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O humorista Diogo Batáguas estava desde dezembro de 2022 afastado do Youtube, ao fim de quatro anos consecutivos do programa "Relatório DB", no qual analisava humoristicamente os temas que marcavam o mês
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O humorista Diogo Batáguas estava desde dezembro de 2022 afastado do Youtube, ao fim de quatro anos consecutivos do programa "Relatório DB", no qual analisava humoristicamente os temas que marcavam o mês

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

O humorista Diogo Batáguas estava desde dezembro de 2022 afastado do Youtube, ao fim de quatro anos consecutivos do programa "Relatório DB", no qual analisava humoristicamente os temas que marcavam o mês

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Um ano depois, Diogo Batáguas está de volta ao Youtube: “Investimos para fazer uma coisa com mais condições do que muitos programas de TV"

A versão renovada do programa do humorista no Youtube tem estúdio, equipa de guionistas, público ao vivo e periodicidade quinzenal. Estivemos nos bastidores do primeiro "Conteúdo do Batáguas".

Durante quatro anos, o comediante Diogo Batáguas alimentou uma rubrica mensal no seu canal do Youtube em que analisava humoristicamente os temas que marcavam o mês. Visto por cerca de 400 mil pessoas, o Relatório DB tornou-se um autêntico fenómeno até ter terminado em dezembro de 2022, deixando refém um séquito de fãs que via neste “vídeo-resumo” uma forma de acompanhar a atualidade noticiosa — algo que o comediante de 38 anos sempre encarou com apreensão.

“Eu não sei de nada porque já não há relatório”, “O mundo precisa do relatório”, “Sinto-me desinformado da atualidade, Batáguas, volta com o Relatório DB, por favor”, lê-se na caixa de comentários do Instagram do humorista de Almada, que no início do mês publicou uma fotografia com uma descrição sucinta: “Tanto conteúdo”.

O teaser cumpriu-se esta segunda-feira. Diogo Batáguas está de volta ao Youtube, à análise da atualidade informativa com filtro humorístico, aos sketches e inside jokes que foram crescendo com a comunidade que o acompanha. “Não é o Relatório, tem outro nome. É sobre a atualidade, mas vai ser divertido”, explica ao público segundos antes de começar a gravar. Cerca de 60 pessoas escolheram passar a noite num armazém no Lumiar, em Lisboa, a assistir à gravação do primeiro Conteúdo do Batáguas, o novo programa do humorista, produzido pela Kilt, a agência responsável por webséries como O Resto da Tua Vida, Clube da Felicidade e Vai Correr Tudo Bem ou o programa Falsos Lentos.

[o primeiro episódio do “Conteúdo Batáguas”:]

Não sendo o Relatório, a receita é semelhante. Sentado à secretária, Diogo Batáguas enfrenta a câmara e durante cerca de uma hora lança-se aos temas que marcam a atualidade informativa: os 75 mil euros encontrados no gabinete de Vítor Escária, a crise política na Madeira, a polémica residência em Angola de Maló de Abreu, a manifestação da extrema-direita em Lisboa, a detenção de elementos ligados à claque do Futebol Clube do Porto. A dose repete-se agora de quinze em quinze dias — “um compromisso justo”, define o humorista, que esteve um ano ausente do Youtube, se excluirmos a participação semanal no programa de comentário (nem sempre) desportivo Falsos Lentos.

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“Estava a ficar um bocado cansado de fazer aquele conteúdo e precisava de limpar a cabeça”, explica ao Observador sobre a longa pausa, depois de um 2022 “difícil”. “Tive quase 100 espetáculos de stand-up. Fazia o Relatório, às vezes, entre Estarreja e Guimarães, ia a escrever no carro, a editar a caminho de Lisboa. Parecia o Quim Barreiros, todos os dias tinha espetáculos, às vezes mais do que um por dia. Pesquisava e editava sozinho. Era muito solitário e muito cansativo. Decidi parar antes de ficar a odiar aquilo.”

Tanto a fazer stand-up como a apresentar, Diogo Batáguas diz-se permanentemente "nervoso", mas os seus pares reconhecem a naturalidade com que enfrenta a câmara

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Com o dinheiro amealhado com a extensa tour de Processo (espetáculo de stand-up que versava sobre o facto de o humorista ter estado envolvido em diversos processos judiciais, um deles com o juiz Neto de Moura, outro com o cantor David Carreira), escolheu passar um ano “a descansar”. Foi em setembro último que começou a desenhar o regresso com o programa que agora se estreia. “Mais tarde ou mais cedo tinha que voltar a trabalhar, não podia ficar desempregado para o resto da vida”, constata. “Fiquei a pensar num formato que fosse ao encontro das expectativas”.

Se as semelhanças são evidentes, Batáguas faz por sublinhar as diferenças face ao conteúdo anterior. A começar: a escala. O primeiro Relatório DB foi publicado em fevereiro de 2019 e era gravado numa parede do escritório da agência Kilt. O cenário, o equipamento técnico e o tamanho da equipa que agora agilmente se vai movimentando no estúdio denunciam uma profissionalização do produto. “Investimos para fazer uma coisa com mais condições do que muitos programas de televisão. Foi um passo em frente que decidimos dar”, assume. “É complicado lutar contra todos os players que há no mercado, todos os dias aparecem putos novos, todos os dias tens de lutar contra a malta que faz coisas inacreditáveis, hilariantes, só com o telemóvel e com o Tik Tok. Decidimos ir à guerra dando um passo em frente em termos de profissionalização e tentar surpreender pela qualidade de tudo o que é feito.”

“É complicado lutar contra todos os players que há no mercado, todos os dias aparecem putos novos, malta que faz coisas inacreditáveis, hilariantes só com o telemóvel e com o Tik Tok. Decidimos ir à guerra dando um passo em frente em termos de profissionalização e tentar surpreender pela qualidade de tudo o que é feito”

Ter público a assistir, outra das novidades, foi uma consequência das bem-sucedidas experiências de Relatório DB ao Vivo, espetáculo que encheu duas vezes o Sagres Campo Pequeno, em Lisboa, e outras duas o Super Bock Arena, no Porto. “Achei que fazia parte desse passo em frente. Os quatro relatórios ao vivo correram bem, divertimo-nos. Achámos que voltar a fazer uma coisa demasiado parecida com o relatório não fazia sentido sem lhe chamar relatório. Se ia voltar com conteúdo sobre a atualidade não fazia sentido que fosse colado ao programa anterior. Não só demos um passo em frente em termos de condições técnicas como decidimos: se é para ser, metam aí malta ao vivo, fazemos isto como se fosse um programa de televisão do caraças”.

O público e a envergadura da produção são detalhes que aproximam o formato do que poderia ser uma produção televisiva. Ainda assim, o humorista diz que nunca lhes passou pela cabeça propor o programa, patrocinado pela Worten, a um canal de televisão. “Nunca fui abordado, e também a quem é que vou pedinchar? Não vale a pena. Só há um ou dois diretores de programas que se tivessem interesse também já tinham [demonstrado]. Não tens de abordar diretamente com um convite formal, mas quando sentes que começa a haver interesse, há pessoas que pensam em pairar, a querer saber se gostava, se pensava…. Nunca apareceu ninguém.”

À esquerda: Amália, 81 anos, foi chamada para interpretar o texto que visa Fernando Madureira, líder da claque portista Super Dragões e um dos principais arguidos na Operação Pretoriano

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Conquistar um espaço no pequeno ecrã só lhe traria uma vantagem, crê: “financeira”. “As televisões têm dinheiro, mas mesmo assim só em horário nobre. Este programa se calhar já tem mais meios. Já está aqui mais dinheiro do que na maior parte dos canais de cabo”, comenta. A base de fãs do comediante tem sido construída exclusivamente a partir dos canais digitais. “A partir do momento em que me profissionalizei, ou tentei, na comédia, nunca trabalhei em nenhum órgão de comunicação, nenhum meio tradicional. Tudo o que correu bem na minha carreira de comédia foi a fazer coisas sozinho, à minha maneira”, reflete. A liberdade criativa que conquistou permite-lhe pisar a linha, correr riscos — os mais ousados, acabam no Patreon, onde muitos pagam uma subscrição para ter acesso a conteúdos exclusivos. “Há aqui coisas que não podia dizer na SIC, na TVI ou em nenhum sítio. Financeiramente talvez me acrescentasse, mas isto é muito mais divertido. Escolhi a minha equipa, divirto-me com os meus amigos.”

Mais guionistas, novas rubricas e uma aposta: Vítor Sá

Há muito que Diogo Batáguas ambicionava uma equipa que o acompanhasse na escrita. “É menos triste escrever com outras pessoas”, nota o humorista formado em Jornalismo, que só se aventurou na comédia aos 27 anos. “Era muito trabalhoso escrever sozinho um programa daquele grau de pesquisa. Não queria mais aquilo para a minha vida. Consegui meios e dinheiro suficientes para pagar a pessoas para me ajudar em todas as áreas. Não sou eu que vou editar este programa. Claro que vou estar na edição, mas não vou estar eu à noite a transferir brutos, a descarregá-los de madrugada, estar a editar madrugada fora como fazia antes. Era uma tortura. Pensei: não tenho idade para isto. Vamos fazer as coisas como devem ser e alocar malta para as suas competências. Ainda por cima são pessoas mais competentes do que eu.”

Na plateia do programa estiveram cerca de 60 pessoas, as primeiras a responder ao apelo lançado no Patreon, plataforma em que subscritores pagam uma mensalidade para ter acesso a conteúdos exclusivos

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Para a equipa de guionistas de Conteúdo do Batáguas, reuniu Vítor Sá, Rui Cruz e Sérgio Fernandes. Sendo os dois primeiros humoristas, Sérgio Fernandes surge como a carta fora do baralho. “Fui buscar um gajo de fora, sem vícios, para acrescentar uma espécie de uma canada de estranheza e de bizarria a isto”, explica ao Observador. “Além de escrever muito bem, a profissão dele é literalmente corretor de texto, é das pessoas que têm maior vocabulário que conheço. Todas as ideias que ele traz são muito inesperadas, muitas são horríveis, mas as que são boas são mesmo muito engraçadas porque acrescentam sempre pontos de vista inesperados. A frescura e o inesperado no humor é fundamental.”

Além de escrever, Vitor Sá, agenciado também pela Kilt, revela-se como uma aposta clara, assumindo em Conteúdo do Batáguas o papel outrora desempenhado por Luana do Bem, que despontou precisamente no Relatório DB, e que se tem afirmado como um nome relevante da nova cena da comédia portuguesa (houvesse dúvidas, basta lembrar a forma apoteótica como foi recebida no Campo Pequeno na versão ao vivo de Relatório DB). “O Vítor Sá vai ser aqui um bocado o pau para toda a obra e a figura que vai entrar nos sketches ou se tiver que ir a manifestações de pessoas que à partida são menos aconselháveis, vai ele que é para não ser eu a apanhar a boca”, diz Batáguas entre risos.

“Há aqui coisas que não podia dizer na SIC, na TVI ou em nenhum sítio. Financeiramente [estar na televisão] talvez me acrescentasse, mas isto é muito mais divertido. Escolhi a minha equipa, divirto-me com os meus amigos”

No programa que chegou ao Youtube esta segunda-feira, já é possível perceber o papel preponderante de Sá, bem como conhecer as novas rubricas, como “A coisa mais parva dita em 2024”, no que se prevê que culmine numa votação no final do ano, ou “Kilt realiza sonhos”, em que o humorista desafia os seus produtores a aceder aos seus desejos. Vale recordar a viagem à Lapónia depois de uma “história” no Instagram de Jéssica Athayde em que a atriz denunciava a presença de renas numa feira de natal em Oeiras. “Se queres ver renas felizes não é em Algés”, disse então Batáguas, que foi à Finlândia em busca dos animais sorridentes. No ano seguinte, o Relatório DB viajou ao Japão só para entregar uma garrafa de vinho a um fã.

Jon Stweart “é um guideline para como fazer bem”

Quis o destino que Diogo Batáguas retornasse ao ativo na mesma altura em que o emblemático Jon Stewart regressou ao seu Daily Show quase uma década depois (“Eu estava a trabalhar nisto há mais tempo”, troça o comediante de Almada). O programa de sátira política norte-americano e Stewart em particular é a maior referência do humorista português. “Ele é realmente realmente extraordinário. É perfeito. É a entrega perfeita, a inteligência, as pausas, a leitura do teleponto, a forma como ele interage, como deixa o público chegar primeiro quando é para chegar primeiro. É uma guideline para como fazer bem”, descreve. Além de ser “o pai daquela gente toda, de tantos gajos que nasceram ali de serem o número dois: o Stephen Colbert, o John Oliver, a Samantha Bee, o Ed Helms, o Steve Carell, que era correspondente. O Jon Stewart é o pai de uma carrada de gajos que agora são gigantescos”. Batáguas recorda o momento em que assistiu à estreia na última segunda-feira do renovado Daily Show. “Estava a ver aquilo e estava quase a chorar a ver aquilo, de emocionado. Como é que é possível o gajo ser tão bom?”

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Não é exagero dizer que, no universo do humor português, no espaço digital, Diogo Batáguas se destacou no formato, entretanto por outros replicado, mas sem o mesmo impacto. “Era estranho quão bom ele era a fazer aquilo”, descreve-o Pedro Teixeira da Mota, num episódio recente do podcast Watch.™, ainda antes do anúncio do regresso do “não-relatório”.

Por isso é surpreendente a timidez do humorista, que vai colhendo elogios após a gravação do programa. “Estou sempre nervoso ali, sempre. A minha vida é estar nervoso. No stand-up estou nervoso”, diz ao Observador. Ser humorista terá sido a decisão mais acertada? “É uma questão”, concorda. “Odeio falar em público. Sou desajeitado, com pessoas. Não tenho um jeito natural. Não gosto que muita gente olhe para mim. Mas sim, quis fazer um programa com o público e faço stand-up”, ri. “É um trabalho. Tenho de me forçar, tenho de me obrigar. Mas passo mal. Fico nervoso e ansioso com a perspetiva de ter de falar em público. Pronto. E daqui a 15 dias há mais.”

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