Índice

    Índice

O Rock in Rio Lisboa inaugura esta semana a época balnear dos festivais, ainda que o único banho que possa esperar por lá seja um banho de multidão. Mas se o Rock in Rio não for a sua praia, poderá sempre mergulhar na piscina do festival Milhões de Festa, em Barcelos. Ou seja, nisto dos festivais — como na vida — há sempre uma tampa para cada panela. Escolha a sua:

Rock in Rio Lisboa (19, 20, 27, 28 e 29 de maio)

Para quem gosta de “tudo desde que seja bom”

Porque quem costuma dizer isto é porque não gosta de nada em especial e só pessoas com esse nível de tolerância conseguem entusiasmar-se com um cartaz que vai de Bruce Springsteen a Avicii, de Real Estate a Ivete Sangalo. No entanto, uma boa parte das pessoas que conseguem dizer com veemência “eu vou!” nutre maior entusiasmo pelas ativações de marca presentes no festival. Ou seja, enquanto a Ariana Grande estiver a cantar, é provável que muita gente prefira ficar numa enorme fila à espera de um pequeno brinde. A parte comercial garante, talvez mais do que em qualquer outro festival, uma boa fatia do entretenimento no Parque da Bela Vista. É uma espécie de passeio de domingo para muitas famílias com crianças, pelo que essa espécie de feira popular acaba por ganhar particular importância.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

NOS Primavera Sound (de 9 a 11 de junho)

Para quem não só gosta de música como também aprecia a coleção primavera-verão daquela loja cujo nome começa por H e acaba em M

Diz a canção que, se forem a São Francisco, devem usar flores no cabelo. O NOS Primavera Sound, no Parque da Cidade, no Porto, é mais ou menos a mesma coisa e até costuma providenciar esse adereço. Tal como na sua versão espanhola, que decorre dias antes em Barcelona, é um festival frequentado por pessoas com bastante empenho em ser blasé. A elegância é apanágio, até na forma como o espaço está desenhado para que a presença das marcas não seja tão agressiva. Só não há elegância na zona da restauração porque nenhuma cinturinha resiste às coqueluches da gastronomia portuense ali representadas, como a sandes de pernil com queijo da serra da Casa Guedes. No cartaz, mais indie, há sempre um ou outro “velhinho moderno”, como cantava o Fernando Girão, a garantir transversalidade, sempre com coerência. Este ano, Brian Wilson revisita a obra-prima dos Beach Boys, Pet Sounds.

NOS Alive (de 7 a 9 de julho)

Para os festivaleiros do asfalto que cresceram nos anos 90 e que viam os Pearl Jam ao vivo todos os anos se pudessem

É provavelmente o festival português mais referenciado no estrangeiro e tem quase sempre uma ou outra data esgotada. Ao longo do tempo, foi-se tornando sobretudo um evento social mas sempre tentando articular a parte comercial com a parte musical. Pode dizer-se, por isso, que é o U2 dos festivais: há quem ache que dantes é que era bom, mas agora é que é realmente grande. Enquanto o Rock in Rio já nasceu como é, o Alive quer cada vez mais chegar a toda a gente mas ainda manter-se fiel ao público trintão que o viu nascer. É por isso que coisas estranhas acontecem: este ano, apesar do cartaz mais alternativo, Agir vai partilhar o palco com os Arcade Fire. Já os Radiohead, que atuam no dia anterior, irão sempre levar com um ou outro bêbado a gritar “Toca o Creep!”.

Super Bock Super Rock (de 14 a 16 de julho)

Mais do que nunca, para os mesmos de sempre

A primeira edição deste festival foi há 22 anos e, desde então, já passou por muitas mutações: começou no Passeio Marítimo de Alcântara, em Lisboa, depois espalhou os concertos por várias salas lisboetas ao mesmo tempo, voltou à beira-rio no Parque Tejo e passou pelo Meco até regressar agora à cidade, mais concretamente ao Parque das Nações. No que toca à música, foi sempre mais ou menos coerente — entre as velhas glórias (por lá passaram David Bowie e Prince) e nomes alternativos bem firmados (dos Pixies aos Strokes). Mas, quando passou pelo Meco, o seu público — geralmente melómano e fiel — ficou confuso entre a chinela no pé e o stress do trânsito para chegar ao recinto. O dia do concerto de Prince é ainda recordado por muitos como o Vietname dos festivaleiros. Porém, desde o ano passado que o SBSR regressou ao betão e, ainda que menos veraneante, cumpre melhor as exigências do seu público.

Milhões de Festa (de 21 a 24 de julho)

Para quem sempre quis ir à Piscina Municipal de Barcelos mas não tinha um bom pretexto

É um pequeno festival com um grande culto. O blasé empenhado referido a propósito do NOS Primavera Sound tem também expressão no Milhões de Festa, mas de outra forma: os seus indefetíveis passam bastante tempo do festival no palco da Piscina Municipal de Barcelos e é importante pensar num biquíni, num calção de banho ou num adereço insuflável que exprima identidade. A magia passa muito por essas tardes de molho, mas há motivações para todos os gostos: muitos vão pelo convívio, pela boa vida (e boa comida de Barcelos), pela diversão festivaleira longe de multidões e pelo sentido de pertença a uma comunidade mais seleta. A programação do festival é desafiante, por vezes até difícil, e — apesar de alguns valores seguros, como o regresso de El Guincho este ano — só serve o gosto de quem arrisca e tem vontade de desbravar.

FMM Sines – Festival Músicas do Mundo (de 22 a 30 de julho)

Não, já não é só para freaks

O FMM — e o entendimento generalizado do que é a música do mundo — já ultrapassou o estigma das rastas e do pé descalço. O preconceito enfiava tudo no mesmo saco, transformava o termo num género e os apreciadores num estereótipo, mas estamos a falar de muitas idiossincrasias sonoras para um público cada vez mais diversificado. Há muitas férias que passam por ali e é claro que vão muitos festivaleiros que gostam de se abraçar às árvores e tocar o seu djembé, mas é possível que os encontremos mais fora dos concertos, a viver e a contribuir para a vibração da cidade.

Meo Sudoeste (de 3 a 7 de agosto)

Para quem só conhece este milénio

Na sua primeira edição, em 1997, o Sudoeste era rock, boleias e dormir ao relento. OK, éramos jovens, mas bandas como os Blur ou os Suede eram para todas as idades. Só que a indústria da música e da juventude mudou muito desde então. Ao longo dos anos, cada vez mais gente começou a ir “pelo convívio”, por umas férias na Zambujeira do Mar (em muitos casos, as primeiras longe dos pais), independentemente do cartaz. A música tornou-se banda sonora para o convívio, muito mais instrumento de diversão do que de emoção, e o Sudoeste surge, neste roteiro festivaleiro, como um ritual iniciático — na vida de uma pessoa, algures entre o Festival Panda e o Alive.

Bons Sons (de 12 a 15 de agosto)

Para quem se queira sentir em casa

Em casa, em todos os sentidos: porque só se ouve música portuguesa (de todos os géneros, este ano das Adufeiras do Paúl às Pega Monstro) e porque as casas da aldeia de Cem Soldos, perto de Tomar, abrem de facto as suas portas aos visitantes deste festival. É um festival feito pela aldeia, com preocupações sociais e ambientais, cujo bilhete é o mais barato de todos os festivais aqui referidos — por isso, bom para férias pelintras longe da cidade e também para a burguesia em busca de redenção.

Vodafone Paredes de Coura (de 17 a 20 de agosto)

Para neuróticos e nostálgicos dos dias de chuva

É o festival mais verde desta lista — a que faltam tantos festivais, mas ficarão para o ano. É, para uma geração de nostálgicos precoces, aquele cenário idílico onde carpiram neuras ao som de Red House Painters, Tindersticks ou National. Representava as férias no campo dos urbano-depressivos e continua a manter uma boa parte desse romantismo original, ainda que com uma afluência cada vez maior (datas esgotadas na edição do ano passado). Esta afluência faz com que o conceito inicialmente atrativo de “festival numa praia fluvial” nos faça temer cada vez mais pelo que vamos encontrar a flutuar no Rio Tabuão, mas quem se quiser molhar pode sempre contar com um ou outro dia de chuva, que já não assusta os habitués há muito tempo. Até porque, no cartaz, valores mais altos se levantam: este ano, por exemplo, o regresso dos LCD Soundsystem.

Reverence Valada (de 8 a 10 de setembro)

Para quem não acredita na salvação mas sim no rock

Desta lista, é o festival que já está vai-não-vai com o fim da temporada do caracol. E calha bem porque desde há um par de anos que se assumiu como a despedida do verão — pelo menos ao nível dos palcos, já que com isto do aquecimento global e fenómenos afins as estações do ano já não são o que eram. Pois bem, mas em Valada do Ribatejo tudo é o que sempre foi. E tudo aqui é rock’n’roll, vestido de escuro, cabedal, suado, bem bebido, psicadélico, distorcido, mal-educado (em bom) e outros clichés que não se recusam. O cartaz vai dos Sisters of Mercy aos Thee Oh Sees e a ideia é fazer do público um espelho do que se passa nos palcos: isto das guitarras não tem idade, caros amigos, nunca teve nem vai ter.

Ana Markl é guionista, apresentadora no Canal Q e animadora de rádio na Antena 3