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Tubarões na Figueira e orcas em Sines. Especialistas dizem que é normal, mas comportamento das orcas pode ser "muito preocupante"

Tubarões avistados na Figueira da Foz são inofensivos, garantem especialistas: em 440 anos de registos, só há 13 ataques comprovados. Mais estranho é o comportamento das orcas no Alentejo.

A água do mar estava especialmente calma e transparente no último dia da época balnear na Figueira da Foz — características apetecíveis para o comum dos banhistas, mas não para os surfistas que procuram as ondas do Oeste. Apesar das previsões, que apontavam para ondulação a rondar apenas um metro de altura, alguns deles acorreram às praias, mas a aventura que os esperava foi outra: eram 17h50 quando avistaram três barbatanas dorsais a vaguear pelas águas frias da Praia do Cabedelo.

Os tubarões-azuis nadam perto da superfície marinha com alguma frequência e exibem umas barbatanas com cinco a seis centímetros (muito mais pequenas e menos pontiagudas que as de um, esse, sim, perigoso tubarão branco). Só que são visíveis apenas se o mar estiver muito calmo e houver pouco vento — caso contrário, com o mar picado e agitado, passam despercebidas.

A Autoridade Marítima Nacional recebeu o alerta para o avistamento pouco depois e ordenou aos nadadores salvadores que içassem a bandeira vermelha e retirassem os banhistas da água. É que ninguém sabia que animais eram realmente aqueles, nem sequer a que espécie pertenciam, mas as barbatanas sugeriram que se tratavam mesmo de tubarões. Por via das dúvidas, não fossem ameaçar a população, o alerta foi emitido numa extensão de dois quilómetros, englobando cinco praias da região.

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Mas como depois dos avisos meteorológicos de chuva forte e trovoada que marcam esta semana vêm aí novos dias estivais propícios a banhos de sol e praia, fique desde já a saber que nada tem a temer. O mais normal mesmo é que os próprios surfistas que avistaram agora estes tubarões já tenham nadado lado a lado com estes animais sem que tenham dado pelos seus corpos esguios, velozes e longos, azuis-escuros e com barbatanas singelas em tamanho. Dois especialistas entrevistados pelo Observador partilham da opinião de que os avistamentos seriam de tubarões-azuis, também chamados de tintureiras — o nome científico é Prionace glauca —, uma espécie muito comum e abundante na costa portuguesa e em todo o Oceano Atlântico.

Tintureira juvenil nas águas calmas e transparentes na ilha de Santa Cruz, Galápagos

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Segundo João Correia, diretor executivo da Flying Sharks, uma empresa dedicada à sustentabilidade dos oceanos que estuda estes animais, os tubarões-azuis nadam perto da superfície marinha portuguesa com alguma frequência e exibem umas barbatanas com cinco a seis centímetros (muito mais pequenas e menos pontiagudas que as de um — esse,  sim, perigoso tubarão branco). Só que são visíveis apenas se o mar estiver muito calmo e houver pouco vento — caso contrário, com o mar picado e agitado, passam despercebidas. Entre as cerca de 50 espécies de tubarões e raias que existem em Portugal, outras são menos discretas: é o caso do tubarão-martelo, por exemplo.

As tintureiras são de uma espécie especialmente "curiosa", com mais tendência para se aproximar da costa sem receios. Mesmo assim, dos raros ataques de tubarão na história humana, os provocados pela tintureira são dos mais escassos de que há registo.

Mesmo quando se encontram com humanos junto à costa não costumam representar qualquer perigo: nos Açores até é comum nadar juntos às tintureiras sem qualquer proteção, nem mesmo com os fatos de malha de aço que os mergulhadores vestem para se aproximar de outras espécies. Aliás, os humanos não fazem parte do menu preferencial destes tubarões: os ‘pratos favoritos’ das tintureiras são sardinhas, cavalas e lulas. Portugal é, no entanto, um berçário para onde as fêmeas adultas acorrem, durante as suas longas migrações entre as duas costas do Atlântico, para terem as suas crias. Por isso é que, por norma, os avistamentos são de tubarões juvenis — o que terá sido o caso no último domingo.

As águas portuguesas são mesmo um berçário importante para a conservação deste espécie, acrescenta Luís Alves, presidente da Associação Portuguesa para o Estudo e Conservação de Elasmobrânquios (ACEPE): uma ninhada de tintureiras pode chegar a ter uma centena de crias — um número muito superior ao normal na maioria das espécies de tubarões  —, cada um com menos de um metro de comprimento e crescendo até perto dos quatro. É esta característica que tem permitido aos tubarões-azuis sobreviverem à extinção — numa tarde de trabalhos de marcação, João Correia consegue avistar e sinalizar 130 indivíduos da espécie —, apesar de serem considerados “quase ameaçados” pela União Internacional para Conservação da Natureza.

Apesar do ritmo a que se reproduzem, o tubarão-azul é um dos peixes mais capturados do planeta. Luís Alves diz que, nos últimos 30 anos, em média são capturadas 400 toneladas deste animal anualmente. Uma parte costuma ser exportada para Espanha, outra é consumida por cá e entra na gastronomia com um nome diferente. O cação, peixe com o qual se faz sopa, sobretudo na região do Alentejo e Algarve, é uma espécie de tubarão, mas a nomenclatura tem sido utilizada indiscriminadamente para outras espécies. A tintureira é uma delas.

Um tubarão-azul nas águas de Rhode Island, Estados Unidos.

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Luís Alves concorda com João Correia e com o comandante do Porto da Figueira da Foz, João Lourenço: estes devem mesmo ser os animais que surpreenderam os surfistas no domingo, até porque são de uma espécie especialmente “curiosa”, com mais tendência para se aproximar da costa sem receios. Mesmo assim, dos raros ataques de tubarão na história humana, os provocados pela tintureira são dos mais escassos de que há registo. O tubarão-branco é responsável pelo maior número de ataques — 333, segundo o Ficheiro Internacional de Ataques de Tubarão —, enquanto da tintureira só se tem registo de 13 ataques desde 1580, quatro dos quais fatais.

Ainda assim, nenhum dos dois especialistas considera exagerada a decisão da Autoridade Marítima Nacional para desaconselhar os banhos nas praias da Figueira da Foz: afinal, dificilmente um leigo consegue distinguir as espécies de tubarões com que se cruza olhando apenas para a barbatana dorsal; e, de resto, ver uma a pairar sobre a superfície do mar é sempre um susto para quem não está familiarizado com estes animais. Mas Luís Alves assegura que quem olhar para uma tintureira de perto e se deparar com a elegância dos seus movimentos, os olhos arredondados e as barbatanas de pontas suaves, verá como afinal até pode ser considerado um animal “fofinho”.

Interação com orcas em Sines pode ser “muito preocupante”

Já esta segunda-feira, o comandante João Lourenço afirmou ao Observador que não voltou a haver qualquer avistamento de tubarões na Figueira da Foz. À Agência Lusa, a capitania disse mesmo que, embora estes fenómenos sejam poucos frequentes, não são inéditos: João Lourenço recordou que uma prova de bodyboard em Quiaios, a norte da Figueira da Foz, foi suspensa há uns anos devido à presença de um tubarão-frade, que é o segundo maior peixe do mundo, portador de uma gigantesca mandíbula que filtra a água, mas que também é inofensivo para humanos, alimentando-se de plâncton e pequenos peixes.

Mesmo sem intenções de ferir os animais, o comportamento deles pode ser alterado como resultado "de um incidente negligente, de uma distração ou mesmo uma manobra fortuita": "Estas ocorrências são preocupantes, pois as orcas (como muitos outros cetáceos) criam novas rotinas e comportamentos que podem tornar-se comuns e, no caso de interação com outros grupos de orcas, generalizá-los".

Mas mais a sul, em Sines, outro avistamento mais “preocupante” captou a atenção do diretor da CascaiSea, uma organização de proteção marinha sediada em Cascais: ao longo do fim de semana, foram vistas orcas a interagir com um bote junto à bóia vermelha de resguardo ao molhe do porto. Miguel Lacerda, mergulhador profissional, disse no Facebook que este comportamento é de estranhar “quando o leme já não é só o foco das orcas”. Outros episódios semelhantes foram registados ao longo da costa alentejana, causando danos nas embarcações. O mesmo tem acontecido com frequência em Espanha, quer na costa da Galiza, quer no Mediterrâneo, nestes casos não só com orcas, mas sobretudo com baleias.

https://www.facebook.com/miguel.lacerda.9/posts/5023887957640640

Vários estudos sobre as orcas — muitas vezes também chamadas “baleias assassinas”, apesar de serem, na verdade, um golfinho — dizem que, nestes aparentes ataques, os animais estão antes a brincar: gostam de se focar no leme porque é a parte mais móvel da embarcação e interagem com ele ao ponto de conseguirem rodar completamente o barco, alterando a sua direção. Mas não há qualquer registo de ataque mortífero a humanos — aliás, quando caçam atuns-rabilho, que se movem ao longo da costa portuguesa na sua rota migratória, as orcas costumam ser mais discretas e furtivas do que nas interações registadas com barcos.

Então, o que justifica os estragos que têm provocado e o seu comportamento “estranho”? Em primeiro lugar, as características do próprio animal: afinal, mesmo que esteja somente a brincar na água com os pescadores que as visitam, uma orca macho pode ter até 10 metros de comprimento, uma barbatana com quase dois e pode atinge as 10 toneladas. Mesmo as crias já nascem tão grandes como um tubarão-azul: têm, em média, 2,50 metros (o tamanho médio daquele tubarão) e 180 quilogramas (a tintureira costuma ter 110 quilos).

Em segundo lugar, acrescenta Miguel Lacerda, o comportamento dos próprios humanos, que também se alterou: “Hoje há muitos telemóveis no mar, há uma enorme vontade em registar imagens e partilhar, isto leva a muitos comportamentos inadequados, negligentes e invasivos“, alertou o mergulhador. No caso do incidente captado em vídeo, segundo a descrição do especialista, os marinheiros pararam o barco e andaram à ré (na parte detrás do barco). A atenção das orcas ter-se-dá desviado do leme para o bote amarelo, provavelmente por causa da sua movimentação na água.

Orcas fêmeas nadam com as crias

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Mesmo sem intenções de ferir os animais, o comportamento deles pode ser alterado como resultado “de um incidente negligente, de uma distração ou mesmo uma manobra fortuita”: “Estas ocorrências são preocupantes, pois as orcas (como muitos outros cetáceos) criam novas rotinas e comportamentos que podem tornar-se comuns e, no caso de interação com outros grupos de orcas, generalizá-los. Havendo crias neste grupo já com este tipo de comportamento, tendo em conta a longevidade das orcas (até 60 anos, no caso das fémeas), a situação é muito preocupante”. Por isso é que o mergulhador insiste para que o comportamento das orcas continue a ser investigado.

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