O incidente com um navio-cargueiro que, esta terça-feira, ficou encalhado no canal Suez teve um impacto mundial na economia mundial. Ponto de passagem de dezenas de embarcações de carga por dia, não demorou muito até que se tentasse encontrar o responsável pelo bloqueio daquela passagem marítima. No WhatsApp, o recorte de um artigo do jornal saudita Arab News, partilhado milhares de vezes nas últimas horas, apontava o dedo a Marwa El Selehdar — a primeira mulher egípcia a tornar-se capitã de navio no país. Mas a acusação é falsa.

Em cima a imagem que está a ser partilhada nas redes sociais e que foi manipulada; em baixo, o artigo original

A imagem partilhada no WhatsApp — e cuja versão se espalhou rapidamente a outras redes sociais — mostra o cabeçalho do site do Arab News, com as várias secções do jornal. Depois, lê-se o suposto título de uma notícia com ligação a um acontecimento recente: “Navio de carga embate no canal Suez. Primeira mulher árabe a tornar-se capitã [está] envolvida no acidente.” E, finalmente, por baixo do título, a fotografia da capitã Marwa El Selehdar. Mas nem tudo bate certo aqui.

Navio gigante fica encalhado no Canal de Suez e cria engarrafamentos

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Comecemos pelo que está certo: Marwa El Selehar foi, de facto, a primeira mulher a tornar-se capitã de navio no Egipto. Num artigo recente, o mesmo Arab News conta que El Selehar terminou a sua formação em 2013 e que, desde esse momento, quebrou uma série de barreiras como capitã. Foi, de resto, homenageada pelo presidente egípcio Abdel Fattah El-Sisi no Dia da Mulher, em 2017. Além disso, a fotografia do recorte em que se acusa El Selehar de paralisar o Suez corresponde à capitã egípcia.

Fotos. Navegação no Canal do Suez fica suspensa até navio ser desencalhado

Mas tudo o resto é falso. Explicamos: o artigo que conta a história de Marwa Elselehar foi adulterado. O título original — onde se lia que “a primeira mulher egípcia capitã de navios está a navegar ondas de sucesso” — foi adulterado. A nova versão refere que um “navio cargueiro encalhou no canal do Suez” e que a “primeira mulher capitã de navios [do Egipto está] envolvida” naquele incidente. A intenção era atribuir à capitã, agora com 30 anos de idade, a responsabilidade direta pela acidente e descrredibilizar a capacidade de as mulheres árabes desempenharem aquelas funções.

https://www.instagram.com/p/CMz7N9bFw4b/

Mas a própria já veio desmentir a sua ligação ao caso que está a ter implicações no comércio mundial. Num vídeo publicado na sua conta de Instagram, El Selehar explicou que a informação que a relaciona com o incidente no Suez não passa de “fake news”. A capitã, que continua no ativo, está atualmente a comandar a embarcação AIDA IV, que opera ao serviço do governo egípcio. Não é, por isso, responsável pelo navio de carga Ever Given, da empresa Evergreen, que encalhou naquele importante canal marítimo que liga o mar Mediterrâneo ao mar Vermelho, através do território egípcio. O navio tem bandeira do Panamá.

Em declarações a meios de comunicação social egípcios, El Selehdar explicou que trabalha para a Autoridade Egípcia de Segurança Marítima e considerou que as imagens que a associam ao incidente têm por base uma “campanha organizada” de desinformação e difamação. De acordo com a capitã, nas últimas horas foram criadas três contas diferentes no Twitter, todas com a sua imagem, todas elas falsas, e que acumularam rapidamente mais de 20 mil seguidores.

Conclusão

É falso que Marwa El Selehdar — a primeira mulher, no Egipto, a tornar-se capitã de navios — esteja na origem do incidente com um cargueiro, que paralisou a circulação no canal Suez. A imagem difundida em diversas redes sociais foi manipulada, atribuindo a El Selehdar essa responsabilidade. Mas a capitã está aos comandos de uma outra embarcação que não o navio da empresa Evergreen, o cargueiro que encalhou naquele canal artificial.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.

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