sido o próprio filho do casal, toxicodependente. Mas, nove dias depois, pai e filho foram encontrados mortos na mesma casa. Um homicídio seguido de suicídio?

Os seus corpos foram descobertos, em julho, por bombeiros que combatiam um incêndio, na casa da família em Donai, uma aldeia com menos de 500 habitantes, em Bragança, e a pouco mais de 20 quilómetros da fronteira com Espanha. O alerta para o fogo tinha sido dado pelos vizinhos por volta das 8h da manhã do dia 19 de julho. Os cadáveres apresentavam sinais de violência e feridas provocadas por um objeto perfurante. “Ao que tudo indica, são o marido e o filho de uma mulher de 65 anos, que foi encontrada morta dentro da mesma habitação no dia 10 de julho”, revelou na altura o comandante dos Bombeiros Voluntários de Bragança, Carlos Martins.

A primeira suspeita da Polícia Judiciária (PJ) foi a de que o pai, revoltado com o filho por ter assassinado a própria mãe, o matara e suicidara-se de seguida. Mas a tese rapidamente caiu por terra quando os investigadores descobriram que o filho estava noutro local no dia e hora a que a mãe tinha sido esfaqueada até à morte. Havia imagens a prová-lo. As suspeitas recaíram então sobre um casal que o filho conhecia do mundo da droga: Sidney Martins e Nélida Guerreiro.

Terão sido as suspeitas de que Sidney e Nélida — já antes arguidos, mas absolvidos, de um homicídio no Algarve, com contornos semelhantes (a casa também foi incendiada) — seriam os autores deste crime que os levou a fugir de Portugal. Atrás de si, deixaram um rasto de crimes. Antes de rumarem a Espanha, passaram pelo sul do país, onde terão cometido pelo menos dois assaltos a bombas de gasolina: um em Estoi e outro em Lagos. De cara destapada, com pistolas e armas brancas para ameaçar os funcionários, Sidney e Nélida não parecem ter medo de ser apanhados. Entre estes dois assaltos, a 28 de julho, a GNR ainda conseguiu intercetar o casal num carro roubado. Mas conseguiram ambos escapar à detenção após abalroar os militares. Fugiram até Lagos, onde assaltaram outra bomba de gasolina, deixaram o carro roubado e lançaram as mãos a outro, um Citroën Xsara azul claro, com o qual seguiram até ao sul de Espanha.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

O rasto de crimes e destruição dos Bonnie & Clyde portugueses, Sidney e Nélida

Mas a história desta finta constante às polícias portuguesa e espanhola ainda estava no início — e o registo de crimes continuaria a crescer de um e do outro lado da fronteira. O primeiro assalto em território espanhol foi numa bomba de gasolina em Sevilha a 29 de julho, segundo a polícia espanhola. Mas o casal terá regressado a Portugal para um novo assalto em Almancil, logo a 1 de agosto. A estadia foi breve e no dia 4 já estavam novamente em Espanha onde, em quatro dias, fizeram três assaltos. Na fuga, tiveram um acidente de carro em Carranque, no município de Toledo, mas nem isso os impediu de continuar. Deixaram uma longa fila de trânsito atrás de si e conseguiram fugir ao enorme dispositivo de segurança montado para os localizar: helicópteros, drones, membros da unidade de ação rápida e agentes de Toledo e Madrid foram mobilizados para tentar capturar Sidney e Nélida, descreve o El Confidencial.

Até agora, essa é uma missão sem sucesso. A última vez que os dois foram vistos terá sido perto da capital espanhola. A polícia acredita que o destino final possa ser França, onde já podem estar. A fuga, que mais parece um guião de um filme, dura há pelo menos duas semanas e meia. E a forma como foram somando suspeitas de crimes — tráfico de droga, homicídios, furto, roubo, resistência às ordens da polícia, sem contar com toda a destruição que foram provocando pelo caminho — levou a que fossem apelidados de Bonnie e Clyde portugueses. Uma referência ao casal norte-americano que há quase um século cometeu vários assaltos e homicídios nos Estados Unidos e cuja fuga terminaria com a morte dos dois, em 1934, abatidos pela polícia. Afinal, Sidney e Nélida são o casal português mais procurado do momento. A polícia espanhola divulgou as suas imagens e pediu ajuda à população para os encontrar. Mas deixou um alerta claro: são pessoas armadas e consideradas “perigosas”.

Sidney viveu em Inglaterra até aos 38 anos. Lá foi condenado por roubo e incumprimento de penas

Natural da Venezuela, Sidney Martins teve uma vida ligada ao crime e às drogas, que começou em Inglaterra onde viveu com a mãe até aos 38 anos. Lá, cumpriu o ensino secundário e chegou mesmo a entrar na universidade, embora tivesse abandonado o curso ao fim de dois anos. Ainda no Reino Unido, trabalhou como mecânico de automóveis, lê-se num acórdão do Tribunal de Faro, onde viria a ser julgado por homicídio, segundo um documento a que o Observador teve acesso.

Natural da Venezuela, Sidney Martins teve uma vida ligada ao crime e às drogas, que começou em Inglaterra onde viveu com a mãe até aos 38 anos. Lá, cumpriu o ensino secundário e chegou mesmo a entrar na universidade, embora tivesse abandonado o curso ao fim de dois anos.

Mas a vida ligada às drogas já tinha começado a deixar um rasto na justiça britânica logo em 2012, quando foi condenado em vários processos pelo Tribunal South West London Magistrates. O mais grave foi o crime de roubo, pelo qual foi condenado a frequentar um curso de reabilitação de consumo de drogas, trabalho comunitário e sujeitar-se a supervisão do tribunal. Mas na lista constam também, no mesmo ano, multas por não se apresentar para “detenção à hora indicada” e uma pena de privação de liberdade por um dia por não ter cumprido a ordem de frequentar um teste de drogas, indica ainda o mesmo acórdão.

Dois portugueses procurados em Espanha por assaltos a estações de serviço

Em maio de 2018, Sidney regressou a Portugal, onde tinha família em várias zonas do país, para cumprir uma pena de prisão na sequência de uma condenação em pena de prisão, que cumpriu, indica o acórdão do Tribunal de Faro — embora não esclareça de que crime se trata. A mãe ficou em Inglaterra, o pai morreu no mês seguinte. Em Portugal, tinha apenas um irmão que se encontra desde 2008 a cumprir pena de prisão em Coimbra. À data do seu regresso a Portugal, Sidney sofreu uma recaída e começou a fazer um tratamento com substituição por metadona. Mas a irregularidade com que ia às consultas e tomava as doses de metadona necessárias impediram a sua recuperação. A isso juntou-se o facto de ficar desempregado.

O casal é suspeito de matar três pessoas, da mesma família, em Bragança

Getty Images/iStockphoto

Já Nélida Guerreiro é natural de São Brás de Alportel, em Faro. Foi ali que viveu, pelo menos até 2007, ano em que foi visitar a avó a Vinhais, acabando por ficar a viver naquela zona de Bragança, durante dez anos. As dificuldades económicas e a toxicodependência levaram-na a começar a trabalhar como acompanhante, trocando favores sexuais por dinheiro, lê-se também no acórdão do Tribunal de Faro. Em 2010, teve uma filha, que foi viver com a avó e tia — mãe e irmã de Nélida — para o Algarve. Durante os anos que se seguiram, de três em três meses, Nélida ia ao Algarve, durante um período de quinze dias, para acompanhar a filha. Depois voltava para Bragança.

Foi numa dessas idas ao sul que, em setembro de 2018, Nélida e Sidney começaram a relação. Nesse mesmo mês, segundo a investigação da PJ, teriam cometido o primeiro crime juntos: o homicídio de um homem, cliente de Nélida (um crime de que acabariam por ser ilibados em tribunal por falta de provas).

ADN de Sidney foi encontrado no local do crime, mas tribunal de Faro absolveu-o

Vítor foi encontrado morto no corredor da sua própria casa, na manhã de 18 de setembro de 2018. Causa da morte? Asfixia e lesões no crânio e pescoço. Parte da habitação estava incendiada, tal como aconteceria em Bragança: o fogão tinha explodido, havia papéis queimados junto ao cadáver e uma vela apagada num quarto. Mas o que chamou a atenção dos inspetores da PJ foi uma garrafa de álcool sobre a cama — que, descobririam mais tarde, teria sido usada como combustível para as chamas. Nessa garrafa, os investigadores encontraram um perfil de ADN que pertencia a Sidney.

"O que chamou a atenção dos inspetores da PJ foi uma garrafa de álcool sobre a cama — que, descobririam mais tarde, teria sido usada como combustível para as chamas. Nessa garrafa, os investigadores encontraram um perfil de ADN que pertencia a Sidney"

A vítima era conhecida de Nélida. Era, aliás, um dos seus clientes: no ano de 2018, “prestou, pelo menos em três ocasiões distintas, favores sexuais a Vítor, na sua residência”, lê-se no acórdão. E, no final da investigação, era claro para a PJ o que tinha acontecido: entre as 22h de 17 de setembro e 9h30 do dia seguinte, Nélida teria ido a casa de Vítor para “seduzi-lo à prática de relações sexuais”. O homem terá aberto a porta e seguido com ela para o quarto.

Encontrados dois mortos com sinais de violência em habitação em Bragança

Enquanto isso, Sidney teria entrado na casa para roubar dinheiro e objetos de valor. Consigo teria levado um objeto que usaria para agredir Vítor: as primeiras agressões teriam acontecido no quarto e continuado até ao corredor, para onde o homem ainda conseguiu fugir e onde o seu corpo viria a ser encontrado. Depois, teria levado 500 euros da carteira de Vítor assim como o seu telemóvel. Por fim, teria ligado o forno para libertar gás, acendido uma vela num dos quartos, espalhado álcool pela casa e ateado fogo nuns papéis junto ao corpo de Vítor.

O casal terá assaltado quatro bombas de gasolina no sul do país

Getty Images/iStockphoto

O casal acabou por ser detido e julgado. Em tribunal, Nélida confirmou que conhecia Vítor e que tinha estado com ele “duas ou três vezes”, mas “de todas as vezes ele estava bem”. Esclareceu ainda que costumava levar consigo um “estojo com diverso material para usar nas relações sexuais”, incluindo um frasco de álcool. Mais: algumas vezes, nas casas dos clientes, ficava “qualquer coisa esquecida ou perdida”, e Nélida tinha “memória de ter deixado um frasco de álcool na casa do falecido“, lê-se no acórdão. Sidney apenas falou em tribunal para explicar que, em meados de setembro, tinha feito “um corte na boca e, para desinfetar, usou álcool que a Nélida tinha na sua bolsa, tendo posto a garrafa na boca”. Depois disso, “devolveu a garrafa à Nélida, que a voltou a guardar na bolsa” — explicando assim o perfil de ADN encontrado na garrafa.

O Tribunal de Faro acabou por absolver o casal, escudando-se numa lei que diz “o perfil de ADN constitui uma prova a ser ponderada em articulação com as outras provas existentes no processo”. Ou seja, haver vestígios na garrafa não era suficiente para os condenar. “A verdade é que em toda a casa do falecido não foram recolhidos quaisquer outros indícios que permitam concluir pela presença dos arguidos naquele local”, lê-se no acórdão.

Depois de ilibados, Sidney e Nélida tornaram-se suspeitos de dezenas de assaltos à mão armada e de um triplo homicídio. Mas, a comprovar-se que foram os seus autores, os Bonnie e Clyde portugueses conseguiram sempre fugir à polícia. Resta saber até quando.

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça até artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.