Portugal sempre foi um país governado por uma certa elite e um conjunto de tecnocratas partidários. Esta constatação, embora desagradável para muitos, revela uma verdade profunda sobre a forma como o país tem sido administrado ao longo das décadas. As decisões que moldam o nosso presente e futuro são frequentemente tomadas por indivíduos que, devido às suas posições privilegiadas, permanecem distantes das realidades diárias enfrentadas pela maioria dos portugueses comuns.

Contudo, seria extremamente positivo que essas eminentes figuras governamentais, desconectadas das dificuldades que enfrentamos no nosso dia a dia, saíssem da sua confortável bolha partidária para observar a realidade que se vive actualmente nas nossas cidades um pouco por todo o país. Essa realidade tem-se vindo a degradar a um ritmo preocupante, em contraciclo com a percepção dos nossos líderes, incapazes de compreender os desafios reais que afectam a população.

A recente declaração da Ministra Margarida Blasco, em resposta a Carlos Moedas, defendendo que “Portugal continua a ser um país muito seguro”, é um exemplo claro de um preocupante distanciamento da realidade por parte dos nossos políticos. Ao fazer tal afirmação, a Ministra revela um completo, ou propositado, desconhecimento da situação actual que se vive nas ruas do país. É inegável que, em comparação com muitos outros países, Portugal ainda apresenta índices de criminalidade relativamente mais baixos. No entanto, a visão simplista e quase propagandística que nos continuam a tentar incutir de “um país seguro à beira-mar plantado” ignora toda uma nova conjuntura social e todos os problemas de segurança associados a esses factores que afectam directamente os cidadãos, particularmente os mais idosos e vulneráveis.

Os constantes casos de violência que têm ocorrido um pouco por todo o país, especialmente nas áreas metropolitanas do Porto e de Lisboa, palco de frequentes episódios de violência e criminalidade que desmontam por completo a afirmação da Ministra. Nem é preciso analisar os dados do RASI de 2023. A crescente sensação de insegurança entre os cidadãos é palpável e não pode ser ignorada ou minimizada. Relatos frequentes de assaltos, agressões, vandalismo e outros actos de violência urbana demonstram que a nova realidade em Portugal é bem mais complexa do que as palavras da Ministra querem demonstrar. Estes incidentes reflectem uma sociedade em mudança, onde a desigualdade social, a precariedade económica, a falta de meios humanos e físicos das nossas forças de segurança, a necessidade de uma reforma da justiça adaptada às novas realidades e a falta de oportunidades têm contribuído para um aumento do desespero e, consequentemente, da criminalidade.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A declaração da Ministra não só falha em reconhecer estes problemas, como também revela uma atitude perigosa de complacência. Em vez de enfrentar os desafios de segurança de frente, parece preferir esconder-se atrás de números que, embora possam ser positivos no papel, não reflectem a realidade vivida por muitos cidadãos. Além disso, há uma desconcertante ausência de um plano estratégico claro e eficaz para lidar com a criminalidade emergente. A resposta das forças de segurança acaba por ser reactiva, em vez de proactiva, deixando os cidadãos desprotegidos e com uma crescente desconfiança nas instituições. A comunicação por parte do governo precisa de ser mais transparente e honesta, reconhecendo os problemas reais e apresentando soluções concretas em vez de discursos vazios de uma realidade utópica.

Mais do que retórica e o tentar “varrer os problemas para debaixo da mesa”; exige realidade, planeamento e um compromisso genuíno com o segurança de todos os cidadãos. É imperativo que as nossas elites governantes façam um esforço consciente para quebrar a barreira da indiferença e se aproximem da realidade vivida pelos portugueses. Só assim poderão formular políticas que realmente promovam a segurança e a justiça social no nosso país.

Este apelo não é apenas um desejo idealista, mas uma necessidade prática de acção face ao crescente sentimento de insegurança no nosso país. Negar a realidade, como frequentemente acontece, não só agrava os problemas existentes como também pode fomentar o aparecimento de movimentos populares pouco desejáveis. Quando a população sente que os seus líderes políticos são alheios às suas preocupações e necessidades de segurança, a confiança nas instituições diminui e a frustração aumenta. Esta frustração pode, em muitos casos, levar à formação de grupos que tentam assumir o papel das forças de segurança adoptando práticas questionáveis e contribuindo para um ambiente de ainda maior insegurança e instabilidade.