Regressei há poucos dias de uma viagem ao Brasil. Lá trabalhei num centro de saúde de uma favela do Rio de Janeiro. No Rio das Pedras – assim se chamava esta comunidade – encontrei pessoas muito pobres, com problemas de saúde que já não julgava poder ver, mas sobretudo pessoas que procuravam um serviço de saúde que os pudesse ajudar quando se sentiam doentes.

Quando se viaja para um país como o Brasil é normal depararmo-nos com esta realidade de uma forma evidente, e isso já é esperado, afinal são muitos milhões de pessoas… e milhões de pessoas pobres. Mas será que em Portugal também não existe pobreza? A resposta foi-me clara depois de ver o documentário da Fundação Francisco Manuel dos Santos “Pobreza Zero”. Vinte minutos que espelham uma realidade tantas vezes mascarada e ignorada.

É impossível ficar indiferente aos relatos destes portugueses, grande parte deles trabalhadores, mas a quem o facto de trabalhar não chega para deixar o “dá para sobreviver”. Foi-me também impossível não pensar de que forma estas pessoas não têm uma alternativa à saúde pública se assim o precisarem. É sobretudo por estes cidadãos que o SNS não pode ruir, nem continuar a degradar-se, mas todos os portugueses merecem um SNS competente.

Espero do meu país a capacidade de manter um serviço público de saúde, alicerçado nos valores de sistema social previstos por Leonor Beleza, que – nas suas palavras – garanta que “todos os cidadãos têm acesso a cuidados preventivos e terapêuticos e o que for necessário em relação à saúde, independentemente da sua condição.”

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Não desejo um SNS apenas para os que não têm alternativa: carente de recursos materiais, com profissionais desmotivados e com enormes dificuldades de acesso. Quero um serviço de saúde que se mantenha a tratar ricos e pobres, porque dispõe do melhor serviço. Foi assim até agora, mas ainda continuará a sê-lo?! Esta realidade está aos meus olhos cada vez mais dissolvida e por isso é importante agir e demonstrar por todos os meios que o SNS não está de boa saúde, e que precisa de uma urgente mudança para recuperar o que ainda resta.

Hoje estou em greve porque é necessário manter os médicos no SNS, porque tal como manifestado pela minha ordem profissional “Sem médicos não há Serviço Nacional de Saúde”. Não se enganem os senhores governantes, os médicos querem trabalhar no SNS, os médicos querem trabalhar para todos os portugueses. Mas os médicos também querem trabalhar com salários dignos e condições adequadas, e não só à base de resiliência e “amor à camisola”.

Sou apenas uma jovem médica, que ainda está no início da sua carreira, mas gostava de poder continuar a ser uma médica do SNS, que trata da melhor forma possível todos aqueles que precisam de cuidados de saúde, independentemente de ser rico ou pobre.