O Governo colocou em consulta pública o esboço do diploma que pretende aprovar para a transposição da directiva europeia que estabelece uma taxa mínima de IRC. Esta directiva vai obrigar algumas empresas a pagar uma taxa mínima de 15% de IRC. Porquê?

As razões são várias e pode encontrá-las facilmente na net, incluindo no link acima.

O imposto sobre as empresas em Portugal é o segundo mais elevado da OCDE
Em Portugal a taxa de IRC pode chegar aos 31,5%. De certeza que já ouviu, por diversas vezes, que há empresas que transferem a sua sede para a Irlanda ou para os Países Baixos.

Porquê?

Porque a taxa de IRC é muito mais baixa. Inclusive, pode ficar abaixo dos 15%.

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Assim, isto leva-nos a perceber algumas justificações para a União Europeia (UE) ter legislado nesta matéria:

1.Harmonização fiscal, aproximando as tributações dos vários países da Europa e de outros que também de comprometeram a adoptar esta regra;
2.Diminuir a deslocalização das empresas para zonas onde a tributação seria mais vantajosa;
3.Promover uma competitividade justa entre as empresas.
Todavia, são meras falácias. Surpreendentemente (ou não) os países com baixas taxas de tributação das empresas são exemplos de grande crescimento económico.

Só para ilustrar a competitividade fiscal em IRC dos 38 países analisados pela Tax Fundation, vejamos a figura seguinte que apresenta os 3 melhores e o 3 piores casos.

Concorrência fiscal internacional
Posto isto, vamos analisar cada um destes 3 argumentos.

Por que precisamos de harmonização fiscal? A harmonização fiscal era um tema em voga no início dos anos 90 com a assinatura do tratado de Maastricht. Mais de 30 anos depois parece que divergimos mais do que convergimos. Por si só, este argumento não tem qualquer justificação – é para ficarmos bem na fotografia?
As empresas tentam maximizar os dividendos que entregam aos seus donos. Evidentemente que pretendem que eles sejam tributados o mínimo possível. Qual o problema de as empresas deslocalizarem as suas sedes para onde são menos tributadas? É perguntar aos países que têm altas cargas de imposto. Porque os outros agradecem.
Promover uma competitividade justa? Basta que os países que se sentem prejudicados baixem as taxas de IRC.
Tal como a concorrência em qualquer área, a concorrência fiscal internacional promove o bem-estar das pessoas. Inegavelmente, havendo países que conseguem captar investimento estrangeiro por causa do seu aparelho fiscal mais competitivo, isso é um incentivo para que outros países sigam esse exemplo.

Preço mínimo do arroz carolino: 2,00 €
Será que todos veríamos com bons olhos uma atitude da UE a imposição desta norma?

Naturalmente que se ajusta a mesma justificação que anteriormente:

Harmonizar preços nos países membros;
Desincentivar a deslocalização da produção para países mais eficientes;
Promover uma competitividade “justa” entre os produtores.

Qual a solução para a taxa de IRC?
A UE tem como uma das suas prioridades preservar e promover práticas leais em matéria de concorrência. Estabelecer preços administrativamente, não preserva qualquer concorrência, bem pelo contrário. Infelizmente, a mesma UE já criou várias excepções que permitem definição administrativa de preços.

Concorrência fiscal em IRC
Agora chegou a vez de começar a liquidar as vantagens competitivas ao nível da fiscalidade. Sim, as vantagens que alguns países souberam aproveitar, vão começar a ser anuladas com a regulamentação da UE.

Então, que atitude deve ser tomada?

Naturalmente que isto nos remete para a questão da existência de um imposto sobre os lucros das empresas.

Como sabemos, os impostos destinam-se a financiar o Estado. Ademais, podem ter eles próprios uma função redistributiva, cobrando a quem tem mais capacidade de contribuir. Com efeito, se uma empresa gera rendimento, parece que está em condições de contribuir para o financiamento do Estado, certo?

Certo!
Mas estará correcto?

Dupla (tripla) tributação dos rendimentos
Decerto que a empresa é propriedade de pessoas. Portanto, o rendimento das pessoas já foi tributado antes de elas o colocarem na empresa. Para além disso, quando a empresa for distribuir os seus lucros aos seus donos, eles voltam a pagar imposto.

Ou seja, Estamos perante uma tripla tributação. Só para exemplificar, vamos fazer um exercício (passe à frente os seguintes 4 pontos se não gosta de fazer contas):

O Sr. Rodrigo teve um rendimento bruto de 100 mil euros no ano passado, tendo pagado 40 mil euros de IRS (40%);

Dos 60 mil euros que lhe sobram, conseguiu poupar metade (30 mil) com os quais adquiriu uma participação financeira numa empresa;

Essa empresa teve um resultado antes de impostos no valor de 3000 euros disponível para atribuir ao Sr. Rodrigo. Como está sujeita a uma taxa de imposto efectiva de 30%, apenas lhe distribui 2100 euros;

Ao receber esse dividendo, o Sr. Rodrigo tem de entregar 28%, ficando apenas com 1500 euros.
Com efeito, se não tivesse havido qualquer tributação e o Sr. Rodrigo tivesse mantido a sua taxa de poupança, iria investir 50 mil euros, recebendo 5000 euros em vez de apenas 1500.

Em suma, o Sr. Rodrigo esteve sujeito a uma tributação de 3500 euros sobre um rendimento de 5000, ou seja, entregou ao Estado 70% dos seus rendimentos:

1.A poupança foi tributada em IRS em 40%;
2.Os resultados dessa poupança foram tributados em mais 30%;
3.Aquando da sua distribuição houve uma nova tributação em 28%.
Portanto, o que lhe sobra do esforço do seu trabalho e remuneração do risco do investimento é de apenas 30%.

Concluindo, como é sabido, o Estado necessita de receitas. Assim sendo, deve cobrá-las a quem tem mais capacidade de as entregar.

Porém, desincentivando a criação de riqueza com uma tripla tributação dos rendimentos, pode ter efeitos perniciosos nessa mesma cobrança, originando fuga de capitais para outros países e comprometendo o desenvolvimento de Portugal.

Eventualmente pode parecer-lhe estranho, caro leitor, mas se os dividendos a distribuir pelas empresas já vão ser tributados em sede de IRS, porquê cobrar IRC pelo meio?

  • Porque os dividendos podem não ser distribuídos!
  • Se não são distribuídos, ficam a gerar mais riqueza, aumentando o valor da empresa. Os seus donos irão pagar mais IRS quando venderem as suas participações.
  • E se os donos forem estrangeiros e não pagarem IRS em Portugal?
  • Evidentemente que teremos de prever algumas excepções, como seria esse o caso.