Apesar de não haver grande margem de dúvida de que as alterações climáticas são uma realidade e estão a provocar consequências graves no Ambiente e às várias formas de vida no planeta, o tema continua a motivar publicações nas redes sociais de quem se mostra abertamente cético em relação a essas alterações. Desta vez, o foco recai sobre a Antártida.
No Facebook, está a ser circular uma publicação que levanta dúvidas sobre o aumento da temperatura na Antártida. Pode ler-se que os cientistas “não conseguem entender porque a Antártida não aquece há 70 anos”. A legenda vai ainda mais longe e classifica o fenómeno não como alterações climáticas, mas sim como “ansiedade climática“. E explica: “Ansiedade climática é uma doença mental que aflige os políticos e o povo sofre as consequências.”
Sem surpresas, a publicação não apresenta qualquer informação adicional que comprovem a referência. Uma rápida pesquisa não encontra quaisquer notícias sobre a Antártida não aquecer “há 70 anos”.
Aliás, a realidade é bem diferente. Somam-se as notícias que alertam para o impacto do aumento da temperatura na Antártida. Recentemente, um relatório divulgado pela Agência Espacial Europeia revelou que a perda de gelo na Gronelândia e na Antártida é responsável por um quarto do aumento do nível do mar e que esse aumento “quintuplicou desde a década de 90”.
Perda de gelo na Gronelândia e Antártida contribui para um quarto do aumento do nível do mar
Entre 1992 e 2020, a ilha da Gronelândia e a Antártida perderam “7,56 biliões de toneladas de gelo” e o degelo atingiu “o pico” em 2019, “impulsionado por uma onda de calor no Ártico”. No mesmo sentido, a revista científica Nature publicou, em março deste ano, uma investigação que mostrava como, num período de 25 anos, a enseada do mar de Amundsen, na região da Antártida, tinha perdido mais de 3 mil milhões de toneladas de gelo.
Com base nestes dados, a agência de notícias Europa Press fez a seguinte comparação: se o gelo perdido fosse empilhado em Londres, mediria “dois quilómetros de altura”; e se cobrisse Manhattan, “atingiria os 61km”. Os dois estudos mostram que os degelos têm a mesma causa: o aumento da temperatura.
No ano passado, em fevereiro, os círculos polares atingiram temperaturas recorde: Pela primeira vez os termómetros da estação de Concordia marcaram -11.8ºC, 40 graus acima do habitual nesta altura do ano; e os termómetros da estação Vostok -17.7C, 15 graus acima do recorde anterior. De acordo com a Associated Press, a temperatura média do continente tinha sido 4,8ºC mais elevada do que a registada até aos anos 2000.
Extraordinary anomalies in #Antarctica lead to historic records today:
-Vostok 3489m -17.7C,monthly record beaten by nearly 15C !
-Concordia 3234m -12.2C,highest Temp. on records and about 40C above average !
-Dome C II 3250m -10.1C
-D-47 1560m -3.3C
-Terra Nova Base 74S +7.0C pic.twitter.com/w6Ry4Dy4wz— Extreme Temperatures Around The World (@extremetemps) March 18, 2022
De um lado, são vários os estudos e as investigações que alertam para o aumento da temperatura na Antártida e para o ritmo de degelo do continente. Do outro, não há informação que sustente o que é escrito nas redes sociais, de que a Antártida não aquece “há 70 anos”.
O consenso científico em torno do impacto das alterações climáticas também não deixa espaço para dúvidas. A Comissão Europeia deixa claro que a década de 2011 a 2020 foi “a mais quente alguma vez registada” em todo o mundo, tendo a temperatura média, em 2019, ter sido 1.1ºC superior aos níveis pré-industriais (antes de 1750). Não há dúvidas sobre o impacto, nem sobre as causas. “A principal causa das alterações climáticas é o efeito estufa” e as atividades humanas estão a causar um aumento das concentrações de alguns gases como o dióxido de carbono.
No site da Comissão Europeia pode ler-se que “o CO2 resultante das atividades humanas é o principal responsável pelo aquecimento planetário. Em 2020, a sua concentração na atmosfera tinha aumentado para 48% acima do seu nível pré-industrial.”
Conclusão
Não há provas de que a temperatura não aumente “há 70 anos” na Antártida, como é escrito no Facebook. Estudos, investigações e especialistas apontam no sentido contrário. Em 2022, foram atingidas temperaturas recorde, algumas 40 graus acima do habitual. São as elevadas temperaturas que levam a um degelo sem precedentes, responsável por um quarto do aumento do nível do mar e que na Antártida e na Gronelândia “quintuplicou” nos últimos 30 anos.
Perda de gelo na Gronelândia e Antártida contribui para um quarto do aumento do nível do mar
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
ERRADO
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.