As comparações entre Portugal e a Venezuela são habituais nas redes sociais. Desta vez, surgiu uma publicação no Facebook no passado dia 14 de junho, com um vídeo anexado, onde se fala das “afinidades” entre os dois países. “Eles [Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa] querem seguir o modelo da Venezuela para Portugal vejam a democracia da Venezuela socialista”, escreve o autor, ao mesmo tempo que são referidas supostas medidas de uma nova constituição venezuelana. Trata-se, no entanto, de uma publicação falsa.
Olhando para o conteúdo do vídeo, diz-se que a “Venezuela é a nova Cuba”, enumerando uma série de medidas. Por exemplo, a ideia de, “em caso de catástrofe natural, [um cidadão venezuelano pudesse] ser obrigado a hospedar os necessitados” ou, noutro ponto, a possibilidade de que a “todos os que estão contra o governo” sejam retirados “documentos e passaporte”. No entanto, a única fonte é de “uma brasileira que teve acesso à nova declaração oficial do governo sobre a nova constituinte da Venezuela”, o que, por si só, não é suficiente para comprovar a veracidade da informação que foi divulgada. Por outro lado, não existem nem datas nem documentos que possam ser consultados para comprovar aquilo que foi ali expresso.
Depois, segundo o jornal brasileiro Estadão, esta é mesmo uma publicação falsa porque, de facto, o país conduzido por Nicolas Maduro teve uma assembleia constituinte entre 2017 e 2020 mas não conseguiu promulgar a nova Constituição. Quanto às medidas enumeradas, elas pertencem a uma publicação feita no Facebook ainda em 2012.
Ora, nesse ano, Maduro era vice-presidente do país, tendo vindo a assumir os destinos do país apenas um ano mais tarde, após a morte de Hugo Chávez. Por isso, mesmo que as medidas fossem verdadeiras, nunca poderiam ser implementadas pelo agora presidente da Venezuela.
Com essa nova legislação, Maduro queria retirar o poder da oposição que conduzia as lides da Assembleia Nacional de 2016. Mas, como os seus opositores se abstiveram de participar na Constituinte, o documento acabou por não ser oficialmente reconhecido. Outro fact-check, desta vez feito pelo jornal El Diário na sua rubrica “Chequéalo”, verificou esta publicação em junho do ano passado, considerando-a também como falsa. Esse órgão de comunicação social refere ainda que o texto que serve de base para o vídeo foi difundido numa página, “Operación Libertad Venezuela”, com a seguinte descrição: “Projeto de Reforma Constitucional 2013-2019, linhas orientadoras para os ante-projectos de leis a ser promulgadas na Assembleia Nacional dos próximos meses.”
Por isso, a constituição que está em vigor é aquela que foi aprovada em 1999 pelo governo de Hugo Chávez, tal como referido pela agência Lupa, que também verificou a publicação, dando-lhe o selo de fake news. Várias das medidas da publicação original não constam desse documento e até são contrariadas: existem universidades privadas no país, não está imposta a determinação de que todos os bancos terão de pertencer ao Estado e, apesar de exigir a sua existência, a Constituição da Venezuela não determina o valor do salário mínimo em vigor no país.
Em 2019, Nicolás Maduro chegou ao seu segundo mandato mas sob forte contestação nacional e internacional. Os resultados dessas eleições não foram reconhecidos pela comunidade internacional. Entretanto, Juan Guaidó auto-proclamou-se presidente interino da Venezuela. Atualmente o país tem dois parlamentos parcialmente reconhecidos: um de maioria opositora, liderado por Guaidó, outro que é a favor do regime de Maduro, liderado por Luís Parra.
Conclusão
Não é verdade que a Venezuela tenha implementado determinadas medidas graças a uma nova Constituição. A publicação viral partilhou um vídeo cuja única fonte é a voz de uma mulher brasileira. Dois fact-checkers, do jornal Estadão e outro do jornal El Diário, desmentiram aquilo que foi partilhado no Facebook. Afinal, o vídeo foi criado em 2012, altura em que Nicólas Maduro, atual presidente da Venezuela, era vice-presidente de Hugo Chavez.
Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:
No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:
FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.
Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact checking com o Facebook.